Correio da Bahia

Cortes a prazo

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O Banco Central divulgou a ata de sua última reunião do Copom e ficou claro para a maior parte dos analistas do mercado que os cortes das taxas de juros não serão imediatos. Ainda que haja algumas interpreta­ções conflitant­es sobre a data do início do ciclo de redução, já se sabe que não será na próxima reunião, em agosto. O ritmo de queda da Selic depende da capacidade do governo de aprovar o ajuste nas contas públicas. O BC argumentou que a expectativ­a de mercado para a inflação está acima do centro da meta em 2017 e há incertezas em relação ao ajuste fiscal. Na ata, o Copom reconhece que houve avanços no combate à inflação nos últimos meses, que as pressões dos preços administra­dos estão menores e que a inflação de serviços está cedendo. Mas pondera que, diante do tamanho da recessão que atinge o país, o processo de “desinflaçã­o” está abaixo do esperado: “Em relação à inflação, os membros do Comitê também concordara­m que houve progressos. Entretanto, a desinflaçã­o em curso tem procedido em velocidade aquém da almejada”, disse o Banco Central. Disse também que “uma maior persistênc­ia inflacioná­ria requer uma persistênc­ia maior da política monetária”. Esse trecho descartou o corte de juros na próxima reunião de agosto. Como já havia afirmado no comunicado após a reunião da semana passada, o cenário de referência do Banco Central, que mantém a Selic estável em 14,25% e o dólar em R$ 3,25, já demonstra a inflação no centro da meta de 4,5% no ano que vem. O problema é quando os técnicos do banco rodam o modelo com as premissas do Boletim Focus, estimando um corte de 3,25 pontos da Selic até o final de 2017 e o dólar em R$ 3,50, a inflação projetada sobe para 5,3%. Ou seja, ainda acima do centro. O Departamen­to de Estudos Econômicos do Bradesco acredita que o BC fará dois cortes na Selic de meio ponto, nas reuniões de outubro e novembro, para fechar o ano em 13,25%. O banco acredita que haverá um período mais favorável para os alimentos — que têm puxado o IPCA para cima nos últimos meses — e também que as expectativ­as de mercado vão continuar caindo nas próximas se- manas. De fato, o Boletim Focus divulgado na segunda-feira mostrou uma ligeira redução das expectativ­as, de 5,3% para 5,29%. Apesar de pequeno, foi a quarta semana seguida de redução nas projeções. O Itaú acredita em 0,25% de queda na reunião de outubro, e outro corte de meio ponto no encontro de novembro. O consultor econômico da Acrefi Nicolas Tingas também avalia que a Selic começará a cair em outubro, mas em doses menores, de 0,25%. Já a economista-chefe para América Latina da Coface, Patrícia Krause, apostava em queda nas taxas apenas em janeiro do ano que vem e depois da ata ficou mais pessimista, projetando corte no segundo trimestre. Um dos problemas, segundo Krause, é que o calendário político deste ano vai atrasar a aprovação de medidas do ajuste fiscal. Ainda haverá a votação do impeachmen­t, em agosto, e em outubro, eleições municipais. Na Ata, o BC voltou a dizer que a aprovação do ajuste é fundamenta­l para a queda da inflação. “Todos os membros do Comitê enfatizara­m que a continuida­de dos esforços para aprovação e implementa­ção dos ajustes na economia, notadament­e no que diz respeito a reformas fiscais, é fundamenta­l para facilitar e reduzir o custo do processo de desinflaçã­o. Não houve consenso sobre a velocidade desses ajustes, o que sugere que constituem, ao mesmo tempo, um risco e uma oportunida­de”, disse o Copom, temendo também que haja alta de impostos com impacto sobre os preços. O economista José Márcio Camargo acha que o BC endureceu na nota e que nas entrelinha­s quer dizer que enquanto não houver mais certeza de que a inflação chegará a 4,5% os juros não vão ser reduzidos. Diferenças de interpreta­ção e de projeção à parte, a maioria achou que a ata elevou o tom da preocupaçã­o com os riscos inflacioná­rios. Ela fez isso mesmo, mas em alguns outros pontos ressaltou que houve uma forte “desinflaçã­o” e que a capacidade ociosa na economia pode levar a uma queda mais forte da taxa de inflação. Diz, contudo, que o cenário depende do ritmo do ajuste fiscal. Se ele for mais lento, será mais reduzida a velocidade de declínio da inflação. É essa incerteza que terá que ser enfrentada nos próximos meses.

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miriamleit­ao@oglobo.com.br

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