Ana Maria

Encontros e encantos

A obra conduz o leitor a um passeio com destinos triviais e surpreende­ntes, como ruas, feiras, delegacias, calçadas e pessoas do Rio de Janeiro

- Karla Precioso

O sol dominical convidava a uma caminhada e aproveitei para levar junto a família. Em meio à multidão que ia e vinha na rua fechada para os carros em Ipanema, dei de cara com um conhecido. Cheio de intimidade, disse: – Oi, Paulo! Apertamos as mãos, trocamos algumas palavras e voltei para a minha mulher, que havia ficado um pouco distante, com meus filhos. Comentei com ela: – Era o Paulo Miklos.

– Não, era o Charles Gavin – ela me corrigiu. Gelei. “E agora, vou lá e peço desculpas?”, pensei. “Ou deixo pra lá? Ou quem sabe volto com minha mulher e meus filhos para ter a chance de chamá-lo de Charles e torcer para que ele não tenha escutado quando o tratei como Paulo?” Achei melhor esquecer. Afinal, eu falei em alto e bom som, não havia como ele não ter ouvido.

Convém explicar que conheço Charles e sua mulher, Mariana Roquette-pinto, a Mari, há anos. É uma graça de casal. Às vezes nos encontramo­s em eventos, como há poucos dias, na festa de um grande amigo em comum. Sem contar que ele é uma figura pública, o que torna meu engano ainda mais incompreen­sível.

Fiquei matutando e pensei em procurar Charles e pedirlhe desculpas. Mas achei melhor conversar antes com Mari. Enviei uma mensagem, expliquei o ocorrido e perguntei se ela mesma poderia, mais tarde, transmitir meu pedido de desculpas. Ela, então, me tranquiliz­ou: — Sempre existiu essa confusão com os Titãs. Afinal, eram muitos. Tanto que, certa ocasião, em Minas Gerais, uma moça viu Charles e Paulo saindo do ônibus e perguntou, naquele sotaque carregado de mineirice: “Vocês é eles?”

O grupo tinha muitos integrante­s mesmo. Dos oito originais, só ficaram três: Branco Mello, Sérgio Britto e Tony Bellotto. Charles, baterista, saiu em 2010, e Paulo, vocalista, que desde 2001 concilia a carreira de músico com a de ator de filmes, séries e novelas, deixou a banda em 2016. Mari contou ainda que estou longe de ser o primeiro a confundir os dois.

– Quando o Paulo fez um de seus filmes, Charles recebeu vários elogios, como de uma pessoa que disse: “Você arrasou!” Uma vez, no metrô, um cara perguntou ao Charles quando ele ia fazer a próxima novela. E olha que o Paulo nem tem bigode.

Os equívocos são tantos, ela diz, que Charles nem desmente para não causar constrangi­mento. Obrigado, Mari. Continuo constrangi­do, mas, pelo menos, fiquei mais aliviado.

Não sou o único a cometer esse tipo de engano. Sou solidário a gente como Nina Novello, que, em um de seus trabalhos como produtora de shows, chamou Egberto Gismonti de Sivuca. Aliás, Gismonti volta e meia também é confundido com Hermeto Pascoal e viceversa. Outra dupla que já se acostumou às trocas é Alceu Valença e Geraldo Azevedo. E Joyce e Leila Pinheiro estão tão habituadas que, numa ocasião, ao dar entrevista ao vivo para a TV, Leila ouviu o agradecime­nto do repórter: – Obrigado, Joyce! Em outro momento da carreira, Nina fez uma salada músico-nominal: – Na turnê do Gilberto Gil, eu chamava o grande percussion­ista Repolho de Alface! Mas ninguém sofre tanto com os equívocos como os irmãos gaúchos Kleiton e Kledir, autores de sucessos como

Deu pra Ti, Paixão,

Fonte da Saudade...

“Não sou o único a cometer esse tipo de engano. Sou solidário a gente como Nina Novello que, em um de seus trabalhos como produtora de shows, chamou Egberto Gismonti

de Sivuca”

Porventura, de Mauro Ventura Editora: 106 Preço: R$ 28

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