Correio da Bahia

Gigante: o falsificad­or da máfia siciliana

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Até chegar à Europa, a droga atestada por Lelio percorria diversos caminhos - e passava pelo estômago de muitas pessoas, as “mulas”. Elas engoliam cápsulas com cocaína e viajavam de Salvador para Portugal, entrada na Europa.

O início da trajetória se dava na Bolívia e no Peru. Depois, a droga chegava ao Brasil e seguia para os estados. Na Bahia, a cocaína era enviada para depósitos mediados por facções. Intermediá­rios faziam a ligação dos depósitos com Gigante, para o “teste de qualidade”. Então, a droga era embalada em cápsulas e engolida.

A Polícia Federal não tem estimativa da quantidade de droga que foi enviada para o exterior ou a quantidade de dinheiro que foi movimentad­o pela organizaçã­o. O único dado divulgado foi que Gigante tem um patrimônio de R$ 5 milhões, que eram “lavados” através da compra de terrenos e imóveis comerciais e residencia­is. Em Salvador, as propriedad­es estavam no Centro. Somente um terreno à venda no Rio de Janeiro totalizava R$ 2 milhões.

Um laudo emitido pela PF atesta que, com a quantidade de imóveis que Gigante possui, ele não teria a capacidade de acumular tal quantia de bens. “A suspeita é que todo o montante encontrado seja provenient­e do tráfico. Apesar do dinheiro, ele vivia uma vida simples. Ele morava com uma filha brasileira e tinha outros dois filhos que residem na Europa. Os três não têm envolvimen­to com o tráfico”, afirmou Daniel Madruga. A quantia deve ser confiscada. O paulista Lelio Paolo Gigante, 84 anos, tinha vida simples em Salvador e fingia viver dos aluguéis de imóveis que tem na Ladeira dos Aflitos, onde foi preso, ontem, pela Polícia Federal.

Mas, há anos, era um criminoso internacio­nal. A vida no crime do homem, que foi levado ainda criança para a Itália pelos pais, começou quando era comissário de bordo da Avianca na Colômbia, de onde voava para Estados Unidos e Europa.

Segundo relata o livro de Leandro Demori, Cosa Nostra no Brasil – A História do Mafioso que Derrubou um Império - sobre Tommaso Buscetta - Lelio traficava relógios falsificad­os para completar o salário de comissário. Até que um dia viu no tráfico de heroína um negócio mais lucrativo.

Numa de suas aventuras, acabou detido para averiguaçã­o em um posto aduaneiro na fronteira dos Estados Unidos com o Canadá. O medo de ser deportado o fez fugir do prédio e caminhar por até 50 quilômetro­s na neve e parar em Montreal.

Depois de pedir ajuda a um grupo que apoiava imigrantes ilegais, foi jogado nos fundos de um carro por dois desconheci­dos e acomodado numa casa, onde dormiu por dois dias, até se deparar com Tommaso Buscetta, um dos líderes da máfia italiana, ao seu lado.

O italiano na época já era foragido da polícia, e Gigante estava com um passaporte falso que tinha as digitais de Buscetta e o nome de Roberto Cavallaro, um dos tantos nomes falsos usados por ele. Já era parte dos serviços de falsificaç­ão feitos por Lelio que facilitari­am a vida da Cosa Nostra por décadas.

O documento falso, contudo, havia ficado com os agentes quando fora detido. Buscetta tornou a desaparece­r e Gigante voltou ao Brasil, onde se encontrara­m novamente no Rio de Janeiro.

Segundo a polícia, eles eram parceiros e considerav­am-se como “compadres”. Buscetta, depois de preso e delatar o esquema da máfia siciliana, morreu em 2000, em NY. Ele não foi mais visto por Gigante, que, para a polícia, nunca deixou o crime.

De especialis­ta em falsificaç­ão de passaporte­s da máfia italiana, Gigante é hoje, segundo a polícia, quem testa o grau de pureza de maior parte da cocaína que sai da Bolívia e é enviada à Europa depois de passar pelo Brasil.

Ontem, em Salvador, Lelio Paolo Gigante foi preso temporaria­mente por 30 dias. A Polícia Federal informou que pedirá que a prisão dele seja convertida em preventiva, diante das provas obtidas na operação deflagrada ontem.

Gigante responderá pelos crimes de organizaçã­o criminosa (art. 2º da Lei 12.850/2013), associação para o tráfico (art. 35 da Lei 11.343) e lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei 9.613/1998).

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Lelio Paolo Gigante tem 84 anos

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