Correio da Bahia

RIVALIDADE CÍVICA COM A CARA DO BAIANO

Juntinhos Teve muita disputa e gozação, mas o clima de paz prevaleceu entre os eleitores

- Moysés Suzart REPORTAGEM mneto@redebahia.com.br

Um debate acalorado, mas amistoso. Afinal, o que ele gritou? Um carro tinha acabado de passar na seção de votação no Bahia British Club, proliferan­do um grito com um certo ruído. “Com certeza foi ‘fora, Bolsonaro!’” disse dona Eliane, cheia de adesivos do PT. “Não, minha senhora. Foi ‘bora, Bolsonaro’. Certeza”. E assim, bolsonaris­tas e petistas matavam o tempo na longa fila formada no local, debaixo de um sol que queimava o juízo, mas não tirava o espírito pacífico dos baianos. Uma rivalidade cívica que lembrou os tempos dos Ba-Vis de torcida mista e sem briga.

Adeptos de Bolsonaro de amarelo, Lulistas de vermelho. O que parecia um dia de receios, acabou sendo uma demonstraç­ão de apoio aos seus respectivo­s candidatos. “A maior bobagem do mundo ter medo de mostrar seu apoio. Lá em casa, eu sou Bolsonaro, mas minha mulher e filhos são Lula. Depois daqui, vamos almoçar, eu de amarelo, eles de vermelho. Claro, terá gozação, mas não passa disso”, garantiu seu Carlos, de 63 anos. “Mandei eles votarem em outro horário. Tudo tem limite, né”, brincou.

Na Barra, dois casais são amigos há 40 anos. Cavalcante e Regina são bolsonaris­tas e estavam com suas respectiva­s camisas da seleção brasileira. Já Lucinha e Léo estampavam o vermelho com o rosto de Lula. Votaram juntos e seguiram até o Shopping Barra para tomarem um chopp.

Cavalcante era o mais desconfiad­o. “Não quero papo, essa coisa de oba oba. Bolsonaro vai ganhar no primeiro turno, mas confesso que vi muita gente de vermelho”, disse Cavalcante, enquanto o amigo Leo tentava abraçá-lo para uma foto. “Me solte! Deus me livre tirar foto com você vestido assim”, disse Cavalcante. “Ele já está nervoso. O São Paulo dele perdeu ontem e hoje ele vai tomar outra porradinha”, denuncia Léo, que acabou tirando foto com a amiga e a esposa. “Eu sou bolsonaris­ta, mas meu marido exagera”, brinca Regina.

Já o médico André Souza tem motivos para se preocupar com a vitória de seu candidato. O homem não consegue fugir de uma aposta. Um amigo bolsonaris­ta quis apostar, ele aceitou. Outro primo rival chamou, ele casou. Resultado: 50 caixas de cerveja apostadas. São 600 latinhas em jogo. “Ou eu tenho um coma alcoólico, ou vou ter um prejuízo grande. Mas estou confiante, pelo que vi aqui na rua, está todo mundo de vermelho. Amanhã, as primeiras cinco latinhas são para eu tomar banho. Ainda teve um doido que apostou comigo que a diferença de porcentage­m entre os dois candidatos aumenta-se nas latinhas. Tenho cerveja até o fim do ano”, garantiu.

CLIMA DE PAZ

O clima geral foi de paz. Em pontos turísticos como o Farol da Barra e o Rio Vermelho, camisas do Brasil e vermelhos bebiam juntos, sem grandes problemas. Nas redes sociais, os memes ditavam as conversas de whatsapp. Os irmãos David e Fernanda Rocha trocavam figurinhas e memes no grupo da família. “Não quero nem ver esse sacana hoje. Mas, depois da apuração, acho melhor desligar o celular, vou sacanear ele a noite toda”, disse a irmã. “Essa maluca vai chorar a noite toda”, brincou David.

Sem comprovaçã­o de veracidade, uma suposta conversa viralizou. Um bolsonaris­ta teria gritado na fila “É 22, É 22”. Outro eleitor, supostamen­te do PT, afirmou que 22 (cm) era o tamanho do seu órgão genital, o que causou alvoroço nos mais assanhados da fila. Se foi verdade mesmo, talvez nunca saberemos. Mas demonstrou como foi tranquilo (e irônico) o dia de votação em Salvador.

Na rua Belo Horizonte, na Barra, um grupo de amigos fez um churrascão no passeio do bairro após a eleição. Entre eles, bolsonaris­tas e lulistas curtiam, gritavam e se divertiam. “Cara, temos que parar com isso de violência. Somos livres para votarmos em quem quiser, mas isso não pode tirar a amizade de ninguém. A gente tem que levar como uma final entre Bahia e Vitória. Vai ter a gozação, mas vamos beber juntos”, disse Luis, bolsonaris­ta, mas que não abre mão dos amigos.

Enquanto Luis falava, um carro branco com a bandeira do Brasil e plotado de Bolsonaro passou buzinando. Os lulistas gritaram, um deles chegou a mostrar o saco, até que a bandeirinh­a do veículo caiu no chão. Tensão? De forma alguma. O próprio petista do gesto obsceno pegou a bandeirinh­a, limpou, se aproximou do carro e entregou ao motorista. Ambos se cumpriment­aram, a vida seguiu. A Bahia, de fato, é outro nível.

Cara, temos que parar com isso de violência. Somos livres para votarmos em quem quiser, mas isso não pode tirar a amizade de ninguém Luis

Morador da Barra

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MOYSÉS SUZART Na rua Belo Horizonte, na Barra, bolso naristas e lulistas curtiram um churrascão no passeio após a votação
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MARINA SILVA Cada uma na sua, mas com as cores dos candidatos em primeiro plano

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