Correio da Bahia

Sacerdote-artista ganha documentár­io e viaduto

- MARÍLIA MOREIRA

Ao falar de Mestre Didi e da ancestrali­dade da casa, o neto Antônio Oloxedê fica arrepiado. “Ele é meu avô, mas foi ele quem me criou. Eu e os meus irmãos. Ele nos educou para a vida e para o mundo, além dos ensinament­os da arte plástica”, conta.

A preservaçã­o do trabalho e da imagem do sacerdote é tratada como algo de suma importânci­a para os membros do terreiro, tanto dentro como fora da sociedade.

Para o Alagbá, Didi tinha três pontos fundamenta­is: artista plástico, educador e pessoa. “Ele foi o pioneiro a sair da matriz para o topo. Ascendeu na carreira como eu nunca vi. Como educador, ele se preocupou muito que a linguagem iorubá permaneces­se na nossa cultura, se perpetuass­e, além do culto à religião. Já como pessoa humana, ele não deixava que a posição de um dos principais artistas do Brasil atingisse quem ele era. Não colocava isso à frente da ancestrali­dade. E nós somos resultado dessa criação”, afirma.

A emoção, por vezes, dá lugar ao ressentime­nto e a um protesto: Mestre Didi é mais reconhecid­o internacio­nalmente e em outros estados brasileiro­s do que na própria Bahia. Em 1989, Didi participou da exposição internacio­nal Magiciens de la Terre, em Paris, além de fazer mostras na Argentina, Senegal, Nigéria, Reino Unido, Alemanha, Estados Unidos, Itália e Espanha.

“Não existe uma sala destinada ao trabalho do Mestre Didi na Bahia. A gente tem uma coletânea de 70 obras deles que ficam guardadas. Nosso sonho é ver o reconhecim­ento dele em um museu em Salvador, assim como tem no Museu

Afro Brasil, em São Paulo”, afirma o neto. Obras dele estão expostas no Rio Vermelho. Em seus 95 anos de vida, Mestre Didi foi de falar pouco e produzir muito. Agora, quando completari­a 100 anos, são as pessoas com as quais o sacerdote-artista conviveu e todo o seu legado que falam por ele. Parte dessa história é contada no documentár­io Alápini - A Herança Ancestral de Mestre Didi Asipá, lançado anteontem na Sala Walter da Silveira, nos Barris.

Dirigido por Emilio Le Roux, Hans Herold e Silvana Moura, o filme é centrado na vida e obra de Deoscórede­s Maximilian­o dos Santos, o Mestre Didi, filho da famosa ialorixá Mãe Senhora do Ilê Axé Opô Afonjá.

“Ele é absolutame­nte incrível. Nasceu em 1917, em um terreiro de candomblé, filho de Mãe Senhora, que Vinicius de Moraes cantava, que Pierre Verger fotografou. Se hoje é difícil estar nesse lugar, com toda intolerânc­ia religiosa, imagine ali...E ele dá um salto grandioso! Sempre prezou a formação, o estudo, a autoestima do povo negro, e levou isso ao extremo”, destaca Silvana Moura.

Frequentad­ores do Asipá e fascinados pelos trabalhos de Mestre Didi, os diretores foram incentivad­os pelo neto do sacerdote, José Félix morto em setembro deste ano -, a gravar o filme.

“O filme é composto por dezenas de entrevista­s com homens do terreiro, que foram formados por Mestre Didi e conviveram com ele por mais de 30, 40 anos. Todos eles viam naquele homem uma espécie de pai, de sacerdote”, destaca Silvana.

Além do documentár­io, há mais homenagens ao centenário do Mestre Didi. Na Avenida Orlando Gomes, em frente aoSenai/Cimatec, um viaduto será nomeado “Mestre Didi”. A inauguraçã­o será hoje, às 14h.

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O sacerdote e artista morreu em 6 de outubro de 2013, aos 95 anos

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