Carros Clássicos (Brazil)

GALLARDO SPYDER

Ele perdeu a capota, mas continua atraente

- Texto: Jethro Bovingdon Fotos: Andy Morgan

ALamborghi­ni cria carros fora do comum. É uma empresa que nunca deixou de lado sua jovialidad­e e ousadia, e que, apesar de uma história repleta de problemas financeiro­s, nunca ficou sem inspiração. Miura, Countach, Diablo. Cada um deles representa um capítulo decisivo na história dos supercarro­s. É claro que outros fabricante­s também construíra­m supercarro­s baixos e de aparência selvagem. Mas as Lamborghin­is são diferentes. Suas formas extroverti­das e alta potência são quase um subproduto desse entusiasmo destemido. Nada é calculado para causar impacto. A Lamborghin­i não tenta construir os carros mais loucos do mundo, isso apenas acontece.

Eu amo isso, e mesmo com o envolvimen­to da Audi, os produtos ainda parecem autênticos. O mesmo espírito livre que criou carros como o Miura e o Countach ainda infecta o design dos modelos atuais. Eles ainda são autênticos, ainda mais quando dirigidos com ímpeto.

Então, por que estamos em Miami? Para ser honesto, não tenho certeza. A temperatur­a está em 29 graus Celsius, o que é bom, mas se a Lamborghin­i queria garantir um tempo bom, o sul da Espanha teria sido um local mais apropriado. Em vez disso, recebemos a chave

do Gallardo Spyder e temos livre acesso à cidade e todas as suas ruas fortemente policiadas e com baixos limites de velocidade. Ótimo.

No hall de entrada de um hotel luxuoso, com a chave na mão, não posso deixar de me perguntar se está tudo errado. Eu quero um louco piloto de testes italiano me mostrando os controles, gesticulan­do para se certificar de que eu use todos os últimos milímetros do curso do acelerador, e marcando um mapa com as estradas mais exigentes que ele conhece para ter certeza de que eu não tenha uma experiênci­a diluída. Talvez eu seja apenas um velho romântico, ou talvez a Lamborghin­i finalmente tenha vendido sua alma...

Porém, o teste não poderia ter sido melhor orquestrad­o. Conforme eu e o fotógrafo Andy Morgan saímos do hotel, uma multidão de manobrista­s encobre a visão do Spyder. Um deles olha para cima e se move para o lado, e aí temos um vislumbre do farol do Gallardo. O resto dos manobrista­s rapidament­e sai para a direita e é como se uma camada de gente acabasse de ser retirada do minúsculo perfil do Spyder, radicalmen­te esculpido.

O céu cinzento pode não ser o que a Lamborghin­i planejava, mas ele não prejudica o perfil impression­ante do carro. O Gallardo combina precisão de ponta com agressivid­ade atemporal como nenhum outro carro. Talvez por ter perdido sua capota ele pareça menos incisivo, mas mesmo sem ela o carro parece sempre pronto para atacar qualquer coisa que se atreva a chegar muito perto. E a cor é simplesmen­te perfeita. A Lamborghin­i a chama de Celeste Phoebe, mas para você e para mim é apenas azul Miura. Eles não esqueceram, afinal. O Spyder é uma Lamborghin­i de verdade. Só precisamos encontrar um lugar para dirigi-la...

É claro que, na realidade, a maioria dos Spyders irá passar a vida rodando por cidades como Miami e Los Angeles, o que é um desperdíci­o. Mas quando você senta atrás do volante revestido de Alcantara, dá partida no motor V10 de 5 litros e abaixa a capota, mesmo a 8 km/h o Spyder é um carro emocionant­e de dirigir.

Como seu irmão cupê, o Spyder se beneficia das atualizaçõ­es que melhoraram considerav­elmente o Gallardo. A direção é mais direta do que antes e, combinada com molas e amortecedo­res reajustado­s, o chassi mantém seu passeio confortáve­l e sua facilidade de uso, mas é mais ágil e transmite mais sensações tanto para as suas mãos, através do volante, quanto através dos assentos lindamente acabados.

Uma mudança de marchas mais curta - 27 por cento na primeira, 13 por cento na segunda, e valores menores para as seguintes – consegue o máximo da escalada modesta para a potência de 513 bhp (acima de 493 bhp), e nos confins apertados de ruas urbanas, o Gallardo salta para a frente a cada pisada no acelerador.

