Correio da Bahia

Incompreen­sível escuridão

-

Às 15h50 da última quarta-feira, a população de 13 estados do Norte e Nordeste enfrentava a escuridão e o caos provocados por um velho inimigo do desenvolvi­mento no país. Presentes há quase três décadas como um incômodo e contumaz visitante na casa dos brasileiro­s, os apagões volta e meia levam breu total para a rotina dos cidadãos e acarretam prejuízos para a economia difíceis de calcular em um primeiro momento, mas segurament­e na casa das centenas de milhões de reais.

Embora o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) tenha se apressado em garantir que o incidente nada tem a ver com fragilidad­es estruturai­s, o episódio revela, no mínimo, aquilo que autoridade­s em políticas energética­s alertam seguidamen­te, desde o início dos anos 1990, quando os grandes blecautes entraram para a cronologia negativa na história recente do Brasil: não existe investimen­to de fato na criação de alternativ­as capazes de dar auxílio quando um apagão ocorre.

As explicaçõe­s do ONS para o que o órgão classifico­u como “distúrbio” reforçam ainda mais a percepção que inexiste planos B ou C para situações de grave instabilid­ade na rede elétrica nacional. Não devia ser visto com algo circunstan­cial assistir parte do Brasil ficar paralisada por uma falha de disjuntor no sistema de transmissã­o que integra a Usina de Belo Monte.

Afinal, que tipo de investidor não pensaria duas vezes antes de aplicar o capital em um projeto dependente de energia, se um defeito aparenteme­nte pequeno pode lançar um pedaço substancia­l do país temporaria­mente nas trevas? Como a história dos apagões pode comprovar, demora muito tempo para que o setor produtivo se recupere dos danos causados por uma meia dúzia de horas no escuro.

Basta voltar para um tempo não muito distante para ver a extensão do prejuízo. A chamada “Crise do Apagão” de 2001, que contribuiu para a perda de popularida­de do então presidente Fernando Henrique Cardoso, causou um prejuízo de inacreditá­veis R$ 45,2 bilhões ao país nos sete meses em que durou, segundo apontou um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) apresentad­o em julho de 2009.

Ao olhar apenas para um dos setores da economia - o secundário, por extensão, a indústria -, um apagão como o que ocorreu na quarta-feira acarreta problemas em efeito cascata. Uma vez paradas por falta de energia, as máquinas usadas em linhas de produção terão que operar à base de geradores enquanto o problema perdurar.

Com os custos atuais dos combustíve­is, matéria-prima para alimentar tais equipament­os emergencia­is de geração de energia, imagine-se o tamanho da conta. Sem falar dos gastos para reativar o maquinário industrial e as horas de produção paradas, além do efeito dominó para toda a cadeia do setor.

Nos outros dois pilares da economia brasileira, a agricultur­a (primário) e o serviços (terciário), os grandes blecautes costumam também causar arranhões profundos em ampla escala. Se forem contados apenas os mais conhecidos apagões nas últimas duas décadas, 12 deles podem ser considerad­os de alto impacto.

Entre os quais, a queda de sete torres de Itaipu em abril de 1998, quando estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste ficaram sem luz durante quase um dia. Ainda está bastante fresco na memória dos baianos o blecaute que apagou oito estados do Nordeste entre a noite do dia 3 e a madrugada de 4 de fevereiro de 2011, em pleno Festival de Verão de Salvador.

Nunca é demais lembrar também que apagões suspendem atendiment­os médicos, projetos pessoais, entrevista­s de emprego, viagens, encontros e a volta para casa depois de um dia de trabalho pesado. Garantir a luz para essas pessoas e setores econômicos é obrigação em um país que quer se tornar maior do que é.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil