CARTA TRISTE para alguém que não ficou
Bastava ter segurado minha mão mais forte ou por mais tempo e eu entenderia que não era hora de ir. Você me encontrou na multidão, mas me perdeu quando desviou seus olhos e optou por calar o que sentia, não acreditando que a sua verdade poderia ser a minha verdade também.
Eu fui. Voei mundos, mudei de roupa e de sonhos. Mudei de vida e de princípios. Encontrei pessoas e me desencontrei de mim.
Mas tantas vezes olhei para trás. Tantas vezes procurei por aquelas mesmas mãos. Ora para me acompanhar, ora para me ajudar a levantar. Mas desisti de te encontrar por caminhos que não eram os seus. De te encarcerar num baú de lembranças porque a arca nunca fechou. E inventei um você só para mim, um que aceitou, sem resistência, morar nos meus pensamentos. Aquele cuja biografia ainda se escrevia em meia dúzia de páginas nas quais eu era a única heroína. Um você que permanecia.
E foi assim que senti sua companhia em noites estreladas, com lua sorrindo. Em praias desertas e outras nem tanto. Em ruas inóspitas, quando o medo do escuro trazia a criança assustada que mora em mim para a superfície. Em corredores de hospital, quando a vida mostra sua fragilidade. Em festas, missas e velórios. Em camas mornas, em noites insones. Um você que eu nem sabia mais se era você.
Mas que se manteve comigo mesmo quando, no mundo real, nossos trilhos haviam se descruzado e as estradas seguiam paralelas, sem perspectiva de nova intersecção. Chegamos a nos espiar algumas vezes, buscando porquês, enquanto cada um tentava não descarrilar a própria sorte. É que, naquela altura, já estávamos em movimento tão acelerado que qualquer desembarque seria improvável.
E assim segui resignada no trem do destino, acreditando que esse sacolejar da vida era o único movimento possível. Mas, a cada nova estação, meu olhar ainda recai sobre a plataforma vazia de você, com o fio de esperança cada vez mais fino. E, aos poucos, vou fechando minhas janelas, deixando de ver a paisagem.
Mas tantas vezes olhei para trás. Tantas vezes procurei por aquelas mesmas mãos. Ora para me acompanhar, ora para me ajudar a levantar. Mas desisti de te encontrar por caminhos que não eram seus