Carros Clássicos (Brazil)

FORD TUDOR

Depois de assistir a um filme sobre rodders na década de 1960, o futuro médico passou a sonhar em ter seu próprio hot rod. Mais de 30 anos depois, o resultado é um modelo de cinema

- Texto: Rogério Ferraresi / Fotos: Saulo Mazzoni

Vigorosa paixão

Omédico Dimitrius Samaras, criador do grupo “Amigos do Hot”, cultiva sua paixão pelos hots há muito tempo. Tudo começou em 1964, quando, ainda adolescent­e, assistiu ao filme “The Lively Set” – rebatizado no Brasil como “Demônios da Pista”. O longa impression­ou a juventude da época, e Dimitrius não foi exceção. Sua cena preferida ocorre logo no início da projeção, que começa com um vigoroso racha.

O tempo passou, Dimitrius formou-se em medicina, casou, mas a idéia de ter um carro exclusivo, como os hots daquele filme, jamais foi abandonada. Em 2000, ele encontrou um combalido Ford Modelo A Tudor 1932. Era o que precisava para iniciar a realização do velho sonho – que quase virou um pesadelo. “O estado do veículo não era dos melhores, embora já tivesse passado por alguns reparos”, explica Dimitrius.

Apesar desse detalhe, o médico estava feliz com a aquisição. Juntou todos os pedaços do carro e os levou para uma oficina mecânica que, segundo lhe informaram, era “especializ­ada” na construção de hots. Ele logo descobriu, entretanto, que a oficina praticamen­te não mexeu no carro, apesar de cobrar “religiosam­ente pelos serviços”.

“Eu paguei caro, mas basicament­e apenas pelo estacionam­ento do carro”, lembra. Desanimado, ele quase desistiu do projeto, tirando o carro da oficina e levando-o para um estacionam­ento “de verdade”. Alguns meses depois, Dimitrius esfriou a cabeça e decidiu procurar profission­ais de confiança.

Após encontrar uma nova oficina, um dos primeiros passos foi modificar o chassi original que, no lugar dos feixes de mola dianteiros, recebeu toda a suspensão do Opala. Na traseira, o eixo original deu lugar ao do Ford Maverick V8, com relação de diferencia­l de 3,07:1. Ainda, na suspensão traseira, o proprietár­io resolveu dar um toque de originalid­ade: “Após estudar vários hots montados nos Estados Unidos, decidi adaptar em cada ponta do eixo braços móveis paralelos, além de molas e amortecedo­res traseiros Pro-link, da moto Honda XL250”.

NADA SE PERDE

O hot também tem freios a disco ventilados na dianteira vindos do Opala, enquanto os traseiros, a tambor, são do Maverick. “A caixa de direção é do Escort e trabalha em conjunto com uma coluna ajustável Chevrolet”, relata Dimitrius. O tanque de gasolina, originalme­nte montado entre o motor e o painel, em local pouco seguro, foi substituíd­o por um reservatór­io de Kombi instalado embaixo do banco traseiro.

Mas a procura por um bloco V8 em bom estado foi longa, até que Dimitrius descobriu num ferro-velho o conjunto de motor e câmbio Chevrolet 350 (5.700 cm³) seminovo. Tratava-se da mecânica de um Camaro que havia pertencido à embaixada americana, mas sofrera um princípio de incêndio. O motorista parou no acostament­o, apagou o fogo e foi pedir ajuda. Porém, quando ele se afastou, um caminhão saiu da pista e destruiu o carro.

TUDO SE TRANSFORMA

“O motor, que tem cerca de 270 cv de potência, estava limpo e sem uma gota de óleo no bloco, o que me animou a levar o conjunto para casa.” A adaptação da mecânica, porém, exigiu a fabricação de novos suportes para os coxins, além do encurtamen­to do eixo cardã. O capô original, dobrável como era comum na época, deu lugar a uma pequena tampa fixa que deixou as laterais descoberta­s e o motor exposto, enquanto a parede de fogo teve de ser recuada em 20 centímetro­s (também para acomodar o motor Chevrolet).

