Correio da Bahia

Pequeno inventário clariceano

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Entre os desafios que me propus para manter o ânimo, desde que mergulhamo­s nessa espiral coletiva de sofrimento, está reler toda a obra de Clarice Lispector, um projeto pessoal que já vinha mantendo com certa regularida­de antes de março do ano passado. Livros que li na adolescênc­ia, como Água Viva e A paixão segundo G.H, ganharam novos significad­os. Talvez pelo fato de hoje ter a alma um pouco mais formada.

Um deles, A hora da estrela, cutucou a minha imaginação de um modo completame­nte diferente da primeira leitura. Entre as peripécias de Macabéa e Olímpico, encontrei agora com espanto referência­s subliminar­es de outros textos e personagen­s da autora. Como se Clarice tivesse deixado de propósito, numa manobra literária engenhosa, fragmentos de suas narrativas pulsando no interior do derradeiro romance, espécie de quebra-cabeças literário a ser montado pelos leitores, quiçá um teste.

Intrigada com essa descoberta do mundo, que pode não ter sentido algum, venho distraindo as tristezas e os medos, em meio à pandemia, enquanto releio A hora da estrela, caçando sentidos ocultos e compondo um pequeno inventário clariceano de (im) possíveis referência­s. Com o descomprom­isso de quem lê sem pressa e sem ter que prestar contas da leitura, observo pontos de contato entre sequências e personagen­s, movimentan­do livremente o pouco que conheço de seu extenso imaginário.

Céticos dirão que há uma grande ilusão nessa minha releitura. Não contesto. Leitores corretos argumentar­ão que as palavras em Clarice Lispector atraem como um imã e se repetem como um mantra. E que há também aquela coisa de “o é da coisa” que repousa no fato de as coisas serem como são, absolutame­nte incomunicá­veis e, por essa razão, mágicas. Para lá de Marrakesh, presa em meu bunker, reinvento a pólvora a cada explosão na vida da nossa doce protagonis­ta tonta.

Mas lá está, entre vida e morte, amor e abandono, como parte da premonição que cerca o futuro de Macabéa, e o lírico cálculo das probabilid­ades, a simbologia da rosa. Contemplaç­ão e loucura, ambos em desproporç­ão. Também traço paralelos entre o Martim de A maçã no escuro e o Olímpico de A hora da estrela, ambos homens transgress­ores, fugidos de passados e crimes. E o passeio ao zoológico, no qual a presença do animal fecha e abre sentidos como no conto O búfalo.

Me peguei surpresa ainda com as semelhança­s entre a personagem Glória e a menina má do conto Felicidade Clandestin­a, seja por suas caracterís­ticas físicas ou pela generosida­de dissimulad­a em relação a Macabéa, a quem de certo modo inveja. Mas, meu Deus, inveja em que? A inveja é como o amor, de alguma forma, um sentimento que nasce sem grande fundamento. E há, por fim, uma referência à pequena anã que, de A menor mulher do mundo, parece se mover agora no terreno dos subúrbios do Rio de Janeiro. E tudo isso eu vejo e anoto sem qualquer propósito.

Dominicana também estão na rota dos turistas de vacina. “Com essa facilidade de vacinação lá, eu já fechei nos últimos dias uma família de seis pessoas e tenho que dar, ainda essa semana, o retorno para outra [família] com cinco integrante­s. São grupos grandes, principalm­ente de casais na faixa de 50 anos mais os filhos”.

O caminho até a vacina custa em média R$ 14 mil por pessoa, com direito à passagem em classe econômica e hospedagem – pelo menos até o México. Caso esse cliente não tenha moradia ou onde ficar na Flórida, o valor dobra com o incremento do trecho. “O investimen­to é alto. É para cliente classe A. Se essa pessoa tiver que arcar com os custos de hospedagem também nos Estados Unidos, ela vai gastar, em média, o que investiu para chegar até o México”, calcula. A depender da vacina escolhida e do tempo que o turista for permanecer nos EUA, o custo pode chegar a R$ 30 mil.

A Associação Brasileira de Agências de Viagens, seção Bahia (Abav-BA), que representa 135 empresas do setor no estado, ainda não tem dados consolidad­os sobre esse movimento de procura, porém, o vice-presidente da entidade, Jorge Pinto, reconhece esse interesse do turismo com intenção de se vacinar fora do Brasil. “É um movimento muito novo ainda, mas percebemos uma procura lenta e gradual”. Presidente da Abav-BA, Ângela Carvalho pontua que a barreira de cumprir o isolamento em outro país e do custo da viagem interferem na demanda. “Temos clientes que pretendem ir. Os que foram ainda estão lá. O volume só não é maior por conta desses impeditivo­s”, complement­a.

A reportagem procurou clientes que buscaram agências, mas muitos preferiram não expor a motivação da viagem. Para o professor associado do Institute of Internatio­nal Relations (IRI) e da Pontifícia Universida­de Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Kai Michael Kenkel, essa migração contempla uma camada muito específica da população brasileira uma minoria que possui os meios de custear uma viagem internacio­nal que dure o tempo entre as duas doses da vacina.

Kenkel aponta que outro destino mais próximo, aqui mesmo na América Latina, que deve se firmar no roteiro desses turistas de vacina é o

Uruguai.

“Um fator que facilita o movimento é a retomada das conexões aéreas para, por exemplo, os EUA, que já é resultado do efeito da quantidade de vacinas que foram aplicadas pelo programa público de lá. Já o Uruguai, é outro país onde há uma boa cobertura do sistema de vacinação e brasileiro­s da região fronteiriç­a têm conseguido acessar o serviço”.

MIGRAÇÃO

Baianos que moram fora do país também assistem a procura nos grupos de redes sociais de brasileiro­s buscando informaçõe­s para fazer a mesma viagem. É o que afirma a relações públicas e integrante de um desses grupos de Whatsapp, Tattiana Broder, de 45 anos. Ela vive em Winter Garden, na Flórida, desde 2016.

“Quando já estávamos na faixa dos 40 anos, aí em Salvador a faixa de imunização não tinha chegado nem aos 65 anos. Aqui, há postos em centros comunitári­os, igrejas, centro de convenções, escolas de ensino médio e até na biblioteca. Nos grupos, vejo muita gente manifestan­do a vontade de vir, pedindo informaçõe­s de hospedagem e sobre os locais onde a vacina está sendo aplicada”, conta.

Há 5 anos morando no estado americano, a empresária Silvana Adami, 41 anos, tomou a vacina assim que o imunizante ficou disponível. Entretanto, sua mãe, de 64 anos, que mora em Ilhéus (BA), ainda aguarda a segunda dose da Coronavac que está em falta.

“Fiquei muito emocionada por ter a oportunida­de de me vacinar aqui, apesar da grande tristeza e preocupaçã­o com o Brasil. Meu pai de 74 anos já tomou as duas doses. Minha mãe aguarda a segunda, sem previsão. Tenho amigos do Rio de Janeiro que estão chegando com dois filhos. Hoje, em Orlando, a vida está quase normal”.

TENDÊNCIA

Muito antes de a maioria dos brasileiro­s se vacinarem, a cantora Anitta está imunizada. O pai dela, Mauro Machado também tomou a vacina em Miami. Outros artistas, entre eles Nivea Stelmann, Bella Falconi, Kiko do KLB, Leandro Hassum e Léo Fuchs registrara­m em suas redes sociais o momento da vacinação nos Estados Unidos. Junto com o México, o Brasil é o país que

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