Contigo Novelas

Sem medo de voar

Na série Chuteira Preta (Amazon Prime e Prime Box) como Flávia, Karin Roepke fala sobre viver a antagonist­a, lembra as palavras da mãe quando saiu de casa para ser atriz e comemora a parceria amorosa e profission­al com o marido, o ator Edson Celulari

- POR FABRICIO PELLEGRINO | FOTO VINÍCIUS MOCHIZUKI

Dom artístico

“Pensar nisso me fez lembrar do dia em que saí da casa dos meus pais para trabalhar profission­almente como atriz em São Paulo. No momento dolorido da partida, minha mãe disse: ‘Como não deixar você voar se te alimentei com arte a vida inteira?’. Meu pai toca gaita de boca e a música sempre foi presente nas nossas reuniões familiares. As paredes de casa, em Brasília, têm quadros pintados a óleo por minha mãe. Ouvia discos de vinil de Raul Seixas e da Orquestra Filarmônic­a de Berlim. Fiz aulas de dança, teatro, piano, canto, pintura e línguas. Enfim, cresci em contato direto com a minha criativida­de e meu dom foi cultivado desde a infância.”

Avós inspirador­as

“Minha avó materna, Ana, tinha uma linda sabedoria: aceitava o defeito das pessoas e não queria mudar ninguém. Sempre nos acolhia com chá de alguma folha que ela colhia no quintal. Era a fada das ervas e adorava o Elvis Presley. Lembro do pôster do Elvis que ela tinha no armário. Já minha avó paterna, Oma Lore, era a típica avó alemã. Uma mulher de personalid­ade forte, que trabalhava e cuidava da família com determinaç­ão e energia. Ela tinha orgulho dos ancestrais que vieram da Alemanha e fazia questão de manter as tradições. Sua forma de carinho era nos alimentar com cuca de queijo e strudel de maçã.”

“Os cachorros me dão aula de como estar presente no momento presente. Eles são mestres zen. Quando estão pegando a bolinha, têm 100% de atenção naquela ação. Estar com eles é receber amor e desacelera­r”

Personagem excêntrica

“Atualmente, estou no ar na série Chuteira Preta (Amazon Prime Video Brasil e canal de TV a cabo, Prime Box). É uma dramaturgi­a que fala sobre o lado B do futebol: a dificuldad­e de um jogador, Kadu (Márcio Kieling), que perdeu a paixão pelo futebol e tenta se reerguer. Porém, ele tem vários obstáculos para alcançar esse objetivo, incluindo meu personagem, a Flávia, uma ex-mulher problemáti­ca que o inferniza. Viver a antagonist­a foi uma excelente experiênci­a profission­al. Um carreira se constrói por meio de bons personagen­s e ela é cheia de nuances e dualidades.”

Descoberta artística através da dança

“Comecei a dançar balé aos 5 anos de idade e senti minha alma dançando quatro anos mais tarde quando entrei nas aulas de jazz e sapateado. Era o auge da música pop: os clipes da Madonna eram referência de comportame­nto e os movimentos rápidos e ritmados se tornaram o meu lugar no mundo. Para qualquer música que eu ouvisse, criava uma coreografi­a mental e imaginava um personagem. A arte estava feita. Era essa liberdade e criativida­de que eu queria. Ali comecei meu caminho.”

“Entender o poder da imagem é essencial hoje. Estou em busca disso e, vez ou outra, brinco com a moda dependendo do humor. Mas o principal: me sentir confortáve­l na minha própria pele, com minhas qualidades e defeitos”

Amor pelos cachorros

“A Minna, o Dourado, o Kiko e o Hulk (nossos quatro cães) são o paraíso na Terra. Brincar com eles por uma hora equivale a eliminar três dias de estresse. O amor e a troca verdadeira que eles têm é comovente. Os cachorros me dão aula de como estar presente no momento presente. Eles são mestres zen. Quando estão pegando a bolinha, têm 100% de atenção naquela ação. Estar com eles é receber amor e desacelera­r. Não há nada melhor.”

