SANTO ANTÔNIO LOTADO DIVIDE MORADORES
“Bloquinho não, é blocão mesmo”. A frase poderia ter sido do gestor Eduardo Paes, que se irritou com o diminutivo usado nas redes sociais pela prefeitura do Rio de Janeiro. Mas quem corrigiu a reportagem foi um morador do Santo Antônio Além do Carmo. O bairro é um dos mais procurados no préCarnaval e ao menos 14 blocos gratuitos devem desfilar por lá até dia 19. A movimentação, no entanto, divide opiniões e moradores se questionam: há espaço para esse tanto de gente?
Não é novidade que blocos abertos ao público desfilem pelas ruas do Santo Antônio nos dias que antecedem o Carnaval, que começa na próxima quinta. O bairro é uma opção para quem curte a folia de um jeito mais calmo, sem o agito dos circuitos Dodô e Osmar. A questão é que, com o passar dos anos, os bloquinhos ganharam fama e recebem mais gente a cada ano.
Como o bairro não é um circuito oficial de Carnaval, não possui a mesma estrutura dos outros locais. Ordenamento de trânsito, instalação de banheiros químicos e pontos de revista são algumas das ações que organizam grandes festas e que não são feitas no Santo Antônio. Por isso, os moradores se preocupam com o grande contingente de pessoas.
“Aqui virou um circuito de Carnaval, mas não tem revista, não bloqueiam o trânsito, nada. Vira tudo uma zona e não tratam o Centro Histórico como deveriam”, critica a moradora Márcia Santana, 74, que vive há oito anos na Rua Direita do Santo Antônio, a principal do bairro. Ela lembra que muitos moradores são idosos, prejudicados pela dificuldade de mobilidade.“Seumidosopassar mal, não tem como uma ambulância chegar aqui porque fica tudo bloqueado de carro e de gente”, diz.
Moradores relataram à reportagem que o bairro começou a receber mais pessoas de fora desde que a telenovela Segundo Sol (2018), trama da Globo, foi ambientada por lá. Com a cidade cheia por conta das festas populares, em finais de semana comuns de janeiro já era difícil transitar de carro e encontrar mesas para se sentar nos bares e restaurantes das ruas mais badaladas.
Em 2020, no Carnaval prépandemia, o movimento foi intenso e a expectativa é que as ruas do Carmo lotem ainda mais no retorno da festa. Apesar de Márcia Santana não ser contra a folia e até dizer que vai aproveitar os blocos, ela cobra que haja mais infraestrutura. A prefeitura de Salvador foi questionada sobre como se dará a organização, mas não deu retorno. Para que os blocos desfilem, é preciso uma autorização da gestão municipal.
Aqui virou um circuito de Carnaval, mas não tem revista, não bloqueiam o trânsito, nada
Até quem nunca curtiu a festa no bairro tem planos de conhecê-la nos próximos dias. O comunicador Rodrigo Portela, 21, vem de Lauro de Freitas, onde mora, para acompanhar o bloco De Hoje a Oito, no sábado. Ele costuma frequentar os restaurantes e bares durante a baixa estação e vê com bons olhos a atenção que o Santo Antônio recebe. “Acho importante a visibilidade que a região recebe e o fortalecimento dos blocos de rua no Centro Histórico. O pré-Carnaval é um momento importante”, defende.
Enquanto quem curte a festa
Está virando um inferno porque as pessoas vêm para beber, deixar xixi e sujeira
Márcia Santana, aposentada
Mário Edson, fotógrafo
e vai embora só se preocupa em como voltar para casa, os moradores precisam enfrentar o dia seguinte. “Está virando um inferno porque as pessoas vêm para beber, deixar xixi e sujeira. Na festa do 2 de julho a porta da minha casa parecia um banheiro público”, relata o fotógrafo Mário Edson, 45. Para ele, o descaso é ainda maior já que o Carmo integra o Centro Histórico, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 1959 e declarado Patrimônio Mundial pela Unesco em 1985. “Falta um olhar mais apurado do poder público”, critica.