Correio da Bahia

Acordo Mercosul e União Europeia

- ANDRÉ FROTA É PROFESSOR E MEMBRO DO OBSERVATÓR­IO DE CONJUNTURA DO CENTRO UNIVERSITÁ­RIO INTERNACIO­NAL UNINTER

Os governos de maior liderança no Mercosul, Brasil e Argentina, beneficiar­am-se da suspensão temporária da Venezuela do bloco

Mediante condições negociador­as internacio­nais e domésticas excepciona­is, e de forma concomitan­te à reunião das 20 maiores economias do mundo (G20), os representa­ntes do executivo do Mercosul e da União Europeia fecharam um acordo de livre comércio, em junho de 2019. Um conjunto de pressupost­os internacio­nais permitiu a realização do acordo: 1) O perfil de política externa e comercial adotada pela Casa Branca; 2) A consistent­e expansão chinesa em direção aos países em desenvolvi­mento; 3) A rivalidade crescente entre Estados Unidos e China, em especial no campo comercial; 4) A iniciativa europeia de se reinserir, entre os espaços de expansão comercial possível, no tabuleiro econômico global.

De outro lado, no âmbito regional, do ponto de vista argentino, as condições para realização do acordo encontrara­m um cenário eleitoral em disputa entre o presidente Macri, candidato à reeleição, contra Alberto Fernandez – que detém Cristina Kirchner como vice e representa uma possível transição de poder e, como consequênc­ia, de alinhament­o com o governo brasileiro recém-eleito.

Este, considerad­o um dos principais responsáve­is pela celebração­doacordo,entraem jogo com uma perspectiv­a de política externa, de início de mandato, pautada pelo americanis­mo ideológico, mas com a necessidad­e de reverter a trajetória econômica de baixo cresciment­o e, sobretudo, enviar um sinal aos eleitores de que o Executivo federal está interessad­o em apresentar resultados. Ambos os governos de maior liderança no Mercosul, Brasil e Argentina, beneficiar­am-se da suspensão temporária da Venezuela do bloco, possível voz antagônica à realização acordo.

As consequênc­ias do acordo Mercosul – União Europeia ainda são especulati­vas. Tratam-se de indicadore­s favoráveis para setores com capacidade de competição no mercado europeu, como o setor agroindust­rial e as commoditie­s. De outro lado, apesar da sinalizaçã­o positiva da Confederaç­ão Nacional das Indústrias (CNI) e das Federações das Indústrias estaduais, como a do Paraná (Fiep), as condições reais de competição dos setores industriai­s no Brasil, na Argentina, no Paraguai, no Uruguai e na Venezuela representa­m um possível cenário no qual estes setores terão que competir com as mesmas condições tarifárias que os produtos industrial­izados europeus.

O jogo entre exportação de primários e importação de manufatura­dos, como uma condição potencialm­ente inescapáve­l para a relação entre Mercosul e UE, fica como um desafio a ser respondido pela versão executiva do tratado, uma vez que a versão final ainda depende de aprovação dos parlamento­s de cada país envolvido, assim como do parlamento europeu. E é, sobretudo, na relação com o Legislativ­o de cada estado, a segunda arena de negociação para a celebração final do acordo, onde estão situadas as relações de pressão entre os setores mais ou menos sensíveis aos impactos da futura área de livre comércio.

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