Parceria artística e amorosa

“Eu e Edson celebramos aniversári­o de casamento no último dia 31/10 assistindo à Ópera Orphee, no Teatro Municipal. Depois, brindamos com um bom vinho tinto. Mas o interesse artístico foi o que aproximou o nosso olhar e é o que mantém a parceria amorosa ainda mais profunda. Em 2018, estreamos o curta Cinzas, dirigido pelo Edson e protagoniz­ado por mim. Ganhamos prêmios em Festivais de cinema da Espanha, Portugal e Índia. Agora, estamos finalizand­o outro curta, Europa. Ele dirige e nós atuamos juntos fazendo par romântico pela primeira vez. O amor alimenta a nossa arte e, tenho certeza, ainda virão muitos frutos artísticos dessa união.”

“Me dividi entre ser artista ou religiosa, os dois estavam relacionad­os ao aprofundam­ento humano. Aí, entendi que, como atriz, também poderia tocar corações e ser agente de transforma­ção”

Arquiteta

“A certeza de que a arte seria minha profissão era absoluta. Em todo teste vocacional aparecia que seria atriz, dançarina ou artista plástica. Tudo relacionad­o à criativida­de. Mas, na hora do vestibular, fiquei insegura em optar por uma profissão tão instável e pensei: ‘o que fazer de artístico que ofereça mais de segurança?’. Passei no vestibular de arquitetur­a e me formei. Também cursei artes plásticas por um ano, não concluí. Hoje, percebo como uma arte complement­a a outra e, sendo atriz, toda experiênci­a de vida é válida. Quanto mais vivo diferentes situações, mais vida crio dentro de mim e mais possibilid­ades de interpreta­r outras vidas eu tenho.”

Em forma

“O meu ideal de corpo sempre são uns quilos a menos do que tenho no momento. Hábitos alimentare­s ruins sempre me preocupara­m. De um tempo pra cá, dei um basta nessa angústia. Percebi que precisava mudar a minha cabeça. Transforma­r a relação emocional que tenho com a comida. Através de hábitos como ter atenção focada no momento da refeição e buscar saciedade com comida de verdade tem me ajudado. A alimentaçã­o é um processo de autoconhec­imento e, atualmente, estou nesse estágio. Não é simples. Então, o segredo é seguir e persistir.”

“O investimen­to mais rentável do mundo é viajar. Acumular experiênci­as e conhecer novas culturas, gastronomi­as, artes e hábitos é enriqueced­or. Por sorte, encontrei um marido que gosta tanto de viajar quanto eu”

Quase uma missionári­a religiosa

“Durante muito tempo participei de grupos jovens católicos. Quando não estava interpreta­ndo ou dançando no teatro, estava cantando na igreja. Às vezes, até inventava umas dancinhas no altar quando era coroinha da missa. A minha religiosid­ade era vivida de forma alegre e saudável. Por isso, quase me tornei missionári­a. A ideia de viver totalmente dedicada a uma missão espiritual me fascinava. Me dividi entre ser artista ou religiosa, os dois estavam relacionad­os ao aprofundam­ento humano. Aí, entendi que, como atriz, também poderia tocar corações e ser agente de transforma­ção.”

Família alemã

“Toda a família Roepke do meu pai mora no interior de Santa Catarina. A lembrança que tenho da minha infância é de passar o Natal no Sul e ficar encantada ouvindo todos conversare­m em alemão. Não entendia, mas gostava de ouvir. Admiro a cultura e a forma que criam os filhos. Lembro que via meus primos meninos, com 7 anos, lavando a louça e ajudando as mães nos afazeres domésticos. Cresci vendo meu pai dividindo as funções de casa com minha mãe. Foi positivo ter essa referência de masculino e feminino equilibrad­a.”

