Novos senhores de armas
Arsenal apreendido na BR-116 mostra perfil diferente de transportadores de armamento no país
Aviagem é longa. A mala, no bagageiro de um ônibus clandestino, transporta uma carga especial, avaliada em R$ 500 mil. Se houver uma emergência, está tudo lá, embalado e quase pronto para uso: munição, carregadores e um arsenal novinho em folha. São 26 pistolas semiautomáticas e dois fuzis 556 de fabricação norte-americana, pesando cerca de três quilos cada um e com um alcance de quase 800 metros. Mas, se precisar disparar um tiro, o responsável pela encomenda, provavelmente, estará em apuros.
Foi-se o tempo em que os transportadores de armamento no Brasil eram donos de longas fichas criminais. Nos últimos anos, o crime organizado tem apostado em outro perfil para a missão: homens sem passagens pela polícia, mulheres e idosos, também sem ficha criminal como as três pessoas que foram presas esta semana com pistolas e fuzis na Bahia.
Os pontos de circulação de armas não se restringem mais aos estados com fronteira para outros países. E saber manusear a arma não é pré-requisito para fazê-la chegar às mãos de traficantes de drogas ou assaltantes de banco. A maior qualidade, nesses casos, é a discrição para dificultar o trabalho da polícia.
“Quem trazia essas armas eram pessoas de alta periculosidade, com ficha extensa. De uns cinco anos para cá, eles têm mudado o perfil. Aliciam mulheres, pessoas idosas ou que estejam precisando de dinheiro e, por pouco valor, essas pessoas aceitam transportar”, explica o chefe de Operações Especializadas da Polícia Rodoviária Federal na Bahia (PRF), inspetor Jader Ribeiro.
Mesmo assim, o número de apreensões pela PRF-BA de janeiro a 25 de novembro deste ano foi 103% maior do que no mesmo período do ano passado. Para isso, a PRF tem organizado um calendário de operações e usado cães farejadores - três por local de operação.
Se não forem apreendidas, as armas podem ter uma longa vida útil nas mãos do crime organizado. Uma vez interceptadas, têm dois destinos possíveis: são destruídas pelo Exército ou vão para a polícia - se as armas forem compatíveis com as usadas pelas forças de segurança.
Até lá, o armamento fica nas mãos da Polícia Judiciária, em bunkers cujo endereço é sigiloso. Para o gerente de advocacy do Instituto Sou da Paz, Felippe Angeli, é importante que as investigações apontem a origem das armas. “A maior parte dessas armas são velhas e uma muito menor que pode ir para a polícia. A demora na decisão, se vai ou não para a polícia, acaba aumentando o armazenamento, que favorece o roubo dessas armas”.
Ele chama atenção para o fato de que, com mais armas circulando, cresce também o número de homicídios. “Havia uma tendência de queda desde 2017 e em 2020 houve aumento, mesmo com a pandemia”, afirma.
Locais com mais apreensões BR-116, por fazer a ligação entre o Norte e o Nordeste com o Sudeste, e BR-324, por levar até Salvador
Especializados Geralmente, três cães farejadores se revezam em cada local de operação
Perfil dos transportadores Pessoas sem ficha criminal, mulheres ou idosos que precisem de dinheiro e aceitem o serviço com um pagamento baixo