Arte e destino
Os artistas visuais hoje passam por imensas dificuldades para mostrar suas produções ao público. O artista trabalha na solidão do seu atelier, para apresentar à comunidade seu fazer. Basicamente para tornar seu trabalho conhecido, uma espécie de prestação de contas e a possibilidade de construir um mercado e viver com dignidade de suas produções. Nada mais saudável do que fazer e ser consumido, garantindo a sobrevivência. A grande maioria dos artistas brasileiros vive ajudada por fontes alternativas de renda: dão aulas, trabalham em agências de propaganda, são profissionais liberais como arquitetos, médicos, advogados, jornalistas, psicólogos entre outros.
Assim, reunindo a profissão de artista e agregando outras, o resultado dá para viver. Na realidade, hoje a profissão de artista visual não é reconhecida por lei. Nunca se viu no Brasil um artista tornar-se rico, trabalhando só com arte. Alguns bem-sucedidos no mercado têm vida confortável, viajam, são compradores contumazes de livros de arte, livros de interesse próprio, usam material de qualidade no seu fazer, pagam seguro de saúde, INSS como autônomo e se dão a certos luxos como frequentar bons restaurantes, beber um bom vinho, ter um carro de boa marca, casa própria, filhos (se os tiver) estudando em colégios de qualidade, vestir-se com certo cuidado. Depois de mortos, deixando uma boa quantidade de obras, podem dar a seus herdeiros possibilidades financeiras, se a briga pelo espólio não ficar embargada por décadas, para decisão judicial.
As artes plásticas têm, dentro das outras artes, o menor espaço em jornais e revistas, ficando a música, o cinema, a televisão, o futebol, por exemplo, com uma fatia muito maior. Apenas três jornais no Brasil mantém espaço semanal para a crítica de arte. Nas revistas desapareceram. Fica difícil para o artista começante a possibilidade de ter seu trabalho analisado por um especialista da área. Patrocinadores desapareceram. O colecionador fiel que investia no mercado de arte, acompanhando exposições e carreiras, minguou. O grande público frequentador dos vernissages diminuiu consideravelmente. Fatores como poder aquisitivo em decadência e até coisas como a segurança, a violência das ruas, acomodam as pessoas. Alguns só vão a inaugurações de exposições em lugares abertos, seguros e com manobristas.
Ao jovem artista, se estudante de instituições encontra as escolas de arte sem verbas para funcionar a contento, manter bons professores, material para ensino e matérias mais especializadas, como estimulá-lo?
Os artistas emergentes, mesmo com grande talento, sofrem com o preconceito de não ter uma carreira consolidada, mas como ter carreira, se estão começando? Como pagar por uma curadoria que ajuda muito, especialmente aos emergentes, como pagar textos críticos e todo um aparato para expor, como convites, catálogos, montadores, iluminadores? Mas não se deve desistir, busca-se fazer o que se pode na simplicidade de meios. O que vale é o talento do artista, que é inato, mas pode se aprimorar com informações. No curso do tempo é que se faz uma carreira bem-sucedida e mais no curso do tempo um artista talentoso pode não acontecer. Nisso podem estar envolvidos muitos fatores, desde o lugar onde nasceu e não emigraram para os grandes centros, até estar adiante no tempo. Tudo pode caber nesses fatores. Será que Aldemir Martins, nascido em Ingazeiras, no Vale do Cariri, no Ceará, se não tivesse mudado para o “sul maravilha” teria a mesma notoriedade? Carlos Scliar, nascido em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, teria chances lá? Antonio Maia (foto), nascido em Carmópolis–Sergipe, conseguiria ser um dos artistas mais premiados e festejados do Brasil? Antonio Bandeira (Fortaleza–CE), Rosângela Rennó (Belo Horizonte-MG) e muitos mais. Hoje as coisas mudaram um pouco, mas a hegemonia Rio–São Paulo continua. Como pode um novo artista olhar o futuro sem atormentamento?