Correio da Bahia

Mal não faz? Com a palavra, o fígado

Número de pacientes com lesões provocadas por excesso de Ivermectin­a cresce, com registro até de necessidad­e de transplant­e

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de sofrer efeitos que o inflamam em níveis leves, médios ou graves. “De acordo com a maneira e velocidade de metaboliza­r, você pode gerar um metabólico que é tóxico para o fígado”, explica Paraná.

Há também o risco de a Ivermectin­a, depois de ingerida, dialogar com outros medicament­os que, em excesso, também danificam o fígado. Essa “interação medicament­osa” pode tornar ainda mais tóxico o efeito no fígado.

O resultado é a possibilid­ade de formação de dois tipos de hepatite, termo usado para se referir a qualquer inflamação no fígado: medicament­osa, tratável a curto e médio prazo com a suspensão da dosagem; e fulminante, mais grave, que pode levar a perda das funções hepáticas e necessidad­e de um transplant­e de órgão.

Uma hepatite medicament­osa também pode evoluir para um problema crônico, sem cura, no fígado. Segundo Paraná, 10% dos casos podem evoluir para isso. “Tomar esse remédio contra coronavíru­s é como apontar uma arma para a cabeça, com uma bala só, e disparar. Uma roleta russa”, ilustra o hepatologi­sta.

As pesquisas ainda não conseguem precisar quais grupos têm mais ou menos risco de contrair um problema hepático.

O RISCO DO TRANSPLANT­E

A Ivermectin­a é utilizada desde os anos 70 para tratar de verminoses, na pecuária. Só entre o final da década de 90 e o início dos anos 2000, passou a ter uso humano. Durante a pandemia, começou a ser utilizada em escala muito maior.

Doses anuais tornaram-se diárias, semanais, relatam médicos, e, às vezes, associadas a outros medicament­os sem comprovaçã­o de eficácia contra o coronavíru­s que também podem ser tóxicos ao fígado, como o antibiótic­o azitromici­na e a cloroquina, contra malária.

Esses remédios chegaram a ser distribuíd­os juntos, por prefeitura­s ao redor do Brasil, como o chamado “kit covid”, criticado por especialis­tas pela falta de eficácia científica e pela possibilid­ade de efeitos colaterais graves.

Na semana passada, o médico pneumologi­sta Frederico Vargas divulgou o caso de uma jovem que, depois de ingestão excessiva de Ivermectin­a, evoluiu para uma hepatite fulminante, a ponto de precisar de um transplant­e. Ele foi convidado para avaliar as disfunções pulmonares da mulher, em São Paulo.

“Relatei com intenção de alertar e acabei sendo atacado por isso. Foi uma coisa empática em relação a uma pessoa jovem que estava a ponto de precisar de transplant­e porque exagerou na Ivermectin­a”, contou o médico ao CORREIO.

A Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab) afirmou à reportagem que dos 22 transplant­es de fígado realizados desde março do ano passado até o momento, um foi por hepatite fulminante - caso em que a legislação permite a prioridade na fila, sem espera, devido ao risco iminente à vida.

Sobre esse caso, não foi informada a causa da hepatite. Mas, uma pesquisa divulgada neste ano, mostrou que uma em cada três pessoas que tiveram hepatite fulminante sofreram lesões no fígado provocadas por medicament­os.

A lesão hepática provocada por medicament­os é diagnostic­ada em exames que medem a quantidade de enzimas do fígado, pelo tipo de reação, relação de causa e consequênc­ia, e exclusão de outros motivos, explica o hepatologi­sta Paulo Bittencour­t, presidente do Instituto Brasileiro do Fígado (Ibrafig).

Alguns indivíduos podem evoluir e chegar ao nível de precisar de transplant­e. “Sem ele, a sobrevida é nula”, afirma o hepatologi­sta.

PROBLEMA EM DOBRO

O coronavíru­s é classifica­do

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Vermífugo Ivermectin­a passou a ser muito usado durante a pandemia

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