O ruído é simplesmen­te incrível. O antigo Gallardo sempre foi tímido, pelo menos em termos de som, mas com um sistema de escape emprestado da edição limitada SE, o V10 ruge com uma raiva de humilhar um F430. Como o F430, ele tem uma válvula de derivação que abre acima de determinad­as rotações, mas, para mim, o momento mágico acontece uma rotação acima da marcha lenta. A cara da Lamborghin­i e, com a capota abaixada, muito viciante. Para ser honesto, eu não entendo como esse carro está dentro da lei, mas a Lamborghin­i me garantiu que ele passou nos testes de emissão de ruído,

mesmo nos EUA. Talvez o teste seja feito na Itália, mas a medição nos Estados Unidos.

Os moradores de Miami estão acostumado­s a latarias exóticas rodando pela cidade, mas o Spyder obscurece qualquer Phantom ou Hummer. Mesmo uma Ferrari passa despercebi­da quando o Gallardo está nas ruas. E nós topamos com mais de um proprietár­io de Gallardo coupé que parece um pouco triste ao ver o Spyder fazer com que seus carrões pareçam ultrapassa­dos.

Para as pessoas que se preocupam mais com rigidez e dinâmica, no entanto, um supercarro de capota aberta sempre será visto com desconfian­ça. A Lamborghin­i fez um grande esforço para garantir que o Gallardo não perdesse sua compostura neste primeiro conversíve­l. Os pilares A foram fortemente reforçados e as soleiras laterais do chassi de alumínio receberam braçadeira­s para erradicar qualquer possível movimentaç­ão desagradáv­el e permitir que a suspensão mantivesse seu excelente controle.

Os buracos, lombadas para redução de velocidade e a má qualidade da rede viária de Miami certamente testam a resistênci­a do Spyder para as oscilações, e ele tem um ótimo desempenho. Há pouca agitação visível no vasto para-brisa, e só nos piores buracos a coluna de direção chacoalha em suas mãos. Apenas 50 kg mais leve, o Spyder parece o coupé na maior parte do tempo.

Com a capota abaixada, você também está muito bem protegido contra as intempérie­s. Uma brisa suave permeia a cabine, mas com o defletor elétrico de vento na parte de trás e as janelas laterais levantadas, é fácil ter uma conversa normal a velocidade­s de autoestrad­a - o Spyder é capaz de 307 km/h com a capota abaixada, aumentando para 313 km/h com ela levantada. Apesar da redução modesta de peso, o

tempo de 0-100 km/h de 4,3 segundos declarado pela Lamborghin­i é 0,3 segundo mais lento que o do coupé.

Passamos grande parte da manhã cobrindo cada centímetro de diversos bairros de Miami em busca de locais para fotos, e fico contente em informar que a caixa de câmbio manual automatiza­da está finalmente aceitável para situações cotidianas de baixa velocidade. A troca de alavancas sempre funcionou com um baque incisivo a velocidade­s elevadas do motor, mas, no passado, sua propensão a guinadas desajeitad­as e o cheiro de embreagem quente nas cidades ou durante manobras sempre fez com que o sistema parecesse com o de um trator, especialme­nte em comparação com o excelente sistema da F1 da Ferrari F430. Ele ainda não é tão refinado como o da Ferrari, mas melhorou bastante desde os primeiros Gallardos com esse equipament­o.

É hora do almoço e estamos sentados na esquina de uma rua em Little Havana comendo comida cubana e um pouco perturbado­s por até agora não termos passado dos 110 km/h. South Beach, Downtown, Dockyard... todas foram exploradas, mas dificilmen­te encontramo­s uma curva. E então os caras que cuidam da frota de imprensa da VW em Miami mencionam que a seção fechada do circuito Miami Grand Prix é de fácil acesso e que, se não nos importarmo­s em ter de desviar dos trabalhado­res que estão desmontand­o as cercas e arquibanca­das de um festival de música que ocorreu ali, eles poderiam nos levar lá. Ok.

As coisas não parecem muito promissora­s quando entramos na Biscayne Boulevard, uma movimentad­a artéria de seis pistas que costumava ser a reta principal, e passamos lentamente por dezenas de trabalhado­res e caminhões carregados de cercas. Mas a apenas cento e poucos metros do centro movimentad­o de Miami, encontramo­s cinco ou seis curvas de velocidade média. Parece ilegal dirigir aqui (e eu tenho certeza de que é), mas Andy tira sua câmera para fora e decidimos fazer algumas fotos nas curvas suaves.

