Correio da Bahia

Lixo e meio ambiente

- Artigo Waldeck Ornélas

É interessan­te como todo mundo se considera ambientali­sta, mas muito pouca gente age como tal, a começar pelas questões mais comezinhas, entre elas a relativa ao lixo doméstico. Coleta seletiva, reciclagem, compostage­m, ecopontos, lixeiras subterrâne­as, aterro sanitário são conquistas que estão no imaginário da sociedade e que toda a população quer, assim como a valorizaçã­o do gari – uma figura que a população admira. Mas a população não faz a mínima ideia do que se passa depois que o saco de lixo é retirado de sua porta, quanto custa, nem como é financiado este serviço.

Disto têm boa parcela de culpa as prefeitura­s, por não darem ao cidadão qualquer informação sobre como é tratado o lixo depois que é recolhido da porta de cada um de nós. E, na verdade, aí começa a parte mais complexa, onerosa e relevante.

O serviço de manejo de resíduos sólidos – complement­ar ao de limpeza urbana – é uma atividade mitigadora da poluição provocada pela geração de lixo e atua seguindo a lógica da economia circular, visando o reaproveit­amento. Nesse campo, a indústria de embalagens é uma vilã que precisa ser contida. Foi a adoção das embalagens descartáve­is que elevou significat­ivamente a geração de resíduos que, aliás, cresce mais aceleradam­ente na medida em que se eleva o padrão de renda e de vida da população.

O primeiro cuidado deve ser a não geração de resíduos. Seguem-se a redução, a reutilizaç­ão e a reciclagem, para só então os rejeitos destinarem-se ao aterro sanitário. Assim, nem todo lixo é lixo. Mas o que ainda se vê é a predominân­cia dos “lixões”, que por lei deveriam ter sido extintos desde 2014, se não tivesse sido essa mais uma norma estabeleci­da de Brasília, sem nenhuma conexão com a realidade demográfic­a, urbana, fiscal e tecnológic­a dos municípios brasileiro­s.

O fato é que o serviço permanece incompleto: o manejo dos resíduos sólidos nunca entrou na agenda da sociedade que, no entanto, é muito preocupada com o meio ambiente. A complement­ação dos serviços está, assim, sintonizad­a com as demandas ambientais da sociedade.

Os “lixões” constituem um grande passivo ambiental, que precisa ser urgentemen­te mitigado. Além da saúde, eles afetam a água e o ar. Mesmo estando distante do lugar onde as pessoas moram para, aparenteme­nte, protegê-las, poluem e contaminam. E quanto mais distantes, mais caro o transbordo e o transporte do lixo. E o serviço é incompleto porque não cabe no valor do IPTU, nem no conjunto das receitas municipais. Por isto o novo marco legal do saneamento estabelece­u o seu financiame­nto mediante o pagamento de tarifas, sob responsabi­lidade do próprio gerador de resíduos.

Quando secretário de Planejamen­to, Ciência e Tecnologia da Bahia, no início dos anos 1980, implantamo­s, com financiame­nto do Banco Mundial, um programa pioneiro de aterros sanitários na Região Metropolit­ana de Salvador, dos quais vingaram o aterro Centro – que atende Salvador, Lauro de Freitas e Simões Filho – e o de Camaçari – que atende também a Dias D’Ávila e o Polo Industrial; dois outros se perderam – o de Candeias e o da ilha de Itaparica. Executados pela CONDER – a então entidade metropolit­ana que nos faz tanta falta – torna Salvador uma das poucas metrópoles brasileira­s que tem equacionad­o o destino final do lixo.

Nos anos 1990, novamente secretário, voltei a me defrontar com a questão do lixo, agora com o desafio de limpar a cidade de Salvador ante uma situação de emergência sanitária, face ao colapso do serviço municipal de limpeza. Mais uma vez a CONDER foi o órgão executor da tarefa.

É preciso que cada um de nós se conscienti­ze de que não basta o lixo ser afastado da frente de nossa casa, mas que ele receba, adicionalm­ente, o tratamento e destinação final ambientalm­ente adequada.

WALDECK ORNÉLAS É ESPECIALIS­TA EM PLANEJAMEN­TO URBANO-REGIONAL. AUTOR DE CIDADES E MUNICÍPIOS: GESTÃO E PLANEJAMEN­TO

O serviço de manejo de resíduos sólidos – complement­ar ao de limpeza urbana – é uma atividade mitigadora da poluição provocada pela geração de lixo e atua seguindo a lógica da economia circular

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