Contigo Novelas

Cara a tapa

De volta à novela Bom Sucesso (Globo) como Virgínia Alcântara, Suzana Pires fala sobre se arriscar como atriz, autora de folhetim e, agora, empreended­ora social. Tudo sem perder a marca registrada: o largo sorriso

- POR ANDRÉ ROMANO | FOTOS GUSTAVO NOGUEIRA BELEZA: GUTO MORAES

Sua participaç­ão estava prevista na trama?

Não. Gosto muito de novela e nos últimos três anos me dediquei apenas a escrever. Aí, pintou um espaço na agenda para eu entrar em uma trama. Sou muito próxima da Rosane [Svartman, autora de Bom Sucesso], ela é uma mentora, alguém em quem me inspiro… Enfim, conversamo­s e eu meio que me ofereci. Perguntei: “Não tem nada para eu fazer lá na novela? Posso passar correndo atrás”. Além do mais, adoro e estou acompanhan­do a trama. Dois dias depois ela e o Paulo [Halm, autor da trama também] me avisaram: “A gente já escreveu”.

Você faz falta na TV…

Fico muito grata pelas pessoas não esquecerem de mim [risos] e me dizerem: “Eu sei que você está sem fazer novela porque dirige, produz, mas faz falta”. Ou seja, elas sabem que faço outras coisas dentro da TV, mas fico feliz por sentirem a minha falta e por ter espaço para voltar. Também sinto muita falta.

Como você vê a Virgínia?

A Virgínia Alcântara, assim como a Silvana Nolasco [Ingrid Guimarães], é uma atriz, mas é de um outro extremo. A Silvana é mais celebridad­e e a Virgínia é mais do teatro, complexa. As duas se acham grandes estrelas, mas Virgínia se considera mais cabeça.

“O maior perigo desta profissão é se perder na vaidade. Todo mundo me pergunta como começar um curso de teatro e sempre digo ‘comece com uma terapia’”

Existe uma relação de amor e ódio entre as duas. Eu e Ingrid já fizemos um grande sucesso juntas no cinema, somos amigas há anos, então o jogo é rápido.

Você assistia à trama antes de entrar na história?

Sim! Eu até tuitava ‘‘Fabiula [Nascimento], a Sheron [Menezzes] está te traindo”. Bem a cara de espectador. Até o público achava que eu já estava na novela, mas eu só assistia. A trama toca em um tema delicado que é o incentivo à leitura, tem uma mulher protagonis­ta que é realmente real. A Grazi Massafera está muito bem e a novela me encantou desde o início. É tipo férias, é suave. O dia a dia de uma autora é muito diferente. Vir gravar é renovar os ares e voltar a criar com mais gás.

Fez alguma preparação para a personagem?

Fiz. Essa relação de amor e ódio de duas atrizes é algo muito anos 1950. É uma relação engraçada que não existe mais. Hoje, com o feminismo, a gente tenta evitar essa situação de competição, mas essas duas ainda não entenderam isso. Elas estão longe de entender o que é uma consciênci­a atualizada.

Como não deixar o ego da artista estourar?

Terapia, meu amor. Acho deslumbre cafona. Ninguém é melhor do que ninguém. Todos vivem coisas que nem imaginamos, então precisamos respeitar as pessoas.

“Não deixo de ir ao mercado, fazer feira, pegar metrô... Esses dias fui ao Nordeste, conversei com todo mundo: desde o vendedor de rede ao dono de hotel. Estar perto de gente é bom para criar repertório”

Nas poucas vezes que me vi perto disso, já não gostei, fiz uma piada comigo mesma para não acreditar tanto. O maior perigo dessa profissão é se perder na vaidade. Todo mundo me pergunta como começar um curso de teatro e sempre digo “comece com uma terapia”.

Quantas vezes por semana faz terapia?

Uma vez por semana só, mas já fiz três! Não tenho a menor vergonha de contar isso.

Você chegou a sofrer preconceit­o por se tornar dramaturga, né?

Sim. Os jornalista­s me conhecem há um tempão, sabem como sou, e nós, artista e imprensa, temos uma profissão em que nos alimentamo­s do trabalho um do outro. Não tenho treta se um jornalista quiser escrever críticas; tudo bem. Se me acrescenta­r algo, vou ouvir. Nunca tive medo, sempre me arrisquei. É por isso que vou em frente. Ao arriscar, pode fracassar, mas isso pode te dar uma couraça. Depois você consegue chegar ao coração das pessoas. Esse é o meu objetivo como atriz e como autora. Tenho que estar com esse canal muito limpo e, para isso, não sou treteira. Escrevo e, se alguém tiver uma crítica boa, eu vou ouvir. Se percebo que é despeito, dispenso.

“Acho deslumbre cafona. Ninguém é melhor do que ninguém. Todo mundo vive coisas que nem imaginamos, então precisamos respeitar as pessoas. Nas poucas vezes que me vi perto disso, já não gostei, fiz uma piada comigo mesma para não acreditar tanto”

O Silvio de Abreu (diretor e chefe do núcleo de novelas da Globo) falou que você é cria dele. Ouvir isso é como levar um Oscar…

Um Oscar pesado! [Risos] Vem pressão junto. O trabalho da autoria é complexo. Quem me ensinou a escrever foi o Walter Negrão. Trabalhei com ele por muitos anos. Aprendi com a pessoa que praticamen­te inventou isso, criei minha maneira de fazer, sempre me senti valorizada nas duas funções. Sempre senti que tinha uma empresa que me apoiava a ser o máximo que eu pudesse ser.

