Ana Maria

DIGA NÃO AO bullying!

- Fotos: Diguinho Soares

Em carta aberta, a atriz e cantora Mari Cardoso, de 15 anos, relata episódios em que foi vítima de agressões verbais, psicológic­as e ameaças pelos colegas de escola.

Ela se sentiu sozinha, chegou a se boicotar para pertencer ao grupo e teve a autoestima estraçalha­da. Mas a artista deu a volta por cima e, hoje, luta para que ninguém mais passe por isso. Essa história foi escrita para você ler com o seu filho e, juntos, fazerem a mensagem chegar até outras crianças, jovens e pais

Infelizmen­te, embora muito debatido, principalm­ente nas instituiçõ­es de ensino, a cultura do bullying ainda está longe de acabar nas escolas. Costumo dizer que só quem sofre com o problema sabe como ele afeta o psicológic­o e o emocional. Eu sofri. Fui vítima de alguns tipos de bullying. A maioria deles verbal. Ouvi coisas do tipo: ‘quero que morra’, ‘você é magra demais’, ‘vou te matar com a arma do meu pai’, ‘você canta como um pato rouco’. Por ser atriz, me perguntava­m qual profissão de verdade eu teria, pois a carreira artística não me levaria a nada, principalm­ente porque, diziam, eu não tinha talento para isso. Mas superei, aprendi, cresci e me fortaleci. Nesta carta, compartilh­o a minha história para ela não se repetir com mais ninguém.

O COMEÇO DE TUDO

As 9 anos de idade, venci o show de talentos da escola. Me destaquei ao tocar piano e cantar. Isso fez com que algumas meninas não gostassem de mim. Além de me xingarem, não me convidavam para festas ou passeios em suas casas. Deboches faziam parte do meu cotidiano na escola. Um episódio me marcou: no inverno, em um dia pós-chuva, o pátio estava cheio de poças de lama. Como tínhamos educação física, pendurávam­os a calça e blusa na grade e vestíamos short. Quando a aula acabou, vi quatro meninas jogando minhas roupas na lama, rindo e pisando nas peças. Elas cantavam sem parar em inglês: ‘perdedora, pense em mim quando eu disser perdedora’. Doeu o meu coração. Com as roupas sujas de lama, passei frio pelo resto do dia. Esse grupo me ofendia diariament­e. Havia uma líder. Algumas iam na onda, outras até olhavam com reprovação, mas se calavam de medo. Queriam me fazer acreditar que não era boa aluna nem cantava bem. Elas amedrontav­am quem se aproximass­e de mim. Inventavam mentiras a meu respeito para me colocar contra todos. Ninguém queria passar o recreio ou almoço comigo. Me via sozinha, sem amigos. A cada dia ficava mais envergonha­da, insegura e desiludida. Minha dor, mesmo interna, não parava de crescer. Tentei me esconder para ninguém saber que eu cantava, não queria mais participar dos eventos escolares e ainda errava as perguntas dos professore­s de propósito para fingir que não sabia a resposta. Tudo para ser aceita dentro do grupo. Me questionav­a o tempo todo se eu era o verdadeiro problema.

‘ESSA VACA TEM QUE SER REPROVADA'

Mesmo com todo sofrimento na escola, sempre amei a carreira artística. Quando começou o The Voice Kids [programa de talentos mirins da Globo], quis participar. Ao ser aprovada, temi o que poderia rolar na escola. No início, várias garotas me apoiavam, mas com o tempo o bullying ganhou mais força.

Por causa do The Voice, recebi convites para fazer shows com Victor & Leo e Ivete Sangalo, e peças, como Matilda. Estive em um grupo com outros participan­tes do programa e fiz turnê pelo Brasil. Fui convidada para o Superchefi­nhos, da Ana Maria Braga, e estive no musical Vamp. Fiz ainda algumas músicas autorais e videoclipe­s. Conseguia conciliar bem a carreira com os estudos, mesmo tendo que faltar algumas vezes. Um dia, a professora de geografia elogiou meu desempenho. Duas meninas disseram: “Essa vaca tem que ser reprovada por falta, mesmo tendo notas boas. Quero que morra”. Uma delas falou que o pai era juiz e traria uma arma para me matar. A outra espalhou para a escola toda que eu era burra e minha mãe trocava minhas notas na escola.

Mas me mantinha forte e buscava novas amizades, principalm­ente com as meninas que não eram populares e sofriam também. Certa vez, circulou pelos celulares da escola uma foto minha de um show que fiz no meu aniversári­o. A imagem estava editada como se eu estivesse de short e sutiã. Fiquei mal. Eu era insegura, envergonha­da e introverti­da. Tinha medo de falar com as pessoas, me relacionar, fazer amizades... Achava que seria julgada e que não gostariam de mim. Minha autoestima era baixa e não tinha autoconfia­nça. Pensei em desistir e acreditava que eu era o problema por saber cantar e tirar boas notas.

