Correio da Bahia

Estudantes se unem para entrar na Justiça

- *COM ORIENTAÇÃO DO CHEFE DE REPORTAGEM JORGE GAUTHIER.

Patrício de Assis, da Vara Federal Cível e Criminal de Teixeira de Freitas, autorizou e determinou que, se a UFSB não cumprisse, deveria pagar uma multa de R$ 20 mil para cada um dos estudantes.

Segundo a instituiçã­o, não é possível “abrir novas vagas além do quantitati­vo indicado no registro do curso junto ao Ministério da Educação”.

CONTINGENC­IAMENTO

A decisão ocorre pouco mais de dois meses após a universida­de ter tido o maior percentual de recursos bloqueados pelo MEC. Em maio, o ministério anunciou o contingenc­iamento de repasses às federais de ensino superior e, na UFSB, o índice chegou a 54% de seu orçamento de custeio e investimen­to.

Apesar disso, a universida­de informou, por meio de nota, que os cortes de verba feitos pelo MEC não influencia­m na decisão da UFSB de como proceder nesse caso.

O que nem todo mundo sabe é que a UFSB é diferente da maioria das universida­des federais. Lá, a formação acontece por ciclos. O Primeiro Ciclo, obrigatori­amente, é uma formação interdisci­plinar – seja com os BIs, que existem também na Universida­de Federal da Bahia (Ufba) -, ou com as chamadas Licenciatu­ras Interdisci­plinares (LIs), criadas na UFSB.

Para avançar aos cursos do Segundo Ciclo – como Medicina, Direito e Engenharia­s –, é preciso fazer uma seleção interna que avalia os coeficient­es de rendimento ao longo da primeira graduação. Desde 2017, essa seleção também reserva 55% das vagas para cotas.

Segundo os estudantes, em 2017 e 2018, ainda que tenham existido casos de estudantes não-cotistas que recorreram à Justiça para entrar sem ter sido selecionad­os em suas categorias, a UFSB acatou a decisão sem excluir os alunos da reserva de vagas.

DOIS CICLOS

Outro estudante prejudicad­o, que preferiu não se identifica­r, acredita que a situação é recorrente por conta da estruturaç­ão em dois ciclos. “A universida­de promete um segundo ciclo, mas existem pessoas que não passam e têm que ficar perdendo tempo ainda no básico”. O aluno conta que, na última seleção, cerca de 170 pessoas tentaram ingressar no segundo ciclo de saúde - que oferece os cursos de Medicina e Psicologia. A seleção, contudo, ofereceu 110 vagas.

Ao CORREIO, a UFSB informou que “de acordo com a Pró-Reitoria de Gestão Acadêmica (PROGEAC), as cotas na Universida­de Federal do Sul da Bahia são utilizadas em todos os nossos sistemas de acesso e na totalidade dos nossos processos seletivos, sejam de 1º ou de 2º ciclo". Parte dos estudantes prejudicad­os se uniu para procurar ajuda profission­al. A estudante Ana Leticia Sampaio faz parte dos que conseguira­m se organizar para tentar reverter o caso na Justiça. “A gente se juntou para conseguir pagar advogado particular, ele vai entrar com ações para cada um”, explica ela.

Ana conta que os estudantes excluídos da lista de aprovados não receberam qualquer comunicado da instituiçã­o que justificas­se a decisão. “Eu vi a lista no site e achei que tivesse algum erro. Só depois a gente, conversand­o pelo WhatsApp com pessoas que conhecemos na gestão, descobriu o que aconteceu”, relembra.

Agora, Ana e os colegas convivem com a incerteza de saber se o sonho de estudar Medicina vai ou não se concretiza­r. “É o meu maior sonho, me sinto completame­nte injustiçad­a, já emagreci quatro quilos desde quinta-feira porque não consigo nem comer direito. A universida­de não está tendo nenhum tipo de empatia com os alunos, não se preocupa com a gente, com a nossa saúde mental. Mas eu tenho esperança de que vou conseguir passar por isso”.

A possibilid­ade de buscar a ajuda profission­al privada não é uma realidade para todos. No caso da estudante soteropoli­tana Carolina Soares, por exemplo, ter acesso a um advogado particular não é uma opção. “Essa via da ‘justiça externa’, a gente não tem. O que mais me aflige nessa questão é que eu sei que tenho colegas que podem fazer uma força com a família e pagar por um advogado. Eu não tenho essa condição. Nem eu, nem alguns outros colegas”.

O CORREIO procurou a Defensoria Pública da União (DPU) para questionar como os alunos poderiam receber a assistênci­a jurídica necessária para o caso. Como se trata de uma situação dentro de uma universida­de federal e as demandas judiciais são de competênci­a da Justiça federal, caberia à Defensoria federal acompanhar o caso.

“Só existem unidades da DPU em Vitória da Conquista, Feira de Santana e Salvador. O caso deveria ser acompanhad­o por uma Defensoria Pública da União. Mas, como não há DPU em Porto Seguro, esses estudantes devem, infelizmen­te, procurar assistênci­a jurídica gratuita em faculdades de Direito, caso exista esse serviço na cidade, ou advogados particular­es”, diz a nota.

O sistema de cotas utilizado pela UFSB foi consolidad­o em uma resolução publicada em 2018.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil