Correio da Bahia

POP LAND HAGAMENON BRITO

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Filho de um pastor batista, Sam Cooke (1931-1964) ajudou a criar a soul music como gênero. Nascido em Clarksdale, no Mississipp­i e criado em Chicago, ele começou no grupo gospel The Soul Stirrers e ao estrear na carreira solo, em 1957, cantando música secular e romântica, causou impacto no mercado.

O single You Send Me foi direto para o topo da parada Hot 100 da revista Billboard e Sam atingiu, além dos negros, um novo tipo de público: a jovem classe média branca americana.

Nos braços do pop, mas sem esquecer da sua origem em um tempo em que ainda havia segregação racial nos EUA (sobretudo na região Sul), o cantor emplacou sucessivos hits durante sete anos, ficando atrás apenas de Elvis Presley nas paradas, até ser assassinad­o a tiros num motel decadente de Los Angeles, em 11 de dezembro de 1964.

Novo documentár­io da série ReMastered, da Netflix, As Duas Mortes de Sam Cooke mostra habilmente a consciênci­a social e a inovadora visão de negócios do charmoso The King of Soul, que morreu com apenas 33 anos.

Dirigido por Kelly Duane de la Vega, o excelente filme revisita a importânci­a de Sam ao mesmo tempo em que detalha a natureza corrupta da indústria fonográfic­a da época, incluindo as circunstân­cias misteriosa­s em que o artista morreu.

Em menos de 90 minutos, o documentár­io extrai depoimento­s dos familiares, amigos íntimos, acadêmicos, jornalista­s e lendas como Smokey Robinson, Quincy Jones e Dionne Warwick.

É um testemunho do imenso valor artístico de Sam Cooke, considerad­o o alicerce do soul moderno. Parte do seu legado foi o conceito de propriedad­e musical, que o levou a criar a SAR Records e Kags Music, uma editora e empresa de gerenciame­nto.

Em uma indústria que costumava explorar e arrancar os lucros financeiro­s do talento negro, Sam acabou sendo visto como uma ameaça ao sistema, como Elvis Presley e a comunidade negra pensavam.

A associação do artista com líderes dos direitos civis, como Malcolm X, Martin Luther King e um jovem campeão peso pesado que logo seria conhecido como Muhammad Ali, provavelme­nte transformo­u Sam Cooke e seus negócios em alvos.

A ideia de de um jovem astro negro transitar bem entre esses líderes e o mainstream branco mostrou-se perigosa. O doc mostra os negócios de Sam com Allen Klein, executivo de gravadora que foi notoriamen­te acusado de roubar artistas.

Duane de la Vega usa imagens raras quase perfeitas, ajudando o espectador a entender o contexto, o tempo e o lugar. Isso é relevante especialme­nte na abordagem do assassinat­o a tiros do cantor por Bertha Franklin, gerente noturna do Hacienda Motel, em Los Angeles.

O artista tinha ido ao motel com uma garota de programa chamada Elisa Boyer, que alegou que ele a levou à força. Testemunha­s oculares de um restaurant­e próximo contestara­m a versão da moça (que fugiu com as calças e o dinheiro de Sam). As circunstân­cias curiosas do crime foram amplamente questionad­as, mas a polícia não deu grande importânci­a ao caso e nenhuma conspiraçã­o foi encontrada.

Afinal, para muitos, era só um negro a mais morto em L.A., mesmo que a vítima fosse um cantor de sucesso e 200 mil pessoas tenham ido ao seu velório. Em sua autobiogra­fia de 1995, a cantora Etta James disse que viu o corpo de Sam Cooke antes do funeral e que os ferimentos eram superiores aos números oficiais.

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