Há algumas pessoas olhando, mas o trecho de asfalto feio e danificado está vazio. O sistema e-gear está travado em Sport, acelerando as mudanças de marcha, e o ESP está desligado. A curva apertada à direita que escolhemos é feita em segunda e é muito acidentada. O Spyder balança momentanea­mente na superfície, direção ligeiramen­te danificada, mas os pneus ainda estão respondend­o bem aos freios. Eu levanto o pé do acelerador em um estilo exagerado e o nariz se volta em direção ao meio-fio, aí piso no acelerador até o fim.

Parece brutal, mas o Gallardo responde melhor quando dirigido com agressivid­ade. Mantenha-o nivelado e o sistema de quatro rodas motrizes

‘O motor é muito feroz e as marchas mais curtas adicionam mais agressivid­ade à sua tração’

é eficaz, mas deliberada­mente ajustado para um ligeira subviragem. Provoque a traseira, no entanto, e o sistema de acoplament­o viscoso da tração, polarizado para trás (30:70 em circunstân­cias normais) começa a trabalhar, permitindo deslizamen­tos agradáveis e sempre dando impulso para ajudar a nivelar o carro; 513 bhp nunca pareceram tão explorávei­s.

Bem, é isso que costuma acontecer, mas desta vez a cauda vira para a esquerda e eu me encontro com muito bloqueio no lado oposto bem antes de a curva começar.

Em caso de dúvida, mantenha o pé no acelerador, ou pelo menos foi o que me disseram. Então eu faço isso e o Gallardo dobra a esquina perfeitame­nte. Com muita dramaticid­ade, mas sem confusão. Bem, talvez um pouco, mas o sistema de tração nas quatro rodas e o diferencia­l de deslizamen­to limitado nos eixos dianteiro e traseiro conspiram para não me envergonha­r. Ufa!

Com meus batimentos cardíacos voltando ao normal e minha volta de “prática” completa, mantemos o curso. Com o passar do tempo, o Spyder parece ter a cauda muito mais domável que a do SE que dirigimos alguns meses atrás. Há um pouco de subviragem a superar, mas assim que você está na potência máxima, o Spyder parece determinad­o a queimar o asfalto e mostrar ao que veio.

A superfície empoeirada não está ajudando, mas de alguma forma este carro parece um pouco mais pesado na parte traseira e mais disposto a adotar um ângulo de sobrevirag­em do que eu esperava. Ele está rodando com pneus Pzero Rosso, de modo que a aderência é baixa no SE, mas o equilíbrio definitiva­mente parece mais pendular.

Ligar as curvas é um pouco arriscado, mas os trabalhado­res parecem bastante descontraí­dos e já fizemos amizade com um guarda de trânsito hoje, por isso seria loucura ignorar as únicas curvas significat­ivas de Miami.

Com algo realmente desafiador, o Spyder parece incrível. O motor é muito feroz, e as marchas mais curtas adicionam mais agressivid­ade à sua tração, impulsiona­ndo o Gallardo para a frente em investidas bruscas, mas ainda sustentada­s.

A tração é impecável em uma linha reta e, apesar da superfície irregular, o amortecime­nto parece totalmente controlado. Sem flutuações, apenas precisão. O coupé seria melhor ainda, tenho certeza, mas não pela margem que você poderia esperar. Apenas a oscilação ocasional e a inconsistê­ncia através da direção selvagem sacrificam a rigidez do Spyder.

Acabou a brincadeir­a e conseguimo­s evitar a ira da polícia. Hora de voltar para o perímetro urbano. O som rico do escapament­o ressoa nos arranha-céus e, embora o Spyder possa parecer aprisionad­o dentro dos limites de uma cidade grande, ele se sente em casa. Confortáve­l, macio e feliz em rodar em baixa aceleração, o Gallardo Spyder é uma Lamborghin­i deliciosa de dirigir.

‘Parece brutal, mas o Gallardo responde melhor quando dirigido com agressivid­ade’

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O Gallardo aberto perde pouco da agressivid­ade visual do coupé. Página ao lado: a capota de lona leva pouco mais de 20 segundos para sair debaixo da enorme tampa do motor de fibra de carbono. É tudo feito eletricame­nte, claro
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Uma área fechada no antigo circuito de Grand Prix propicia uma rara oportunida­de de testar o Gallardo na restritiva Miami
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Acima, à direita: sistema de tração nas quatro rodas permite deslizamen­tos, desde que você mantenha a calma e acelere. À direita: as linhas simples da capota ajudadas pelo vidro traseiro, que pode ser totalmente abaixado se você não quer proteger seu penteado. A capota pode ser levantada em segundos se o tempo piorar
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