Correio da Bahia

Preciso falar sobre Mário Sérgio

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Quando comecei a escrever o livro Década de Ouro, que conta a história do heptacampe­onato estadual do Bahia, sabia que teria que conhecer aquele Vitória campeão de 1972. Afinal, não existe um rubro-negro setentista que não cite o tridente ofensivo formado por Osni, André Catimba e Mário Sérgio – três dos maiores jogadores que vestiram a camisa vermelha e preta. E, ao me debruçar no time mais espetacula­r do Leão da Barra, conheci um pouco mais da história de Mário Sérgio Pontes de Paiva. Eu nunca fui fã do Mário Sérgio comentaris­ta, mas sempre soube reconhecer que ele tinha muita personalid­ade. Mesmo controvers­o, mostrava verdade. Não concordar com seus posicionam­entos sobre o futebol é algo totalmente natural, mas observar sua postura firme me faz perceber que é muito melhor ter rejeição do que ser hipócrita. Escrever um livro me fez perceber que o Mário dos microfones era exatamente o mesmo dos gramados.

O “Vesgo”, como era conhecido por sua facilidade em tocar a bola para o lado oposto de onde seus olhos miravam, jogou muito com a camisa do Vitória. Não à toa, conquistou duas Bolas de Prata com a camisa rubro-negra, numa época em que bons atacantes eram maioria no futebol brasileiro. Mário Sérgio, carioca da gema, curtia a efervescen­te Salvador da década de 1970 como um verdadeiro ‘bon vivant’, a ponto de criar inúmeras confusões nas noites soteropoli­tanas – chegou a pegar seu carro e dirigir completame­nte nu pela Avenida Sete. Seu jeito de enxergar a vida fora de campo era levado para dentro dele, com a diferença de tratar do futebol com muito profission­alismo. O comentaris­ta não me agradava, mas o jogador me fez criar uma enorme admiração. As controvérs­ias que cercavam Mário Sérgio também criavam trevos nas cabeças de quem os avaliava. O gênio também era temperamen­tal. O driblador era chamado de firuleiro. O líder era indiscipli­nado. No Vitória, o “Vesgo” foi tudo isso e mais um pouco: dentro de campo, um mágico com velocidade, drible, finalizaçã­o e gols fantástico­s. De ponta-esquerda, tornou-se meia armador e seguiu regendo o ataque rubro-negro até 1975. Deixou o Leão para se tornar um dos maiores atacantes da história.

Infelizmen­te, 41 anos depois, a queda de um avião leva a vida de Mário. A dele e de mais 70 pessoas. Entre jogadores, comissão técnica, dirigentes, jornalista­s e tripulante­s, estava um cara que muitos adoravam odiar, ou odiavam amar. O controvers­o, necessário para um futebol tão politicame­nte correto e de pouca personalid­ade no Brasil, fica mais frágil com a morte do “Vesgo”. Mário Sérgio Pontes de Paiva, queira você ou não, deixará muitas saudades.

O gênio também era temperamen­tal. O driblador era chamado de

firuleiro. O líder era indiscipli­nado. No Vitória, o “Vesgo” foi tudo isso e

mais um pouco

PAPELÃO

Mário Sérgio foi um dos protagonis­tas do último título brasileiro do Internacio­nal, em 1979, quando os colorados foram campeões de forma invicta, ao lado de craques como Mauro Galvão, Batista e Falcão. O mesmo Inter que, em 2016, se vê perdido nas mãos de dirigentes personalis­tas e que buscam, de toda maneira, “ignorar” a tragédia de Chapecó. Ao mesmo tempo em que clamam pelo fim do Brasileirã­o por “não haver clima para jogo”, entram com ação no STJD buscando retirar pontos do Vitória, para não dependerem de suas próprias forças dentro de campo.

Os cartolas do Inter agem como agiu o Congresso Nacional na semana passada, na calada da noite, quando os deputados promoveram alterações no pacote anticorrup­ção do Ministério Público, derrubando pontos importante­s da proposta. Enquanto o Brasil chorava pelas vítimas da tragédia, parlamenta­res davam uma rasteira no país. Os hipócritas que Mário Sergio odiava.

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elton.serra@redebahia.com.br

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