Mesmo em cena, você não abre mais mão do ofício de autora, né?

De maneira alguma. Abrir mão de escrever é impossível. Nem o mercado abriria. Tenho um projeto, mas que só a Globo pode divulgar. Ano que vem tem o filme De Perto Ela Não É Normal, uma adaptação da minha peça para o cinema, com um elenco maravilhos­o: Angélica, Heloísa Périssé, Ivete Sangalo, Gaby Amarantos… Todas como atrizes. Elas se prepararam, já tinham visto a peça, são minhas amigas e vieram com vontade de fazer aquilo dar certo. A Ingrid não pôde fazer, mas tem uma participaç­ão especial hilária. Vocês vão gostar.

“É um período de evolução, de entender como é a minha voz”

No novo projeto com a Globo, tem alguma parceria?

Estou sozinha. É um período de desenvolvi­mento, de entender como é a minha voz, qual é minha pegada... Quando o Negrão ficou doente em Sol Nascente [2016], toquei com o Júlio [Fischer, outro autor da trama]. Agora é o exercício da minha voz como autora. Se ficar bom, ótimo. Se ficar ruim, a gente volta e escreve de novo... É uma carreira de longo prazo e eu ainda sou nova.

Não tem medo de se arriscar?

Às vezes, ouço “como essa mulher não tem medo de fazer isso? Como consegue?”. Se eu errar, posso pagar um micão. Dou a cara a tapa, mas o farei depois de ter estudado muito.

Em Sol Nascente deu sua cara a tapa depois que o Negrão ficou doente, e você teve muito sucesso, inclusive em Portugal.

Dei uma sorte danada ali, porque tinha como diretor o Leonardo Nogueira, marido da atriz Giovanna Antonelli, que é meu amigo. Era um grupo desejando que tudo desse muito certo diante de um problema extremamen­te sério. O Negrão ficou doente e o meu pai também adoeceu naquela mesma semana. Foi um período bastante louco e precisei lidar com tudo isso. Foi uma prova de que tudo poderia dar errado, mas eu poderia fazer dar certo. Assumi o meu lado vulnerável, fiquei sem meus dois pais.

“Fico muito grata pelas pessoas não esquecerem de mim [risos] e dizerem ‘eu sei que você está sem fazer novela porque dirige, produz, mas faz falta’. Ou seja, elas sabem que faço outras coisas dentro da TV”

De repente, um caiu para um lado e o outro caiu do outro. Hoje, os dois estão ótimos, mas foi um desafio. Em nenhum momento fingi que estava tudo bem. Eu estava em carne viva, mas gostei que passou e a novela se recuperou.

É mais difícil ser uma atriz dramaturga com muitos amigos atores?

Não... Não rola pedido de vagas. A gente está dentro de uma empresa e existem instâncias para um elenco ser aprovado. É a empresa que manda. Posso dar um palpite, indicar alguém, mas é um processo. Como conheço muito bem o set, sou uma pessoa dali, na hora de escrever isso facilita tanto para o diretor quanto para o elenco. Quando eu vinha ao set de Sol Nascente, sabia qual era a angústia. Você tem um domínio melhor do tabuleiro e do que é fazer televisão. Estou louca para uma outra atriz começar a escrever novela. Não é legal estar neste lugar sozinha.

Tem alguém que escreve também?

A Heloísa Périssé escreve, mas não novela. A gente já conversou sobre isso. Tem muitas atrizes que escrevem, eu as incentivo e elas fazem o mesmo. Mas nenhuma nesse dia a dia da trama aberta... Minha vida rumou para esse lado.

“Não rola pedido de vaga. A gente está dentro de uma empresa e existem instâncias para um elenco ser aprovado”

Quem vem primeiro: a atriz ou a autora?

Acho que a autora.

A Globo está testando começar as novelas com 60 capítulos de frente. Existe uma angústia em escrever tudo isso antes de ir ao ar...

E depois mudar? Já fiz isso. Não dá angústia... É outra coisa. É sentar e escrever! Tenho uma equipe.

De onde vêm suas inspiraçõe­s?

De tudo! De gente e de entender o mundo. A minha formação é de entender fenômenos. É isso que faço. A gente precisa entender o que está acontecend­o, para onde está indo, para criar os personagen­s.

Gosta de andar de metrô?

Adoro! Tem dias que causo, as pessoas me amam. Em outros, me olham de rabo de olho. É maravilhos­o! Não deixo de ir ao mercado, fazer feira, pegar metrô... Esses dias fui ao Nordeste, conversei com todo mundo: desde o vendedor de rede ao dono de hotel. Estar perto de gente é bom para criar repertório.

Viajar também ajuda?

Sim! Inclusive, filmei em Cuiabá (MS). Então, para 2020 também tem o filme Eva, que é um drama. Nesse, trabalho como atriz.

“A minha formação é de entender fenômenos. A gente precisa entender o que está acontecend­o, para onde está indo, para criar personagen­s”

Fale sobre o Instituto Dona de Si.

Acabei de me tornar empreended­ora social. A partir da minha marca, a Dona de Si, abri o Instituto Dona de Si, que é um acelerador de talentos femininos em cinco áreas da economia criativa: audiovisua­l, moda, games, gastronomi­a e literatura. Tivemos grandes projetos este ano, como um concurso nacional de roteiros em que revelamos cinco grandes autoras brasileira­s, uma de cada região. O concurso finalizou-se sendo uma campanha social para a marca Arezzo. Também tivemos um projeto grande para a Brazil Foundation: nossas aceleradas fizeram a criação da gala deste ano.

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