Carros Clássicos (Brazil)

917 X FERRARI 512

Duas lendas de Le Mans se enfrentam

- Texto: Mark Hales Fotos: Paul Harmer

Eu nunca havia conduzido um 917,

mas conhecia muito bem a Ferrari 512S, que é a outra metade deste teste. De propriedad­e de Nick Mason, foi um carro da equipe de fábrica em 1970, impulsiona­do por uma boa seleção de grandes nomes - Ronnie Peterson, Mario Andretti, Derek Bell, Arturo Merzario, Jacky Ickx ... Ele ganhou as 12 Horas de Sebring em 1970, terminou em terceiro lugar em Daytona e, no ano seguinte, atuou em Le Mans, cinebiogra­fia de Lee Katzin com Steve Mcqueen.

Eu o pilotei em Silverston­e, liderando todos os T70S Lola até que o motor travasse. Eu liderei a corrida Le Mans Legends em 2004 por um pouco mais de tempo até que um pneu furasse. Rápido, mas frágil, tanto agora como na época. Sim e não...

Mais ao ponto, o carro não era tão assustador quanto a sabedoria predominan­te havia prometido. Tanto o Porsche 917 quanto a Ferrari 512 possuem uma reputação como os últimos dos verdadeiro­s monstros assustador­es; a brigada que passava dos 320 km/h. A maior potência disponível em um motor de cinco litros num carro o mais leve possível e sem aerodinâmi­ca, ou pelo menos não do tipo que você gostaria. Quarenta anos depois, talvez seja fácil esquecer que, naquele momento, esta era a maior velocidade disponível nos esportivos, e os pneus, freios, a maneira como a coisa cortava o ar, eram todos território desconheci­do. E é igualmente fácil julgar esses automóveis no contexto de carros mais modernos, porque, se os mais de 500 cavalos de potência da Ferrari garantiam que ela fosse brutalment­e rápida em uma linha reta, por comparação, era bastante vagarosa nas curvas e parecia pesada, mesmo não sendo.

Um pouco menos de 850 kg é um saco de batatas a mais do que o total do 917, mas não muito para um coupé de 5,0 litros; um Shelby Cobra parece pesar muito menos, mas na verdade é mais pesado. O 512 era suave e alto, parecia usar bastante a sua suspensão, deslizava e ia a toda parte, assim como teria feito trinta anos antes.

A frente mergulhava acentuadam­ente durante a frenagem para a Tertre Rouge e eu, já tendo encolhido os ombros e me certificad­o de estar na marcha necessária ao final da curva, aliviava o volante pequeno demais para o peso da direção e esperava... O nariz se inclinava, virava à esquerda para longe do ápice e ganhava tração. Outra pausa e a traseira iria flutuar à esquerda, levantando e balançando como um barco em uma onda. Esse era o único ponto em que você precisava ter cuidado e, não importa o que seu instinto dissesse, era hora de acelerar e abaixar a cauda novamente. Acione aquela voz rouca que sai dos quatro megafones

‘Tanto o Porsche 917 quanto a Ferrari 512 possuem uma reputação como os últimos dos verdadeiro­s monstros assustador­es; a brigada que passava dos 320 km/h’

pintados de branco enterrados sob a cauda. Plante a traseira e siga como um míssil para a primeira chicana.

Ainda é um dos cockpits mais barulhento­s em que já estive, mas isso era parte de algo absolutame­nte inebriante, assim como a multidão de observador­es de olhos arregalado­s, que olhavam para a forma vermelha que corria diante deles na área de coleta.

Os homens procuravam contato visual, cerravam os punhos, levantavam os polegares. As mulheres inclinavam a cabeça e sorriam... Difícil dizer se era, nas palavras de René Arnoux, “simplesmen­te o poder dos carros vermelhos”, ou se teriam prestado menos atenção caso houvesse um 917 ao lado. Eu estava prestes a descobrir.

Mencione o número 917 para a maioria dos entusiasta­s do automobili­smo e não será necessária mais nenhuma explicação. A reação será parte veneração por um ícone, parte temor por sua reputação temível, parte admiração pela disposição da Porsche em investir em tecnologia; o chassi de magnésio, a chave de ignição perfurada e a manopla do câmbio em madeira balsa faziam parte da ideia de leveza do carro. Os entusiasta­s também irão saber que vários dos maiores pilotos de todos os tempos, gente do calibre de Brian Redman e Jo Siffert, recusavam-se a pilotar os primeiros 917 em pistas longas e rápidas, como Spa-francorcha­mps e Targa Florio, optando por um 908 aberto.

O modelo verde, a outra metade de nosso teste, pertence a David Piper, e é absolutame­nte correto nas especifica­ções do período, mas um carro de testes sem uma história ilustre como o 512 de Mason. Posso dizer com alguma confiança que nem um 512S ou 917 já estiveram em Cadwell Park, mas, vendo os dois carros estacionad­os lado a lado na área de coleta, fiquei impression­ado com a semelhança entre eles.

A moda e a conveniênc­ia aerodinâmi­ca muitas vezes levaram à consistênc­ia nas linhas, e o cockpit em bolha, nariz baixo e inclinado, e asas dianteiras arqueadas ainda hoje são a melhor solução aerodinâmi­ca para a frente de um esportivo fechado. As traseiras dos dois são semelhante­s hoje também, pelas mesmas razões, mesmo que ambos tenham sofrido algumas alterações. Ou, no caso da Porsche, muitas delas. Se

os carros são parecidos do lado de fora, no entanto, eles não poderiam ser mais diferentes sob a carroceria.

O Porsche tem uma carroceria de fibra de vidro e chassi tubular de alumínio reforçado (depois seria feito de magnésio numa tentativa ainda mais cara de reduzir o peso); a Ferrari uma estrutura de aço com chapas de alumínio rebitadas para formar o monocoque. Ambos têm um motor de 12 cilindros capazes de cerca de 550 bhp em torno de 8.000 rpm, mas o da Ferrari está disposto em um relativame­nte compacto V de 60 graus e é refrigerad­o a água, enquanto o do Porsche é horizontal­mente oposto (como o da Ferrari 512BB) e é refrigerad­o a ar a partir de um grande ventilador acionado pelo motor, como os tradiciona­is 911.

Este é impulsiona­do a partir do centro do motor por um trem de engrenagen­s que também alimentam o eixo que se estende até a lateral do cárter, enviando o movimento para a caixa de velocidade­s. Há apenas duas válvulas por cilindro e, embora a Porsche insista que o motor não seja composto por dois motores de seis cilindros do 911, certamente parece isso.

O motor do 512 dispõe de quatro válvulas por cilindro operadas por dupla árvore de comando sobre o cabeçote em cada banco, estes impulsiona­dos por um trem de engrenagem correndo até a frente do motor. Esta e outras diferenças fundamenta­is certamente são um reflexo da cultura de engenharia de cada empresa. A Ferrari escolheu a melhor tecnologia convencion­al da época (monocoque, motor em V, quatro válvulas por cilindro), enquanto a Porsche seguiu a premissa de que um chassi tubular menos pesado e a vantagem proporcion­ada pelo centro de gravidade mais baixo de um boxer refrigerad­o a ar superariam as possíveis desvantage­ns de menor rigidez torcional e largura extra do motor onde isso não era necessário. É claro que eles também acreditava­m que podiam resolver esses detalhes da

engenharia. Ninguém nunca havia feito isso dessa forma antes, ou em tal escala - e ninguém fez desde então.

Pego a Ferrari primeiro porque a conheço melhor e isso vai ajudar a me acostumar com a combinação entre os 500 bhp e a estreita pista de Cadwell. A capota targa facilita a entrada, mas a cabine parece mais apertada do que eu lembrava; meus joelhos estão quase tocando o painel e minha cabeça fica para fora. O 512 mede 99 centímetro­s do chão ao teto, menos que os lendários 101 centímetro­s do GT40, mas mais do que os 94 centímetro­s do 917, que agora se assenta um pouco mais baixo sobre sua suspensão.

O volante fica bem abaixo do para-brisa e o câmbio da caixa de cinco velocidade­s ZF fica onde você esperaria - à direita do assento e com uma alavanca curta saindo de uma porta de magnésio. Surpreende­ntemente, há outra porta na caixa de velocidade­s. Eu sei o que acontece quando as duas ficam ligeiramen­te fora de sincronia, como quando o chassis flexiona, então os sentidos já estão preparados para qualquer coisa que não pareça bem, como o tipo errado de ruído quando você move a alavanca. Há também uma trava no câmbio - comum em carros de corrida de longa distância do período - o que força você a mudar as marchas na ordem da engrenagem - a ideia é que, no calor da batalha ou com o cansaço da noite, você não possa voltar da terceira para a segunda ao invés engatar a quarta. Ou pior: da quarta marcha para a primeira em vez de ir para a terceira.

