Sob a mira da intolerância
Bando agride pai de santo, rouba e ataca pessoas incorporadas durante culto em Camaçari
“Eles colocaram a arma na cabeça dos orixás”. Foi com essa frase, falando com os olhos marejados e com a marca da violência no rosto, que o babalorixá Rychelmy Imbiriba contou como foram os minutos de terror que ele e mais 150 pessoas passaram na noite de sábado. O machucado na face, fruto de uma coronhada, não foi nada comparado à dor que o pai de santo sentiu com o desrespeito ao sagrado, ao culto do candomblé e aos orixás que ali se encontravam no Terreiro Ilê Axé Ojisé Olodumare, a Casa do Mensageiro.
Na noite destinada ao pai dos orixás, Oxalá, no primeiro festejo do ano, seis homens, pelo menos dois deles armados, invadiram o local, que fica na localidade de Barra do Pojuca, em Camaçari, no meio da cerimônia e a transformaram em um cenário de violência, desrespeito e choro.
Eles entraram no templo pela porta principal, foram até o salão em que a festa ocorria e deram voz de assalto. Algumas pessoas, pouco mais de 20, conseguiram fugir para os fundos do terreno, onde passa o Rio Pojuca.
ORIXÁ CHOROU
Durante a ação, os bandidos ordenaram que todos deitassem no chão, o que não foi cumprido pelas pessoas que estavam incorporadas com os orixás. Após levar o celular dos adeptos que estavam deitados, os homens começaram a revistar os orixás e chegaram a chacoalhá-los e apontar armas em suas cabeças, em uma tentativa frustrada de fazer com que eles deitassem ao chão e acordassem. Após a ação, Oxóssi chorou.
Dentre as falas dos bandidos, que deixaram os presentes revoltados, estavam: “Vamos bater nesses macumbeiros”; “Vocês nem deveriam praticar essa macumba aqui”; “Isso não existe, manda ele (orixá) parar”, dentre outros. Os xingamentos e atos para profanar a fé dos membros do terreiro foram realizados durante toda a ação criminosa.
A coronhada que o babalorixá Rychelmy recebeu foi justamente por tentar impedir a truculência dos homens contra os orixás. “Eu vi o movimento. Nós contamos seis homens, alguns encapuzados. Quando percebi, fui até lá fora para tentar acalmar os meus e entender o que estava acontecendo. Foi aí que eu recebi a coronhada e começou a jorrar sangue”, contou o pai de santo, contendo as lágrimas.
Na saída, os homens conseguiram levar um carro e acabaram batendo em outros veículos. “Eles levaram inúmeros celulares, um carro, a câmera de um fotógrafo que estava aqui que acabou levando uma coronhada e três pontos na cabeça também, e alianças das pessoas”, narrou o babalorixá.
“Eu estava esperando qualquer movimento pior para poder reagir. Eu teria morrido, teria brigado porque é tudo aquilo que eu acredito, a minha ancestralidade que é forte. E eu sei que isso é uma coisa que já vem desde a escravidão. Nesses momentos, você fica em desespero e pronto para qualquer coisa. Ali é o nosso sagrado”, comentou Rychelmy.
FILHOS DE SANTO
Enquanto o pai de santo falava com o CORREIO, os iaôs e de-