A ilusão do Uber
Iludido com a promessa de dinheiro fácil e rápido, você decide virar motorista parceiro da Uber. Investe algumas dezenas de milhares de reais (talvez mais de uma centena!) em um carro novo, na mudança da documentação (é preciso ter CNH com a inscrição “exerce atividade remunerada”) e em água e guloseimas para surpreender o cliente. É aprovado, segue com ótima avaliação até que, num belo dia, o aplicativo não entra. Tudo o que se vê é o aviso: “A conta de parceria com que dirigia foi desativada”.
O motorista parceiro da Uber é o elo mais fraco de uma cadeia um tanto perversa. Afeito a cumprimentos efusivos – “Olá, como vai? Espero que esteja tudo ótimo!”, por exemplo –, o suporte por e-mail da empresa parece seguir os mais toscos manuais de motivação. Esse mesmo suporte aparentemente é treinado para ceifar sem a mínima satisfação qualquer profissional do volante que não se encaixe em alguma de suas regras, por menos que isso tenha sido feito com dolo e por mais bem avaliado que seja esse “parceiro”.
Investi mais de R$ 300 na documentação, incluindo R$ 90 em um exame psicotécnico, mais quase R$ 50 mil em um automóvel novo. Comprei um carro pequeno – Volkswagen up! com motor TSI de até 105 cv (com etanol). Investi ainda R$ 50 no seguro para passageiros, que hoje nem é mais obrigatório. Mas todo esse investimento, como veremos, é aviltado pela empresa – e pode ir pelo ralo de uma hora para a outra, sem a mínima satisfação.
Um certo dia o aplicativo simplesmente não entrou. O suporte não respondia o porquê. Colegas de grupos no WhatsApp (extraoficiais) aconselharam a me dirigir pessoalmente ao escritório da empresa, em São Paulo. Foi o que fiz. Peguei fila, tirei senha, fui atendido e pronto! O aplicativo voltou a funcionar. Questionei o porquê do bloqueio, o atendente desconversou. Fui embora sem uma resposta convincente, mas pelo menos com o aplicativo ativo.
Dias depois, sem que eu nem tivesse dirigido, travou de novo. Voltei a escrever. O suporte demorou a responder e o que disse foi: “Olá Luís. Parece que a sua conta foi suspensa porque houve uma violação dos Termos de Uso do aplicativo da Uber. Por isso, a sua conta estará indisponível até determinado contrário. Nós entraremos em contato caso a gente decida suspender esta medida. Estou à disposição caso tenha alguma dúvida. Equipe Uber”.
Ou seja, se você pretende investir algumas dezenas (ou até mais de uma centena) de milhares de reais para virar motorista parceiro da Uber, saiba que a empresa pode dispensá-lo sem dar a mínima satisfação na hora em que bem entender. Até ser punido, como motorista parceiro fiz 283 viagens. Fui extremamente bem avaliado – estava com avaliação em 4,86 (com picos de 4,89; a média dos principais parceiros, segundo o próprio aplicativo indicava, era de 4,84, ou seja, eu estava acima).
Portanto, antes de virar parceiro da Uber, tenha em mente que não vale a pena investir alto. Não é improvável que você morra com o prejuízo na mão, sem que tenha nenhuma satisfação. Opção de renda extra!? No meu caso, opção de puro prejuízo. Pena. Melhor usar um carro velho que esteja na garagem – relaxe, a Uber nem sequer checa se o seu veículo é seguro ou está ou não caindo aos pedaços...
Além de fazer contato com a assessoria de imprensa da Uber (a agência Imagem Corporativa), que mesmo após sucessivos contatos telefônico não respondeu a minha solicitação, fui novamente até o escritório da Uber. Esperei cerca de 20 minutos para ser atendido – que se dá com o atendente em pé, olhando para uma tela de computador a que o motorista parceiro não tem acesso. “Então, é que da outra vez já era isso. Não deveriam ter te reativado. Colocaram trancas em seu cadastro”, afirma. Fui bloqueado não só como parceiro, mas também como usuário.
Não foi só comigo. Vi vários parceiros reclamando por terem sido banidos sem razão aparente e sem satisfação. De fato, “parceiros” mais atentos já notaram que a Uber não deve ser levada a sério e que a palavra respeito passa longe das diretrizes da empresa.