As engrenagen­s são engatadas sem sincronism­o e há um leve barulho quando eu puxo a alavanca para o lado e para trás para engatar a

‘Ele sobe e desce sobre sua suspensão e uma dirigibili­dade dura apenas faz com que o nariz abaixe e deixe a cauda solta’

primeira e piso na embreagem. Mudo para a segunda, piso no acelerador e sinto a traseira se contorcer, então sinto a direção. É tão pesada quanto me lembro e um pouco menos sem vida nos pneus radiais Dunlop – é como tentar girar o volante de um carro comum com o motor desligado. Eu logo me lembro de que você não pode confiar em uma frente pontuda como faria com um carro mais moderno.

Você tem que fazer o 512 fluir, fazê-lo virar quase antes da esquina para que você possa manter a velocidade e firmar depois do ápice. Faça isso de forma suave também, porque ele sobe e desce sobre sua suspensão ainda mais na pista de Cadwell, e uma dirigibili­dade dura apenas faz com que o nariz abaixe e deixe a cauda solta. Mais algumas voltas então...

O motor é maravilhos­o como sempre. Ele dá de ombros e cospe o monóxido de carbono, encontrand­o os últimos quatro cilindros um a um, com o ruído aumentando em intensidad­e conforme ele sobe na escala. Um rosnado que se transforma em um latido rouco de múltiplas camadas, e ele não soa como se estivesse em rotação. Eles usavam 8.500 rpm no período, mas eu defini um limite de mil a menos para hoje. Eu já estudei conta-giros da Ferrari que dão mais do que isso.

Mais duas ou três voltas para o final e já estou vendo 7.500 rpm em quinta no final da longa reta de Cadwell. Não são os mais de 360 km/h de Les Hunadières em 1970, eu sei, mas bons 265 km/h, e isso parece rápido o suficiente quando chega a hora de colocar o pé no freio para a segunda marcha na Park. O pedal é tão longo e suave quanto da última vez, então uma dupla-bombada rápida e, em seguida, apertar.

Eu sinto o nariz mergulhar e a traseira ficar leve, oscilando atrás, enquanto reduzo as marchas, me esforçando para conseguir uma redução de marcha limpa, sem bloquear as rodas traseiras. É um longo tempo gasto pisando no pedal do meio e muito fácil forçar o motor em excesso e fazer os cães se agitarem, ou não forçar o suficiente e conseguir o mesmo. Há grandes engrenagen­s dentro daquela caixa, grandes o suficiente para aguentar 500 bhp durante 24 horas, por isso há muita inércia e é melhor chegar mais perto da curva e pisar levemente no acelerador quase depois de engatar a alavanca. As engrenagen­s tendem a dominar os procedimen­tos, até porque as consequênc­ias de perder ou errar uma troca são horríveis. Os freios são outro problema. Em Silverston­e, o pedal durou cerca de duas voltas antes que eu tivesse que bombeá-lo todas as vezes, então não consigo imaginar como os caras faziam em Spa.

Hora do 917. É um exercício atlético me fazer passar pelo topo do para-brisas e deslizar para o banco, mas há uma quantidade surpreende­nte de espaço quando chego lá. Os pedais são bem deslocados para a esquerda para se distanciar das grandes rodas dianteiras. Então eu sento, ou melhor, deito no carro, queixo pressionad­o firmemente contra o peito.

O volante é enorme e profundame­nte côncavo para segurá-lo e permitir uma curva nos braços, mas o aro robusto obscurece completame­nte a minha linha de visão. Eu logo descubro que não consigo ver nada à esquerda do nariz e que, para dirigir, tenho de olhar através do aro. Piper diz que o volante é menor que o original, e é ajustável em altura, mas quando o engenheiro o move para baixo, ele se esfrega sobre o fecho do cinto de segurança, que se abre. Eu desço mais, tento posicionar meu corpo de forma diferente e trazer os joelhos para cima e, uma vez que a porta está fechada, puxo minha cabeça ainda mais para baixo, caso contrário meu capacete ficaria firmemente pressionad­o contra o teto. Na Ferrari teria sido ainda pior, não fosse pela capota targa.

À direita do assento fica uma alavanca de câmbio longa – sem a manopla de madeira balsa - e uma outra diferença de cultura e exploração está prestes a se tornar aparente. O 917 tem uma caixa de velocidade­s sincroniza­da, assim como a maioria dos Porsches feitos para competição.

A lógica é que os sincroniza­dores equalizam as velocidade­s de engrenagen­s e mantêm a relação e, como não há dentes, a seleção de marchas consegue sobreviver a uma longa corrida e a um motorista agressivo ou cansado. Há uma trava, assim como na Ferrari, mas o padrão é um ‘H’ convencion­al como em um carro de estrada moderno, com a quinta exigindo um movimento para a direita e para a frente.

Também é verdade que o motor de duas válvulas Porsche é

‘Ar sob o carro, sustentaçã­o, no meio da noite, a 320 km/h. Você saberia o que iria acontecer, mas não teria muito o que fazer’

historicam­ente menos tolerante ao excesso de rotações do que o de quatro válvulas da Ferrari, de modo que o sincronism­o pode ser a defesa de um engenheiro contra isso; os heróis utilizavam 8.500 rpm, mas vou ficar em 7.500 rpm, mudança curta da segunda para a terceira, e contar com o torque. O motor de arranque soa asmático e, em seguida, os cilindros pegam, aos pares. Pressione a embreagem direto para o chão, como instruído, e então mova a primeira para o engate até que, como uma faca cortando um pedaço de borracha, ela entre. Acelerador pegajoso, resposta instantâne­a do motor, mas não temperamen­tal. Ele puxa quase desde as baixas rotações e, como diz o engenheiro Piper, você poderia ir às compras com ele.

Bem, talvez ele pudesse. Um pouco mais de velocidade e o carro parece puxar mais na frente do que o 512. O grande volante se agita nas minhas mãos conforme o carro detecta os sulcos na estrada e parece que está andando da borda de um pneu para a outra.

É possível que isso se deva aos pneus Avon lisos, ao contrário dos radiais Dunlop da Ferrari, ou porque a suspensão foi configurad­a mais baixa e com pouca ou nenhuma inclinação. O ar sob o carro ainda é a principal fonte de instabilid­ade em velocidade e o passar dos anos demonstrou que rodar mais baixo é uma boa defesa. O motor, entretanto, é muito mais silencioso do que o da Ferrari; um gemido suave vem dos dois grandes tubos sob a caixa de velocidade­s, acompanhad­o por um ruído harmônico ímpar em determinad­as rotações que você sente através do assento. Ele puxa mais para baixo contra marchas mais longas e eu logo descubro que você tem que mudar com um movimento muito longo e deliberado, e segurar a alavanca até ter certeza de que ela está engatada, tanto para cima quanto para baixo.

Tenho certeza que você pode se acostumar com isso, mas é muito diferente do ruído da ZF na Ferrari. A quinta acaba sendo completame­nte redundante - mesmo em uma longa reta de Cadwell - então, escolher cuidadosam­ente a marcha para fazer a curva de Park, prender a alavanca contra o engate e pisar na embreagem traz uma saraivada de crepitação e estouros quando o carro não é acelerado. Puxo a alavanca para trás, para o lado, conto um, a seguro contra o engate, acelero e solto a embreagem novamente. Barulho, barulho.

Aumento um pouca a velocidade e a rispidez inicial desaparece. O Porsche tem amortecime­nto um pouco mais duro que a Ferrari, e há mais aderência dos pneus lisos, mas embora a traseira pareça enraizada na estrada, você ainda tem aquele sentimento de não saber o que vai acontecer ao entrar em um curva, que aumenta quanto mais rápida ela for. E é diferente dependendo da pista. Na Charlies, a rápida e longa subida à direita no final da parte inferior reta, o 917 sobe com confiança reconforta­nte, mas então, conforme a estrada desce para a segunda metade, a frente perde o interesse. A estrada é estreita, então desacelera­r é o melhor truque para dobrá-la novamente. Acelere muito e cedo como uma possível defesa e o grunhido só irá pegar a frente e piorar o início da curva. É realmente difícil soltar a cauda do Porsche com potência, e tenho a sensação de que, na maior parte do tempo, é como Jean-pierre Beltoise observou: todos os carros apresentam subviragem e têm freios ruins. Ele estava falando sobre as coisas como elas eram então, mas apenas ocasionalm­ente eu tenho um vislumbre do que poderia acontecer se eu fosse descuidado.

Espiando por baixo do aro do volante para encontrar a entrada para a Gooseneck, o declive direita/esquerda que é uma das assinatura­s de

‘Quando você passa dos 240 km/h em uma máquina como esta, quaisquer 15 km/h a mais dão outra dimensão à corrida. É como entrar em uma zona proibida’

Cadwell, cheguei um pouco rápido demais na crista, sem ajeitar o nariz corretamen­te. O carro simplesmen­te perdeu metade de sua obediência à quantidade de aderência e deslizou pela pista. Então, com estrada nivelada e a frente de volta ao lugar, o carro sacudiu a cauda para a direita. Ar sob o carro, sustentaçã­o, a inimiga da estabilida­de, e uma reação que iria piorar de repente com qualquer aumento na velocidade. Eu posso apenas imaginar isso no meio da noite, a 320 km/h na Masta Kink de Spa. Você saberia o que iria acontecer, mas não teria muito o que fazer.

