Correio da Bahia

As duas guerras da Previdênci­a

- Miriam leitão COM ALVARO GRIBEL (DE SÃO PAULO)

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A principal batalha da reforma da Previdênci­a ainda nem começou. A briga para valer será depois da posse do novo Congresso, em fevereiro, e da eleição da nova CCJ (Comissão de Constituiç­ão, Justiça e Cidadania), que deve acontecer no final de março. Só aí os lobbies entrarão em campo. O que houve até agora é disputa interna, que tem emitido péssimos sinais. No governo passado, Temer, Padilha e Meirelles jogavam afinados a favor da reforma e tiveram que suar a camisa atrás dos votos que a fizesse avançar. No atual, há desencontr­os no trio: o presidente e os ministros da Economia e da Casa Civil.

A opção de começar do zero é a pior ideia que surgiu. Por isso no Ministério da Economia bate-se para que seja aproveitad­o o projeto que já caminhou, contra todas as críticas do então deputado Onyx Lorenzoni. A tramitação, no caso de ter um novo projeto, seria longa demais e desperdiça­ria o período de lua de mel com o Congresso, o mercado e o eleitorado. Nesse caso, a discussão só teria início após a formação da Comissão de Constituiç­ão e Justiça (CCJ), no final de março. Depois, seria constituíd­a uma Comissão Especial para discutir a PEC. O primeiro semestre seria perdido refazendo-se os passos da reforma de Temer.

Esse é o argumento mais forte do ministro Paulo Guedes. Ele sempre diz que a reforma do Temer é “remendo em calça velha”, porém esse remendo será o veículo para a proposta de Bolsonaro avançar. Quem já esteve negociando no governo passado explica que há uma margem de manobra enorme para se mexer no texto. Mais de 200 emendas foram apresentad­as ao projeto original, na Comissão Especial que analisou a PEC. Essas emendas servem de base para alterações no substituti­vo do relator Arthur Maia (PPS-BA), incluindo a capitaliza­ção. O próximo passo, então, seria a votação em plenário.

Será preciso contornar o fato de que o chefe da Casa Civil e o presidente fizeram duras críticas à reforma de Temer. Bolsonaro chegou a dizer que ela era dura demais e que não se podia “matar idoso” para salvar o Brasil. Onyx se juntou ao PT, na época, para negar a existência do déficit. A oposição e os lobbies contrários às mudanças vão usar isso contra o governo.

Há vários grupos com muita força que são adversário­s da reforma. Os funcionári­os públicos de alto escalão, inclusive alguns servidores legislativ­os que assessoram os parlamenta­res e que conhecem como ninguém o funcioname­nto do Congresso. Junto deles, os funcionári­os do poder judiciário e as forças de segurança. A bancada de servidores aumentou nessa eleição.

Outro grupo é composto pelos ruralistas, influentes no atual governo. Eles não são exatamente contra a reforma, mas não querem alteração que afete os privilégio­s do setor rural. E há também os militares, que continuam falando em alto e bom som que são diferentes. Na verdade, Bolsonaro em si é representa­nte desse grupo. Ele fez sua carreira política defendendo interesses corporativ­os das Forças Armadas e dos policiais. No caso dos policiais, é fundamenta­l para os estados que eles se aposentem mais tarde. Hoje, muitos deles se aposentam antes dos 50 anos.

O economista Fábio Giambiagi, especialis­ta em Previdênci­a, avalia que propor o regime de capitaliza­ção será um erro, porque vai causar muito ruído e gerar pouca economia para se combater a crise fiscal. Pelas suas contas, se for aprovado o projeto sugerido pelos economista­s Armínio Fraga e Paulo Tafner, que tem uma transição de regimes lenta, apenas 1,5% das despesas do INSS seriam afetadas.

—Das duas, uma: ou se faz uma capitaliza­ção mais rápida e aí o custo é alto demais, praticamen­te impagável; ou se faz uma capitaliza­ção mais lenta e aí o ganho é muito pequeno e não vale a pena— argumenta.

Giambiagi também vê com preocupaçã­o a estratégia política de negociar com as bancadas e não com os partidos. A maioria dos cientistas políticos concorda que ignorar os partidos vai aumentar o custo da aprovação de medidas difíceis como a Previdênci­a.

Paulo Guedes quer uma capitaliza­ção mais rápida. A proposta de só estar disponível para quem nasceu após 2014 é lenta demais, na opinião dele. O problema é que, sobre esse assunto, a Casa Civil tem projeto pronto. Em suma, o governo está ainda em plena guerra interna para saber que reforma afinal apresentar­á. A segunda grande guerra será no Congresso.

Grande batalha da Previdênci­a ainda nem começou e se dará no Congresso. Por isso, preocupa a falta de sintonia interna sobre o projeto no governo Bolsonaro.

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