CONTAMINADOS NA HEMODIÁLISE
Pacientes renais crônicos relatam falha de clínica e contaminação por alumínio em mais de 30 pessoas
A deformidade no braço direito de dona Sandra não foi a única marca presente no tratamento da hemodiálise – procedimento em que uma máquina limpa e filtra o sangue. Ainda no seu corpo, circulam no sangue níveis elevados de alumínio, metal que não tem função biológica, mas, quando absorvido em grande quantidade, pode levar à morte. Ela e ao menos 32 pacientes foram contaminados no início do primeiro semestre deste ano, durante o tratamento na DaVita Serviços de Nefrologia Salvador, no bairro de Caminho de Areia. A clínica faz parte de uma rede internacional líder no tratamento de pacientes com doença renal grave.
De acordo com determinação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o limite de alumínio é de 10 microgramas por litro (μg/l). O CORREIO teve acesso, com exclusividade, ao resultado de um exame realizado em 32 pacientes da DaVita no laboratório de análises da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) de Salvador. Na lista, constam os nomes de homens e mulheres com os níveis de contaminação que variam de 101,37 (μg/l) a 220,78 (μg/l). A coleta aconteceu entre os dias 29 de maio e 4 de junho deste ano.
O nome de Sandra Maria Reis, 50 anos, não está na lista, mas, segundo ela, exames médicos realizados pela própria DaVita apontam que o seu corpo apresenta 100 μg/l – número dez vezes maior que o permitido. A exclusão do nome de Sandra evidencia um outro problema relatado por ela e outros doentes entrevistados: o número pode chegar a 150 contaminados pelo metal.
Também doente renal, o marido de Sandra, Gilson de Jesus Silva, 46, faleceu no dia 18 de agosto deste ano. Ele é um dos nomes da lista que mostra o nível de contaminação por alumínio. “O atestado de óbito deu múltipla falência dos órgãos, mas não diz o que causou a morte. Acredito que tenha a ver com o excesso do alumínio”, diz Sandra.
Um processo que tramita na 18ª Vara de Relações de Consumo da Comarca de Salvador já garantiu a 18 pacientes a continuidade do tratamento na DaVita. A ação visa também uma reparação por dano moral no valor total de R$ 5,1 milhões. A audiência está marcada para o dia 29 de novembro, às 11h, no Fórum Rui Barbosa.
O Ministério Público do Estado (MP-BA) informou que existe um procedimento instaurado pela promotora Cláudia Elpídio. “O caso está sendo apurado. Ela ouviu representantes da Clínica DaVita e solicitou diligências para os órgãos de fiscalização, como a Vigilância Sanitária. Após receber e apreciar todas as informações solicitadas, será decidido que providências serão tomadas pelo MP”, diz a nota do órgão.
O COMEÇO
O exame de Cintia Carla da Silva Gomes, 41, uma das pacientes contaminadas, apontou 74,6 (μg/l) de alumínio no corpo. Ela faz parte de um grupo de pacientes autores de um dos processos movidos contra a DaVita.
Em maio, os sintomas começaram a aparecer. “Faço hemodiálise há seis anos e nunca havia passado por isso. Há sete meses, comecei a sentir dores por todo o corpo, ao mesmo tempo que a perder colegas de tratamento e não estávamos tendo retorno da clínica do que estava acontecendo. Uma turma se mobilizou para pedir uma satisfação. Foi aí que abriram o jogo e disseram que adquirimos o alumínio durante o tratamento”, disse ela.
O alumínio teria sido inserido no corpo dos pacientes depois de uma falha de um funcionário da DaVita. “Depois dessa reunião, os médicos passaram a chamar os pacientes de forma individual numa sala para dizer que a contaminação foi uma falha do técnico da máquina que faz a osmose, que é o tratamento da água para o processo da hemodiálise e esse técnico estava fraudando os laudos de purificação da água”, relatou Cíntia.
Ainda de acordo com ela, a empresa disse, na ocasião, que o funcionário cometia a fraude para não ter o trabalho de fazer os testes diários na água e que, por isso, foi demitido por justa causa.
O alumínio é excretado essencialmente pelo rim. Logo, os doentes com doença renal crônica podem sofrer acumulação, com consequente intoxicação pelo metal. Os principais sinais dessa intoxicação pelo alumínio são: anemia, neurotoxicidade aguda (ocorre quando a exposição a substâncias tóxicas naturais ou artificiais, chamadas neurotoxinas, altera a atividade normal do sistema nervoso); ataxia (incapaci