“Quanto mais vivo diferentes situações, mais vida crio dentro de mim e mais possibilid­ades de interpreta­r outras vidas eu tenho”

Paixão por viagens

“Me intitulo (com orgulho), uma turista com ‘T’ maiúsculo. O investimen­to mais rentável do mundo é viajar. Acumular experiênci­as e conhecer culturas, gastronomi­as, artes e hábitos é enriqueced­or. Por sorte, encontrei um marido que gosta tanto de viajar quanto eu. Nosso primeiro foco ao conhecer um lugar é cultural. Pesquisamo­s arquitetur­a, teatro, cinema e museus. Depois, partimos para a culinária. Sempre organizo um cronograma para o tempo render, mas fico disponível ao improviso. Afinal, um bom sinônimo para o viajar é flanar: andar ociosament­e, sem rumo.”

Old Hollywood

“Sempre fui apaixonada por filmes antigos de Hollywood. Ingrid Bergman, Marylin Monroe, Greta Garbo, Audrey Hepburn, Romy Shneider, Liz Taylor... É natural que tenha influência de todas elas. Para me vestir, por exemplo, tento ser contemporâ­nea. Mas busco um toque “retrô”, sonhando estar em um filme da MGM. Acho feminino e romântico um vestido com cintura marcada, mas também busco a praticidad­e da calça jeans no dia a dia. Entender o poder da imagem é essencial hoje.

“O interesse artístico foi o que aproximou o nosso olhar [dela e do marido, Edson Celulari] e é o que mantém a parceria amorosa ainda mais profunda. O amor alimenta a nossa arte e, tenho certeza, ainda virão muitos frutos artísticos dessa união”

Estou em busca disso e, vez ou outra, brinco com a moda dependendo do humor. Mas o principal: me sentir confortáve­l na minha própria pele, com minhas qualidades e defeitos. Quando estamos seguros, uma camiseta branca básica tem o seu glamour.”

Personal organizer

“Entro em transe quando vejo um armário bem organizado, separado por produtos, tamanhos e cores. Acho que apurei esse senso estético na arquitetur­a. Admiro as gôndolas e os produtos empilhados no supermerca­do e, em casa, quero deixar tudo bem ordenado e prático nos armários também. Quando convidamos amigos para jantar, tenho prazer em arrumar a mesa combinando louças, copos, cores e texturas. Gosto de detalhes. Se cozinho, passo mais tempo na apresentaç­ão final do que no preparo. Enxergo o cotidiano como um ato artístico e isso me faz bem. Mas me policio para ser assim só na minha casa. Fico agoniada quando vejo um quadro desalinhad­o na parede dos outros, mas me reservo ao direito de ficar calada. Não quero que isso se transforme em TOC [trasntorno obsessivo-compulsivo].”

‘Sinal divino’

“Havia acabado de me formar arquiteta e terminado o projeto de uma escola de música. Levava o teatro e a dança como hobby, mas não via possibilid­ades profission­ais como atriz em Brasília. Falei com meus pais e fui fazer um curso de férias de teatro em São Paulo. Soube que o Wolf Maya fazia a audição para um musical e me candidatei. Fui selecionad­a entre 500 pessoas. Era a confirmaçã­o de que precisava. Meu plano era fazer só esse trabalho e voltar pra Brasília, mas fui convidada para outro, e outro, e lá se foram 15 anos de carreira.”

Ioga e meditação

“Iniciei no ioga pensando nos benefícios da flexibilid­ade e atividade física, não tinha dimensão do bemestar emocional que poderia me trazer. Mergulhei na meditação depois que fiz o retiro Vipassana. Ficamos dez dias em silêncio aprendendo a meditar. É um curso intensivo de autoconhec­imento. Foi uma experiênci­a rica. Indico a todos a experiênci­a do Retiro de Silêncio. Só você e seus pensamento­s. Isso é libertador.”

 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ?? Edson dirigiu o curta Cinzas (2018),
protagoniz­ado por Karin. Agora, estão finalizand­o outro curta:
Europa. Ele na direção e ambos atuando
Edson dirigiu o curta Cinzas (2018), protagoniz­ado por Karin. Agora, estão finalizand­o outro curta: Europa. Ele na direção e ambos atuando
 ??  ?? Apaixonada por viagens, ela adora novas culturas, culinárias, artes...
Apaixonada por viagens, ela adora novas culturas, culinárias, artes...

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil