Correio da Bahia

POESIA COTIDIANA

- Marilia.silva@redebahia.com.br

“A vida cotidiana é um grande exercício de distração da morte, sem o qual você não consegue viver”. A frase da jornalista baiana Kátia Borges, 49 anos, pode até assustar e parecer trágica para alguns, mas, com certeza, irá ressoar naqueles que já tiveram algumas perdas.

Como todo ser humano, Kátia teve várias. A mais dolorosa delas foi a da mãe, que morreu em maio de 2015. “Foi o ápice de um processo de desestrutu­ração de tudo que havia ou me parecia sólido. Nós éramos muito ligadas, vivemos juntas uma vida inteira e para mim foi muito difícil aprender a ser sozinha a partir dali”, lembra.

O exercício de escrever poesia, presente na vida de Kátia há tanto tempo que nem ela consegue precisar desde quando, se mostrou um caminho possível de elaboração no sentido psicanálit­ico, diz do que estava vivendo.

O resultado é o livro O Exercício da Distração, que ela lança na próxima quarta-feira, 29, às 19h30, no Espaço Cultural Tropos, no Rio Vermelho. Como descreve o poeta João Filho, na orelha da publicação, os poemas de Kátia se configuram como “pequenas janelas onde o leitor respira o ar da hora, algumas vezes podem não trazer alívio ou vontade de evasão, mas sempre o deixarão atento”.

Se, por um lado, a vida exige atenção a toda hora, por outro, o exercício de distração se faz presente para nos afastarmos da finitude. Para Kátia, a grande questão se resume a como você se equilibra entre uma coisa e outra.

Tanto assim que a imagem escolhida para capa é uma foto em que três acrobatas se equilibram no topo do Empire State Building, em Nova York. “Eu sugeri essa imagem porque, quando a vi, me pareceu a imagem ideal. O que é o exercicio de destrair-se premeditad­amente? A vida sempre vai te dar baques. Você vai estar perdendo coisas, amigos, parentes. E isso pode ser metaforiza­do pelo malabarism­o, como também pelos equilibris­tas. Casamos, criamos poesia, vemos e produzimos coisas belas , mas a grande realidade é que vamos morrer”, afirma.

TEMAS

Autora de outros cinco livros de poesia, Kátia recorre em O Exercício da Distração a uma separação por partes. São três no total: Como Se Fosse Órgão Vivo, Fugas Extraordin­árias e as Pequenas Vilanias da Cidade.

É na primeira que o sentimento de saudade transborda. No poema O Primeiro Movimento, Kátia alerta: mesmo que digam que sempre há um jeito de usar a saudade, seja para escrever um romance ou viajar ao redor do mundo em busca de uma flor selvagem, tome cuidado. “Sobre a saudade, há sempre/ algo muito frágil”, previne.

Chama atenção, ainda, o fato de alguns dos poemas virem com riscos em cima de algumas palavras do título, como se, durante a escritura, ela cortasse aquilo que não era exatamente o que queria escrever. “Tem a ver com essa coisa do exercício, da tentativa de escrever. Quero falar sobre árvores, não, quero falar sobre amor. É a tensão entre aquilo que você quer falar e aquilo que verdadeira­mente se impõe”, explica.

Desse modo, Kátia também refaz o exercício imposto ao jornalista e passeia de forma poética pela cidade de Salvador, percebendo suas belezas e melancolia­s em cenários como a Mouraria, a Praça da Piedade e a Av. Contorno.

LivroO Exercício da Distração

Autora Kátia Borges

Editora Penalux

Preço R$ 35 (102 páginas)

Lançamento Dia 29/3, às 19h30, no Espaço Cultural Tropos, Rio Vermelho

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