VERISSIMO NARRA VIDA PARA ALÉM DAS LETRAS
COM FAMÍLIA, ESCRITOR BRINDA À CARREIRA
Na parede, fotos suas escrevendo, confraternizando com personalidades como Henfil (1944–1988), ao lado do pai, o escritor Érico Verissimo (1905– 1975), em uma caricatura lutando boxe. Na mesa, uma máquina de escrever Royal, do início do século passado. Tudo denota uma história longa e intimamente sintonizada com o Brasil. Luis Fernando Verissimo (82), um dos mais célebres escritores do País, cronista em traço e letras de nossa vida cotidiana, ganhou uma homenagem em formato de sala pensada para ser sua. Pelo menos no olhar da arquiteta Izabela Pagani (38) na Casacor RS, em Porto Alegre.
Com objetos pessoais de Luis Fernando, o ambiente serviu de cenário para um papo com o escritor, que se diverte ao ser perguntado sobre sua vitalidade. “Minha cardiopatia, minha diabetes e meus rins dariam risada do termo vitalidade. O que existe mesmo é a preocupação em não perder o interesse pela vida”, conta. Ao seu lado, a mulher, Lucia Helena (75). “Temos
grande admiração por arquitetos e suas ideias. Luis Fernando, quando jovem, chegou a pensar em fazer Arquitetura, mas acabou numa área igualmente criativa”, diz ela. E para completar o trio familiar, a neta, Lucinda (11), que fez questão de visitar a sala idealizada do avô. Muito a ensinar para ela? “Aos netos não se ensina nada. Neto se curte e se estraga!”, desmistifica o gaúcho. Além dos mais de 60 livros
“O que existe mesmo é a preocupação em não perder o interesse pela vida.” (Verissimo)
publicados, grande parte da produção escrita de Verissimo chegou e chega aos leitores por meio do Jornalismo, universo no qual acaba de completar 50 anos de dedicação — a data, inclusive, foi o mote para a homenagem decorativa. “A maior diferença é que, antes, eu fazia uma coluna diária e, hoje, escrevo duas por semana. E textos mais curtos. Não sei se fiquei mais conciso ou
mais preguiçoso”, brinca. Esse eterno ritual da escrita empurra para longe as novas tecnologias. Celular? Ele não usa e se define como pré-informático. “Escolhi não entrar no mundo digital. Frequento, mas o mínimo possível. De sorte que algum proveito eu tiro das novas tecnologias, mas sou contra”, prega ele, na contramão dos novos tempos.
Talvez o apreço pelo tangível e humano tenha favorecido a relação de 55 anos com Lucia. “No nosso caso, o sucesso do casamento se deve a uma absoluta incompatibilidade de gênios. Não poderia haver duas pessoas mais diferentes do que nós. Deu certo”, diz ele. “O segredo, depois desses 55 anos juntos, ainda tentamos descobrir. Quem sabe mais outros 55?”, emenda Lucia, que define o eleito com três adjetivos, “íntegro, generoso e solidário”. Autor de aclamadas obras como O Analista de Bagé e A Velhinha de Taubaté, ele ainda vê uma barreira a ser vencida entre o brasileiro e o ato de ler. “Brasileiro lê pouco. Não é uma questão de gosto, mas de oportunidade. Não temos uma tradição de livros populares ou feitos para uma classe média leitora”, explica ele. O