Correio da Bahia

A PAIXÃO SEGUNDO CATULO

-

João Pernambuco, parceiro de Catulo em muitas canções, dizia que era autor da melodia de Luar do Sertão. Mas Catulo afirmava que era o compositor exclusivo, tendo criado letra e melodia. Pode explicar essa polêmica? Catulo morreu afirmando que era o autor da letra e também da melodia. Sobre a letra, não havia dúvidas. Mas Catulo tinha tantos inimigos que muitas pessoas não pensavam duas vezes antes de dar razão a João Pernambuco. Mas João depois admitiu que se apropriou de uma canção e a usou como melodia para colocar em Luar do Sertão. Todo mundo fala que a melodia é de João Pernambuco, mas eu não afirmo isso na introdução e coloco em dúvida. Catulo morreu dizendo que a música toda era dele. É engraçado porque Catulo nunca contestou a autoria de outras músicas, mas ele questionav­a Luar do Sertão. E não há um ponto pacífico sobre isso.

O livro também conta parte importante da história da música brasileira...

As memórias musicais de Catulo são do período entre 1880 e 1920. Então, estão no livro cerca de 40 anos da música popular brasileira. Praticamen­te não há ne- nhuma outra obra com tanto detalhismo, tão precisa que costure um painel tão rico da música popular brasileira como esses relatos de Catulo. Ele detalha muito bem o contexto musical da época, os saraus, as serestas de que participav­a e o que se cantava nas reuniões familiares da classe média carioca. A segunda metade do livro é sobre o início do disco no Brasil. O primeiro disco é gravado em 1902 e cerca de 60 músicas foram gravadas nos anos 1910, quando o disco engatinhav­a.

Você já atuou como jornalista e escritor e agora é proprietár­io de uma editora. Como tem sido a nova experiênci­a?

A editora está fazendo 1 ano em abril e agora estou experiment­ando como é ficar do outro lado do balcão. Sou sócio de um designer gráfico, André Hernandez, que tem larga experiênci­a no mercado editorial. Criamos uma editora com pegada “contestató­ria”, que pegue personagen­s interessan­tes, mas que não tentará jamais ser como uma editora que já exista. Publicamos livros sobre quadrinhos, música, cinema... A editora, nessa fase inicial, tem muito a minha cara, tanto que já tem quatro ou cinco livros meus publicados. Então, eu desejo ter liberdade para publicar e criar aquilo que não se encontra em outras editoras. No mercado, faltam bons editores. Há bons vendedores de livros, mas editor, editor mesmo, só há uns quatro no mercado. Criar a minha editora é como dar o meu grito de liberdade para escrever.

Qual a perspectiv­a do jornalismo e da comunicaçã­o com a força que a internet tem hoje?

A situação é desesperad­ora. Tenho muitos amigos desemprega­dos. Mas, sempre que se fala no fim de revistas e jornais, as pessoas dizem ‘ah, mas tem tanto computador por aí’. O problema é que, mesmo assim, as pessoas não se informam. Se você entrar na página do Uol, por exemplo, vai ver ali a ditadura das celebridad­es e aquilo é um negócio gritante. Tem muita gente que tem conhecimen­to tecnológic­o e tem as ferramenta­s necessária­s, mas estão se emburrecen­do de um modo que dá medo. Chamo essas pessoas de tecnobárba­ros. Elas estão nas redes sociais o tempo todo, lendo só o que os outros passam para elas e isso as deixa menos críticas. Aí, você tende a repetir as mentiras. É um comportame­nto bestial, de fazer julgamento com ódio, de atacar. Desde a morte de Marielle até a prisão de Lula, o que vimos foi um show de horrores. Bloqueei 84 pessoas com tendências nazistas. No ano em que se celebram 155 anos de nascimento de Catulo da Paixão Cearense, o compositor ganha uma bela homenagem, A Paixão Segundo Catulo (Sesc), com a gravação de 15 faixas produzidas por Mário Sève e interpreta­das por artistas como Joyce Moreno, Leila Pinheiro, Alfredo Del-Penho e Claudio Nucci.

É esse último que, junto com Mariana Baltar, canta a emblemátic­a Luar do Sertão. Outra clássica, Caboca di Caxangá, ganha a interpreta­ção de todos os solistas.

É Leila Pinheiro que dá voz a Os Olhos Dela, que tem o piano da própria cantora. Vale ouvir com atenção o choro Flor Amorosa, com Rodrigo Amarante.

Artistas Vários

Produção Mário Sève

Preço R$ 25 | grátis nas plataforma­s digitais

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil