Correio da Bahia

Em defesa das vítimas inocentes

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Moradores da localidade conhecida como Inferninho, na avenida Cardeal Avelar Brandão Vilela, em Mata Escura, se reuniram na manhã de ontem para protestar nas ruas do bairro, depois que dois vizinhos, um vendedor ambulante e um pescador, foram vítimas de bala perdida. O vendedor morreu ontem, após ser socorrido por policiais militares e levado para o Hospital Roberto Santos. Já o pescador, identifica­do como Alberto de Jesus, 62 anos, tenta, aos poucos, assimilar o que aconteceu.

“Meu tio está traumatiza­do, porque ele é pescador e não tem como trabalhar ferido. Ele recebe um auxílio, mas a família fica de um jeito que eu não sei nem explicar.

Ficamos à mercê dos acontecime­ntos e o medo prevalece”, conta a sobrinha do idoso atingido na perna.

Alberto se dirigia à mercearia comprar temperos e tinha até deixado o ventilador ligado e a panela no fogo, em casa, na esperança de voltar rapidament­e com o condimento que faltava para seu jantar, segundo conta seu sobrinho, Ebert Santana. Esse, no entanto, também foi o momento em que a PM apareceu.

“Os policiais entraram no bairro para fazer a ronda que fazem sempre. Só que, nesse momento, meu tio tinha acabado de sair para a mercearia. E o outro rapaz tinha acabado de chegar do trabalho, foi em casa, deixou as coisas dele e saiu para tomar a cachacinha dele, que já é acostumado, também na mercearia. Foi então que os policiais entraram e viram um ‘indevido’”, detalha.

O sujeito em questão era um suspeito de envolvimen­to com o tráfico de drogas, já na mira da PM. Depois de ser identifica­do, testemunha­s contam que o homem correu e os policiais dispararam na tentativa de atingi-lo, mas acabaram acertando a cabeça do vendedor ambulante e a perna de Alberto. Os dois estavam de costas no momento em que foram surpreendi­dos pelos disparos. Eles teriam sido imediatame­nte socorridos pela PM.

Em nota, a Polícia Militar não confirmou a autoria dos disparos que atingiram os homens e disse que as vítimas foram encontrada­s por policiais acionados por populares. “No local, os policiais encontrara­m dois homens feridos, os quais foram imediatame­nte socorridos ao Hospital Geral Roberto Santos, onde deram entrada. Rondas foram realizadas a fim de localizar suspeitos, mas ninguém foi preso”.

Revoltadas com o caso, cerca de 80 pessoas se manifestar­am contra a violência policial no local e pela vida perdida de mais um trabalhado­r, mesmo com medo de possíveis retaliaçõe­s da PM. “Eles mandaram as pessoas ficarem caladas, não tirar foto e não gravar. Estamos com medo dos policiais”, relata um morador.

“É um sentimento de dor, porque as guarnições não têm respeito para chegar nos bairros pobres. Sempre chegam deflagrand­o vários tiros nos moradores e contam sempre a mesma versão, dizendo que foi confronto de facção. Isso tem que acabar, porque nós somos cidadãos de bem e pessoas honestas”, reclama outra moradora.

“Protestamo­s porque já é algo que vem acontecend­o há muito tempo. Conseguimo­s expressar o que precisávam­os. Todos os moradores estavam lá. Acho que se não fosse pessoa do bem, ninguém ia lá fazer protesto. Os policiais se referiram ao caso como sendo uma troca de tiros entre facções, mas como num confronto desse alguém ia sair para comprar tempero? Vamos continuar batendo nessa tecla, porque eles já chegaram atirando”, reitera Ebert.

De acordo com o Instituto Fogo Cruzado, só em janeiro deste ano houve 38 tiroteios durante ações e operações policiais em Salvador e Região Metropolit­ana (RMS). LARISSA ALMEIDA ORIENTADA PELA SUBEDITORA FERNANDA VARELA.

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