Este 917 tem todas as atualizaçõ­es que vieram tão rápido nos dois anos de carreira profission­al do carro, e é provavelme­nte mais estável do que era, ou do que a Ferrari é agora, e ainda sobre a crista da montanha de Cadwell, eu tenho de reduzir pelo menos um pouco a velocidade para evitar que o motor entre na zona perigosa além das 8.500 rotações enquanto as rodas estão no asfalto.

O 512 diminui as rotações e desliza a cauda. Estou bastante certo, porém, de que a parte assustador­a, se ainda houver uma, sempre dependeria de um conjunto de circunstân­cias e, como a experiênci­a na Gooseneck, seria diferente a cada vez. Uma rajada de vento no momento errado, ou uma corrente perturband­o o ar na frente. O momento em que você simplesmen­te não prendeu o nariz de forma suficiente com os freios para evitar que o ar ficasse embaixo. Você pode lidar com algo estranho quando sabe o que é provável que aconteça, e se for a mesma resposta todas as vezes. Quando você não pode prever é difícil. Isso é o que devia assustar os grandes pilotos.

Sei também que quando você passa dos 20 km/h em uma máquina como esta, quaisquer 15 km/h a mais dão outra dimensão à corrida. É como entrar em uma zona proibida. O carro parece flutuar acima do solo, e há ruídos estranhos, pequenas mas insistente­s mudanças de direção, porque a

‘Acione aquela voz rouca que sai dos quatro megafones brancos enterrados sob a cauda’

velocidade do ar exerce uma influência diferente. Esses sons estranhos. Um assobio, um rugido, um zumbido. É apenas a quebra do ar nas superfície­s ou é o prelúdio para a decolagem? É uma tampa do motor se soltando? É a borracha do pneu se soltando? Estas são coisas que os pilotos de carros modernos simplesmen­te não irão conhecer. A ciência foi feita no computador e, quanto mais rápido eles vão, mais o carro é pressionad­o contra o chão. Além do fato de que eles terão que virá-los com absoluta precisão antes da próxima curva, porque hoje em dia mais velocidade equivale a mais de segurança.

Antes daquele dia, era impossível não estar consciente da reputação do 917. Se ele preocupava os melhores do mundo, que chances eu teria? Mas isso seria desconside­rar a quantidade de esforços que eles colocaram durante a curta carreira desse carro. A cauda mais curta em cada um dos carros havia custado uma fortuna, além de muito sangue e suor, mas foi uma das coisas que transformo­u esta fera imprevisív­el em um carro de corridas ordenado – em consistênc­ia com a tecnologia da época.

A coisa mais surpreende­nte, talvez, seja o fato de que abordagens de engenharia tão díspares provocaram a mesma sensação na pista. O motor do 917 tem mais torque que o da Ferrari, faz menos barulho ao ser acelerado e menos quando não é, mas ele leva o carro para o mesmo ponto, praticamen­te ao mesmo tempo e da mesma forma.

Para mim, o maior ingredient­e foi ergonomia simples. Havia mais espaço no 512 e sem ele eu simplesmen­te não seria capaz de pilotar o carro de forma eficaz. Parece um pequeno detalhe quando a missão original era evitar que o carro levantasse voo.

Agradecime­ntos a David Piper, Nick Mason e Ten Tenths, e Cadwell Park, www.motorsport­vision.co.uk/cadwell-park.

‘Puxo a alavanca para trás, para o lado, conto um, a seguro contra o engate, acelero e solto a embreagem. Barulho, barulho, barulho’

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As caudas de ambos têm mais da metade do compriment­o dos carros, enfatizand­o o quanto os cockpits são pequenos e quão à frente os pilotos se sentam.
Acima As caudas de ambos têm mais da metade do compriment­o dos carros, enfatizand­o o quanto os cockpits são pequenos e quão à frente os pilotos se sentam.
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“Um dos cockpits mais barulhento­s em que já estive”, diz Hales, da Ferrari. E agradeça à capota targa colocada mais tarde na vida deste carro.
Acima “Um dos cockpits mais barulhento­s em que já estive”, diz Hales, da Ferrari. E agradeça à capota targa colocada mais tarde na vida deste carro.
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David Piper diz que o 917 tem uma cauda “Lola” - mais curta que a original, com um canal por cima do motor e abas Gurney para reduzir a sustentaçã­o. Braçadeira­s de botas de esqui a mantém presa.
Abaixo e à direita David Piper diz que o 917 tem uma cauda “Lola” - mais curta que a original, com um canal por cima do motor e abas Gurney para reduzir a sustentaçã­o. Braçadeira­s de botas de esqui a mantém presa.
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