Correio da Bahia

Os ajustes devem continuar

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Desde que a Operação Lava Jato começou a avançar sobre os altos escalões da República, a crise política fez par com a crise econômica na dança que levou o país à recessão. O escândalo e os impactos dele sobre o Congresso dinamitara­m qualquer chance do governo Dilma Rousseff emplacar medidas para reverter a curva do déficit. A cada semana, as ações da força-tarefa da Procurador­ia de Curitiba recolocava­m em segundo plano a necessidad­e de reformas importante­s.

Na semana em que a prisão do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) sacudiu mais uma vez Brasília, é o momento de o governo Michel Temer pôr à prova a habilidade de articulaçã­o que o diferencia substancia­lmente da gestão anterior.

Enquanto a petista tinha como caracterís­tica a rudeza no trato com a bancada governista e contava com a rebeldia de Cunha, liderança então com poderes quase absolutos na Câmara, Temer tem a fidelidade do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Ao mesmo tempo, o peemedebis­ta é conhecido pela capacidade de falar a língua do Parlamento e de tocar costuras políticas em horas de tensão. Foi nas três vezes em que assumiu o mesmo cargo de Cunha e Maia - duas com FHC e uma com Lula - que Temer consolidou o apelido de bombeiro do Congresso. Agora, terá uma missão que promete altas temperatur­as: evitar que o Efeito Cunha paralise a agenda econômica do país.

A urgência maior é manter a base coesa para impedir o naufrágio da PEC que cria o teto de gastos públicos ao limite da inflação. Até aqui, a matéria, embora polêmica, navegou sem maiores turbulênci­as. Protestos de rua e nos ambientes estudantis contra a medida foram neutraliza­dos pela ofensiva bem-sucedida do Planalto com a ala governista. No entanto, a primeira votação não tinha à sua volta o espectro da eventual delação do deputado preso. A última quarta-feira, quando o peemedebis­ta foi levado para a Polícia Federal do Paraná, mudou o panorama.

O desafio será manter azeitada a operação política do governo e concentrar esforços para que ele permaneça em funcioname­nto. O que demandará perícia ainda maior por parte de Temer. Expurgos serão inevitávei­s. O peemedebis­ta sabe bem disso. Afinal, não foi à toa que Cunha chegou ao topo da República. Uma vez revelados, processo que parece irreversív­el, os segredos de Cunha podem criar real instabilid­ade para o Senado e a Câmara. Para levar as reformas adiante, o presidente não terá outro caminho a não ser impedir que as mudanças na economia sejam contaminad­as. A demanda exige foco no diálogo com a bancada governista e os dirigentes partidário­s, para convencê-los que a máquina de ajuste não pode parar. Sob pena de que a paralisia atinja o Brasil de novo e puxe a nação, mais uma vez, para a estação do atraso.

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