Correio da Bahia

Violência recorde no fim de semana

Região Metropolit­ana e Salvador registrara­m 15 homicídios em dois dias

- Bruno Wendel* REPORTAGEM bruno.cardoso@redebahia.com.br

O jovem Wagner Santana Bispo da Silva, 19 anos, era balconista de uma padaria em um turno e, no outro, trabalhava em um lava-jato na Boca do Rio. Seu desejo era seguir a carreira militar. Em dezembro passado foi convocado pelo Exército e se apresentar­ia em um batalhão ontem. O sonho do rapaz, no entanto, foi interrompi­do de forma brusca. Wagner e outras 14 pessoas foram assassinad­as entre o sábado e o domingo, nesse que já é o final de semana mais violento de 2021 em Salvador e na Região Metropolit­ana (RMS).

No sábado (23), foram quatro homicídios, e no domingo (24), 11 pessoas tiveram suas vidas abreviadas pela violência. Os dados são dos boletins diários das ocorrência­s policiais, à disposição no site da Secretaria de Segurança Pública (SSP). No primeiro final de semana do ano (dias 2 e 3) foram 7 assassinat­os. No segundo (9 e 10 de janeiro), o número de mortos já saltou para 13. No terceiro final de semana de 2021 (dias 16 e 17) foram 8 pessoas mortas.

A maioria dos assassinat­os dos dias 23 e 24 ocorreram em Salvador. Foram 8 só na capital, Wagner entre as vítimas. Ele foi morto no sábado, na Boca do Rio. O rapaz havia parado em um bar para falar com amigos quando traficante­s chegaram atirando aleatoriam­ente. Ele correu e acabou baleado nas costas.

Entre os casos registrado­s na RMS, duas pessoas foram mortas no domingo na cidade de Candeias, entre elas o vereador André Luiz Ferreira de Araújo (PP), conhecido como Júnior CCA. Ele foi o quinto mais votado na última eleição e estava em seu primeiro mandato. Foi morto com vários tiros dentro de um bar por um homem que chegou ao bairro Sarandi em uma moto. A mulher dele também foi baleada e está internada no Hospital do Subúrbio. Outras três pessoas teriam sido feridas (leia mais sobre o crime, ao lado).

Em relação aos assassinat­os neste final de semana, a Secretaria da Segurança Pública informou que a Polícia Civil investiga os casos e que, aqueles relacionad­os ao tráfico de drogas, receberão atenção especial. “Ressaltamo­s ainda que o combate às facções continua sendo prioridade, haja vista que a maioria das mortes tem relação com a venda de entorpecen­tes”, diz a nota enviado ao CORREIO.

PRISÃO DE SUSPEITO E PROTESTO

No domingo, 24, um suspeito de ter matado Wagner Santana Bispo da Silva foi preso pela Polícia Militar (PM). A informação foi confirmada na noite de ontem ao BATV, telejornal da Rede Bahia, pelo major Macedo, da 39ª Companhia Independen­te da PM.

Segundo o major, que foi responsáve­l por socorrer Wagner para o hospital após o rapaz ser baleado, dois homens foram presos no domingo, em Mussurunga, e um deles seria suspeito de ter matado o adolescent­e. Os nomes dos suspeitos detidos não foram revelados pelo policial, que acrescento­u ainda que a guarnição apreendeu duas armas junto com os homens.

Ontem, a Boca do Rio amanheceu com cartazes e faixas com pedidos de justiça. Na Estrada do Curralinho, a pouco metros da 9ª Delegacia, parentes e amigos de Wagner bloquearam a via com pneus. Eles protestara­m pela morte brutal do rapaz.

“Era o meu filho mais velho, meu orgulho. Hoje ele estaria se apresentan­do no Exército, o que mais queria”, lamentou o pai do rapaz, Walmir Bispo da Silva Filho, 38.

Segundo ele, o filho saiu de casa, na Rua da Tranquilid­ade, para comprar uma cerveja em um bar na Rua Georgina, na localidade de Baixa Fria, por volta das 21h do sábado. Ao chegar no local, havia um aniversári­o e ele parou para cumpriment­ar os amigos. Foi neste momento que surgiu um grupo de homens armados com pistolas. Eles começaram a revistar algumas pessoas e, num determinad­o momento, sem motivo aparente, um bandido atirou duas vezes para o alto.

“Nessa hora todo mundo ficou em pânico. Todo mundo correu para se proteger e ele fez a mesma coisa. Correu para a casa do vizinho, que fica ao lado do bar e foi baleado duas vezes nas costas e caiu em frente ao portão. Nem deu tempo de socorrer”, contou o tio de Wagner, o segurança Ramires Santos, 45.

O tio lembrou o quanto o rapaz era querido. “Todo mundo aqui gostava dele. Menino trabalhado­r. Pela manhã era balconista numa padaria. À tarde, dava duro num lava-jato. Quando soubemos da notícia que de ele ia ser

vir no Exército, eu e outros tios já tínhamos decidido pagar o curso preparatór­io dele para o concurso da PM, caso fosse dispensado depois pelo Exército. E agora ele se foi”, lamentou o tio.

Ainda durante o protesto, moradores disseram que os homens armados eram traficante­s da localidade do Cajueiro, onde atua a facção Bonde do Maluco (BDM). Eles atacaram a Baixa Fria, reduto da facção Comando da Paz (CP). A Polícia Civil infomou apenas que o caso está com a 1ª DH/Atlântico, que apura a autoria e motivação.

O corpo de Wagner foi enterrado sob forte comoção e aplausos, por volta das 14h de ontem, no Cemitério Municipal de Brotas. O enterro foi marcado pela presença de muitos amigos e familiares que queriam prestar suas últimas homenagens. Quem convivia c om o rapaz se recusava a acreditar na perda tão violenta. Muitas pessoas passaram mal e tiveram que ser amparadas.

Anderson Souza, de 34 anos, era amigo da vítima e consolava quem precisava de um amparo, dizendo que era preciso ter forças e erguer a cabeça. Ele lamentou a interrupçã­o de uma vida de forma tão precoce.

“Uma pessoa de bem, que morava com a mãe e o pai, ajudava a família e sustentava também a casa. Nunca se envolveu com nada, a família sempre deu uma boa educação. Agora é preciso ter forças para seguir em frente”.

Nessa hora todo mundo ficou em pânico. Todo mundo correu para se proteger e ele fez a mesma coisa. Correu para a casa do vizinho, que fica ao lado do bar e foi baleado duas vezes nas costas e caiu em frente ao portão. Nem deu tempo de socorrer Ramires Santos Tio do adolescent­e morto na Boca do Rio

Uma pessoa de bem, que morava comamãeeo pai, ajudava a família e sustentava também a casa. Nunca se envolveu com nada, a família sempre deu uma boa educação Anderson Souza Amigo de Wagner, ao falar sobre o caráter do rapaz durante o enterro, ontem

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