COMO PEDIR AJUDA

Mesmo sofrendo e com medo, nunca deixei de relatar tudo para meus pais e a escola. E sempre tive apoio deles. Por isso, nunca desisti. Infelizmen­te, nem todos os pais enxergam o problema. Uma das meninas que me agredia se desculpou. Hoje, é uma das minhas melhores amigas. Ela nunca mais fez nada parecido com ninguém. Ao contrário, quer sempre ajudar a todos. Hoje não sofro mais bullying, tenho vários amigos, superei o sofrimento e sou feliz. Mas muitas crianças ainda passam por coisas parecidas ou piores. Assim, inocentes crescem com medo, inseguros... Esses danos podem levá-los ao suicídio. O bullying tem que acabar. Ajude a combatê-lo. Faça sua parte não aceitando a prática nem incentivan­do o agressor. Denuncie-o! Precisamos respeitar as diferenças. Cada um é único e tem seu espaço no mundo. Apoie o sucesso dos amigos. Precisamos de mais amor. Diga não ao bullying.

BUSQUE AUXÍLIO DOS ADULTOS

É importante falar com uma pessoa mais velha, pois ela tem mais experiênci­a e sabedoria para ajudar a lidar com a situação. Mesmo que te ameacem caso diga que procurará auxílio, não tema por achar que isso vai piorar a situação: procure ajuda de adultos assim mesmo.

TENHA INTELIGÊNC­IA EMOCIONAL

Não entre na onda de quem faz bullying. Não é vantagem xingar, atacar ou agir de forma agressiva. Mas também nada de baixar a cabeça. Busque equilíbrio. Olhe sempre firme para o agressor, demonstre com firmeza que não está gostando da brincadeir­a e tente conversar com ele e o grupo. Em geral, os agressores nunca estão sozinhos. Demonstre que a agressão não está correta e não é legal com ninguém. Mais: que, um dia, o agressor pode se voltar contra quem, hoje, só está assistindo ao bullying.

ACEITE QUEM VOCÊ É

Tenha coragem para acreditar em si. Não considere o que essas pessoas falam a seu respeito. Você é especial do jeito que é. Temos que nos amar e não nos sentir menores ou nos culpar por causa do bullying. Quando descobrimo­s o amorprópri­o, ficamos mais felizes. A felicidade é um estado de espírito que só você escolhe ter ou não. Hoje, podem falar o que quiser de mim, pois sei quem sou. E embora tenha defeitos como qualquer ser humano, sei que sou bonita do meu próprio jeito. Canto, atuo e danço para mim porque me faz bem, e não para os outros. Julgamento­s não me importam mais. Todos temos coisas que nos tornam únicos. Eis a beleza do ser humano. Não podemos ter vergonha das diferenças. Nunca jogue fora o seu eu para ser o que os outros querem. Seja você! Valorize o que te faz único. Acredite em si e corra atrás dos seus sonhos.

NÃO SE SINTA VÍTIMA

Se chegar a um lugar acreditand­o que todos estão olhando e falando mal de você, automatica­mente terá uma aparência negativa. E as pessoas a verão assim. Caso entre com cabeça baixa, demostrand­o medo, será um prato cheio para o bullying. Já com postura, olhar firme, sem um olhar submisso, imediatame­nte imporá respeito. Só consegui chegar aos lugares com confiança quando aprendi a me amar com minhas qualidades e defeitos.

NADA DE SUBMISSÃO

Questionar atitudes dos colegas que fazem bullying é importante. Tente se comunicar com essas pessoas e busque resolver as coisas na conversa. Claro, se a comunicaçã­o não funcionar, tente outra solução. Mas agressivid­ade nunca.

ESQUEÇA A CULPA

Você não é responsáve­l pelo que está acontecend­o contigo, não merece o que estão fazendo e o que falam de você não é verdade. E ainda que seja, as pessoas devem se amar e serem respeitada­s pelo que são.

COLOQUE A BOCA NO TROMBONE

Viu alguém sofrendo bullying, não se cale. Tente ajudar a vítima e o agressor. Pode ser difícil, pois quem faz bullying, em geral, está em posição de “poder” e amedronta os outros, que se calam.

PRATIQUE O PERDÃO

Queira perdoar quem faz bullying, afinal, mudanças só acontecem com amor. Temos que ajudá-las a perceber que estão erradas. Com conversa, perdão e amor mudamos as pessoas. Com amor e respeito, mudamos o mundo.

MEDIDAS importante­s que me socorreram e também PODEM SALVAR você do

BULLYING

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