O assoalho, originalme­nte de madeira, foi refeito com chapas de aço, o que garante mais resistênci­a à torção. O teto, tal como faziam os pioneiros do fenômeno hot rodding, foi rebaixado em 7 centímetro­s. Na traseira, os pára-lamas tiveram as caixas internas ampliadas para a colocação de pneus mais largos e toda a carroceria foi raspada até a chapa, para eliminar pontos de ferrugem. Após receber o fundo anticorros­ivo, o hot foi pintado com uma cor bem chamativa: vermelho Paris, tom metálico da linha Ford 1997. Como os pára-choques originais também estavam atacados pela ferrugem, foram substituíd­os por tubulares cromados, semelhante­s aos utilizados nos bugues. O Tudor também tem rodas Mangels cromadas e pneus Cooper Cobra 215/60R15 e 225/60R15.

EM MOVIMENTO

Carro pronto, o passo seguinte foi colocá-lo em movimento. Porém, quando Dimitrius deu a partida, botou a alavanca seletora em “Drive” e acelerou, nada aconteceu. Após testar todos os engates, descobriu que somente a marcha-à-ré funcionava. Motivo do problema? Ou o Camaro havia sido guinchado com o eixo traseiro no chão, o que, geralmente, afeta a caixa automática, ou algum componente eletrônico do sistema de seleção de marchas foi destruído no incêndio.

A solução foi comprar uma caixa Powerglide que, apesar de um pouco mais antiga, estava em ótimo estado de conservaçã­o. O hot finalmente passou a rodar, mas o proprietár­io ainda teve que fazer algumas adaptações, como a instalação da ventoinha do Lexus e

as maçanetas de Rural Willys. “As originais tinham preço proibitivo”, argumenta Dimitrius, que também colocou vidros verdes e um completo painel de instrument­os com velocímetr­o, conta-giros, termômetro de água, marcador do nível de combustíve­l, além de conjunto de luzes-espia.

O hot ganhou bancos dianteiros individuai­s e foi licenciado em novembro de 2000. Mas, durante algum tempo, Dimitrius só o usou esporadica­mente, em “passeios de teste”. Assim, concluiu que a suspensão traseira de moto, excessivam­ente dura, ainda não era a ideal. Para solucionar o problema entrou em contato com uma empresa americana, especializ­ada em produzir um conjunto de molas e amortecedo­res reguláveis.

O médico fez os cálculos de quanto gastaria para importar os componente­s e tomou um susto. Somando a disparidad­e de valores do dólar para o real, acrescido das despesas de envio e os impostos que incidiam, o custo da “brincadeir­a” mostrou-se inviável. Pouco tempo depois, entretanto, descobriu um especialis­ta em Curitiba (PR), que faz réplicas da referida suspensão com componente­s nacionais.

Foi só comprar o kit nacionaliz­ado e instalar para o comportame­nto do hot mudar radicalmen­te. O carro, além de ter ficado mais macio, deixou de pular ao passar por ondulações e lombadas, obstáculos bastante comuns nos castigados calçamento­s brasileiro­s. Mas, como todo rodder, Dimitrius sabe que qualquer hot rod sempre pode ser aperfeiçoa­do, o que significa que a história do carro do médico não pára por aqui.

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O motor 350 V8 do Ford Tudor veio de um Chevrolet Camaro
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Equipado com rodas Mangels cromadas e pneus Cooper Cobra, o hot também utiliza a suspensão dianteira do Opala
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 ??  ?? Bancos revestidos em couro preto e painel com instrument­os de fundo branco demonstram o esmero no acabamento do hot
Bancos revestidos em couro preto e painel com instrument­os de fundo branco demonstram o esmero no acabamento do hot
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O teto foi rebaixado em sete centímetro­s, dando ao velho Tudor um aspecto agressivo
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Detalhe da pequena águia estilizada sobre a tampa do radiador e feita em resina

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