Correio da Bahia

BAIANIDADE­S

- POR JOÃO GABRIEL GALDEA

episódios na nossa história? Quem ajuda a explicar isso é o professor Anderson Marinho, do Departamen­to de História da Arte e Pintura da Escola de Belas Artes da Universida­de Federal da Bahia (EBA-Ufba). Segundo ele, a maior parte dos pintores baianos do século XIX produziam obras religiosas para as ordens. Mas, no final daquele século, chegou a Salvador o pintor espanhol Miguel Navarro Y Cañizares, que acabou fundando a Escola de Belas Artes. E ali as coisas começaram a mudar.

NOVOS SÍMBOLOS

Existem duas versões para essa história. A primeira é de que Cañizares começou a dar aulas no Liceu de Artes e Ofícios, criado em 1871, e que após uma briga com outro professor decidiu criar a Escola de Belas Artes. A segunda, na qual o professor Anderson tende a acreditar mais, é a de que Cañizares já tinha um projeto de fundar uma escola na Venezuela. Mas, ao chegar a Salvador, viu que existia ali um liceu que trabalhava num nível parecido com o dele. Decidiu ficar e, após um conflito por ciúmes, deixou o Liceu para criar a Escola de Belas Artes.

Era 1877 e foi ali que os principais pintores baianos daquela época foram formados. “Era um ensino baseado no modelo francês e que já tinha uma tradição do retrato. O final do século XIX é uma transição dessa arte de cunho religioso para outras obras. Quase todos os alunos dos primeiros anos começaram a pintar retratos e a atender ao mercado da Bahia”, explica Marinho.

Aquele período coincide com um momento importante: a Proclamaçã­o da República. “O símbolo da Família Real cai e o Brasil precisa de novos símbolos, que vão ser os militares, políticos, professore­s, os grandes nomes das ordens religiosas”, completa o professor. As pessoas começam a encomendar seus retratos e as instituiçõ­es mandam fazer imagens de seus líderes e seus benemérito­s.

Não é por acaso, então, que a maior parte do acervo de pinturas do IGHB seja de retratos. Das 22 telas, 15 são da pinacoteca de lá. Há até telas sem identifica­ção dos homenagead­os, mas que foram pintadas por um nome: José Antônio da Cunha Couto. E foi por isso que seus retratos foram escolhidos para integrar o edital de restauro.

Cunha Couto estava lá naquelas primeiras turmas da Escola de Belas Artes, depois de ter estudado no Liceu, onde fez sua clientela. Pintava cenas bíblicas, santos e personalid­ades e foi um dos retratista­s que mais produziu em seu tempo. Seus retratos, feitos em ateliês desde a Ladeira da Conceição até Itapagipe, eram conhecidos pelo colorido e expressões dos personagen­s. Ele também foi um dos fotógrafos mais conhecidos na Bahia no final do século XIX.

A Casa Pia enviou para o ateliê sete telas, a maioria de provedores, um deles pintado por Cunha Couto, outros por mais nomes importante­s da época, como Vieira de Campos, Prescilian­o Silva, José Theófilo de Jesus e João Francisco Lopes Rodrigues. É a metade do número de quadros do IGHB, mas compensam em tamanho – têm mais de dois metros cada. Entre os retratados de lá está o Irmão Joaquim Francisco do Livramento, natural de Santa Catarina, que fundou a Casa Pia de Salvador.

SOCIEDADE VISUAL

Além da importânci­a para o momento histórico entre o final do século XIX e o início do XX, os retratos ajudam a pensar como funcionava a sociedade da época. Ser retratado em um quadro era uma forma de ser legado para a posteridad­e – e nem todo mundo podia pagar por esse luxo. Por isso, ter um

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