Estudantes se unem para entrar na Justiça
Patrício de Assis, da Vara Federal Cível e Criminal de Teixeira de Freitas, autorizou e determinou que, se a UFSB não cumprisse, deveria pagar uma multa de R$ 20 mil para cada um dos estudantes.
Segundo a instituição, não é possível “abrir novas vagas além do quantitativo indicado no registro do curso junto ao Ministério da Educação”.
CONTINGENCIAMENTO
A decisão ocorre pouco mais de dois meses após a universidade ter tido o maior percentual de recursos bloqueados pelo MEC. Em maio, o ministério anunciou o contingenciamento de repasses às federais de ensino superior e, na UFSB, o índice chegou a 54% de seu orçamento de custeio e investimento.
Apesar disso, a universidade informou, por meio de nota, que os cortes de verba feitos pelo MEC não influenciam na decisão da UFSB de como proceder nesse caso.
O que nem todo mundo sabe é que a UFSB é diferente da maioria das universidades federais. Lá, a formação acontece por ciclos. O Primeiro Ciclo, obrigatoriamente, é uma formação interdisciplinar – seja com os BIs, que existem também na Universidade Federal da Bahia (Ufba) -, ou com as chamadas Licenciaturas Interdisciplinares (LIs), criadas na UFSB.
Para avançar aos cursos do Segundo Ciclo – como Medicina, Direito e Engenharias –, é preciso fazer uma seleção interna que avalia os coeficientes de rendimento ao longo da primeira graduação. Desde 2017, essa seleção também reserva 55% das vagas para cotas.
Segundo os estudantes, em 2017 e 2018, ainda que tenham existido casos de estudantes não-cotistas que recorreram à Justiça para entrar sem ter sido selecionados em suas categorias, a UFSB acatou a decisão sem excluir os alunos da reserva de vagas.
DOIS CICLOS
Outro estudante prejudicado, que preferiu não se identificar, acredita que a situação é recorrente por conta da estruturação em dois ciclos. “A universidade promete um segundo ciclo, mas existem pessoas que não passam e têm que ficar perdendo tempo ainda no básico”. O aluno conta que, na última seleção, cerca de 170 pessoas tentaram ingressar no segundo ciclo de saúde - que oferece os cursos de Medicina e Psicologia. A seleção, contudo, ofereceu 110 vagas.
Ao CORREIO, a UFSB informou que “de acordo com a Pró-Reitoria de Gestão Acadêmica (PROGEAC), as cotas na Universidade Federal do Sul da Bahia são utilizadas em todos os nossos sistemas de acesso e na totalidade dos nossos processos seletivos, sejam de 1º ou de 2º ciclo". Parte dos estudantes prejudicados se uniu para procurar ajuda profissional. A estudante Ana Leticia Sampaio faz parte dos que conseguiram se organizar para tentar reverter o caso na Justiça. “A gente se juntou para conseguir pagar advogado particular, ele vai entrar com ações para cada um”, explica ela.
Ana conta que os estudantes excluídos da lista de aprovados não receberam qualquer comunicado da instituição que justificasse a decisão. “Eu vi a lista no site e achei que tivesse algum erro. Só depois a gente, conversando pelo WhatsApp com pessoas que conhecemos na gestão, descobriu o que aconteceu”, relembra.
Agora, Ana e os colegas convivem com a incerteza de saber se o sonho de estudar Medicina vai ou não se concretizar. “É o meu maior sonho, me sinto completamente injustiçada, já emagreci quatro quilos desde quinta-feira porque não consigo nem comer direito. A universidade não está tendo nenhum tipo de empatia com os alunos, não se preocupa com a gente, com a nossa saúde mental. Mas eu tenho esperança de que vou conseguir passar por isso”.
A possibilidade de buscar a ajuda profissional privada não é uma realidade para todos. No caso da estudante soteropolitana Carolina Soares, por exemplo, ter acesso a um advogado particular não é uma opção. “Essa via da ‘justiça externa’, a gente não tem. O que mais me aflige nessa questão é que eu sei que tenho colegas que podem fazer uma força com a família e pagar por um advogado. Eu não tenho essa condição. Nem eu, nem alguns outros colegas”.
O CORREIO procurou a Defensoria Pública da União (DPU) para questionar como os alunos poderiam receber a assistência jurídica necessária para o caso. Como se trata de uma situação dentro de uma universidade federal e as demandas judiciais são de competência da Justiça federal, caberia à Defensoria federal acompanhar o caso.
“Só existem unidades da DPU em Vitória da Conquista, Feira de Santana e Salvador. O caso deveria ser acompanhado por uma Defensoria Pública da União. Mas, como não há DPU em Porto Seguro, esses estudantes devem, infelizmente, procurar assistência jurídica gratuita em faculdades de Direito, caso exista esse serviço na cidade, ou advogados particulares”, diz a nota.
O sistema de cotas utilizado pela UFSB foi consolidado em uma resolução publicada em 2018.