Unanimidade sob suspeita
Nelson Rodrigues ensinou a suspeitar de toda unanimidade. É inegável a qualidade do trabalho de Tite na Seleção. Ele só não é inquestionável. Ou, pelo menos, não deveria ser. Com a vaga na Copa do Mundo praticamente garantida, já é hora de pensar no time que vai entrar em campo na Rússia. Mas Tite parece mais preocupado com os resultados do presente que com o desempenho no futuro.
Já é hora, por exemplo, de dar chance a outro goleiro. Alisson tem curta experiência internacional, é questionável tecnicamente e come banco atualmente na Roma. Como estará daqui a um ano? Diego Alves, do Valencia, e Ederson, do Benfica, pedem passagem. Nas duas últimas Copas, Daniel Alves não foi bem como lateral. Em 2010, na África, atuou no meio de campo. Em 2014, na posição de origem, acabou na reserva de Maicon. Daniel sempre teve a atuação defensiva com a amarelinha questionada. Na Europa, tanto no Barça quanto na Juve, sempre jogou com a retaguarda reforçada e liberdade total no apoio, seu ponto forte. Na Seleção, onde precisa defender mais, nunca teve a mesma regularidade que nos clubes. Como estará o fôlego de Daniel em 2018, pra correr de uma linha de fundo a outra, com 36 anos?
Na zaga, Miranda e Tiago Silva terão 35 anos quando o Brasil desembarcar na terra de Putin. David Luiz, 32. É preciso dar minutos a gente mais nova.
No meio, entre os titulares, temos dois jogadores que atuam no futebol da China – Paulinho e Renato Augusto. É preciso pensar em opções para ambos, urgentemente. Não dá pra confiar no médio prazo em quem atua futebol de nível técnico tão baixo.
Diante da absoluta falta de um bom armador – aquele que atua de uma intermediária a outra, desarmando e construindo -, mestre Tostão já cansou de sugerir uma inovação. A escalação do lateral-esquerdo Marcelo, do Real Madrid, improvisado no meio, pela habilidade e qualidade no passe. O deslocamento não seria um problema na função de origem, já que Filipe Luís também está entre os melhores laterais-esquerdos do mundo. Dunga e Felipão não ouviram o tricampeão de 1970. Tite também não, ao menos por enquanto.
Do meio pra frente é onde o time tem menos problemas. Gabriel Jesus, Neymar, Douglas Costa, Willian e Philippe Coutinho são novos e vivem grande fase. Falta um centroavante pra reserva de Jesus. Neymar pode atuar mais centralizado quando houver necessidade e abrir espaço pra um dos meias-atacantes entrar na equipe. Em vez de testar essa opção, para o jogo da próxima quinta, contra o Uruguai, Tite deve escalar Firmino na vaga de Jesus, machucado, e trouxe Diego Souza pra reserva. Ou seja, o trivial.
Aliás, Diego Souza foi convocado pra que mesmo? Ainda é muito útil para o futebol de clubes que se joga aqui, sem dúvida, mas acrescentará o que, em fim de carreira, na Rússia, diante dos melhores jogadores do mundo?
Até entenderia a presença dele se o clássico fosse um jogo de vida ou morte pro Brasil. Afinal, não haveria com o que se preocupar no futuro sem a vaga na Copa assegurava. Mas a Seleção está com os pés lá. Tite já deveria pensar na frente, fortalecer o estilo de jogar da equipe, testar opções técnicas e alternativas táticas. Outras convocações seguem uma incógnita. Por que Fagner é convocado e Fabinho, do Monaco, não é, mesmo sendo um dos destaques do time que lidera o Campeonato Francês à frente do milionário PSG e eliminou o Manchester City de Guardiola da Champions? E o meia Diego (34 anos na Copa) e o mediano goleiro Muralha? O que justifica chamá-los a não ser fazer média com as maiores torcidas do país?
Tite é o melhor treinador do Brasil. Está a léguas de distância dos demais. Merece o cargo e justifica-o a cada jogo. Não só pelos resultados, mas pela forma de jogar do time, que mudou muito, pra melhor. Isso não o faz um ser acima do bem e do mal. Reconhecimento é uma coisa. Bajulação é outra. “Jornalismo é oposição. O resto é armazém de secos e molhados”, Millôr Fernandes.
Já é hora de pensar no time que vai entrar em campo na Rússia. Mas
Tite parece mais preocupado com os resultados do presente