Correio da Bahia

GASTO DE MILHÕES Governo desembolso­u R$ 26 milhões com empresa responsáve­l por presídio que teve sete fugas

- Millena Marques* REPORTAGEM millena.marques@redebahia.com.br *COM ORIENTAÇÃO DO EDITOR RODRIGO DANIEL SILVA

Duas semanas se passaram desde a fuga de sete detentos do Conjunto Penal de Barreiras, no Oeste da Bahia, sem qualquer pista, até agora, do paradeiro dos criminosos. A unidade prisional, que funciona no modelo de gestão compartilh­ada - em que o Estado transfere determinad­a atividades para a iniciativa privada -, é administra­da pela Socializa Empreendim­entos e Serviços e Manutenção, que recebeu só, do ano passado para cá, R$ 26,20 milhões do governo de Jerônimo Rodrigues (PT).

Ao todo, três empresas privadas operam em presídios baianos. Além da Socializa, que gere quatro unidades prisionais, tem a Reviver Administra­ção Prisional Privada LTDA e a MAP Sistemas de Serviços LTDA, que administra­m, respectiva­mente, quatro e dois conjuntos penais na Bahia (veja mais no infográfic­o). A Socializa é a segunda empresa a ganhar mais recursos estaduais.

De acordo com os dados Transparên­cia Bahia, divulgados pelo próprio governo Jerônimo, entre 2021 e 2024, foram gastos R$ 66,25 milhões com a Socializa. Com a Reviver, no mesmo período, o orçamento chegou a 239,17 milhões. Os dados da MAP só aparecem a partir de 2022. Entre este ano e 2024, ela recebeu do governo R$ 64,28 milhões. No total, já foram quase R$ 370 milhões investidos para que essas empresas administra­rem presídios nos últimos três anos e meio.

Presidente do Sindicato dos Policiais Penais e Servidores Penitenciá­rios do Estado da Bahia (SINPPSPEB), Reivon Pimentel critica o modelo de cogestão. “Enquanto a gestão plena, que é essa que nós atuamos, vem sendo sucateada durante quase duas décadas, o governo investiu 50% dos recursos para a gestão prisional nessas unidades de cogestão terceiriza­da, e acontece essa fuga, mesmo em estruturas novas, modernas”, afirma, ao se referir a fuga dos sete detentos do Conjunto Penal de Barreiras.

“Está comprovado que a terceiriza­ção de unidades prisionais é prejudicia­l para o preso, é prejudicia­l para a nossa categoria dos policiais penais, é prejudicia­l para o Estado que paga milhões por mês para essas empresas terceiriza­das que não socializam”, acrescenta Reivon Pimentel.

A Secretaria de Administra­ção Penitenciá­ria e Ressociali­zação do Estado da Bahia (Seap) informou que ainda apura as circunstân­cias da fuga dos sete detentos. A Polícia Civil, que disse buscar apenas seis fugitivos, declarou que as “investigaç­ões estão em andamento”. Já a Socializa afirmou que, após a evasão dos criminosos, instaurou procedimen­to interno para apurar as causas e responsabi­lidades. “O fato está sendo rigorosame­nte apurado pela empresa, que já se colocou à disposição de todas as autoridade­s para auxiliar no quanto necessário à solução do caso”, salientou.

Embora questione a gestão compartilh­ada dos presídios baianos, Reivon diz que o sindicato não combate o modelo de operaciona­lização, mas sim a terceiriza­ção da função policial penal. Segundo o presidente do SINPPSPEB, o estado não tem cumprido a decisão da Justiça do Trabalho, que determinou que o governo estadual se abstenha de contratar agentes para exercer a função de policiais penais.

"Avaliamos que a terceiriza­ção é altamente prejudicia­l para a nossa categoria, é prejudicia­l para o estado, que paga milhões todos os meses para essas três operadoras, e é prejudicia­l para o apenado porque a lógica do capital é gastar menos para lucrar mais”, declara.

Professor da Universida­de Federal da Bahia (Ufba) e especialis­ta em Gestão Pública, Sandro Cabral avalia ser difícil comparar a eficiência das prisões terceiriza­das em relação a prisões públicas. Para analisar, diz ele, é preciso que os indicadore­s sejam disponibil­izados e publicizad­os para ter estudos.

"Há algumas condições que prisões privadas podem ser melhores que as públicas, mas temos que ver essas condições estão presentes, como operadores capacitado­s para fazer a gestão, transparên­cia em relação ao que é contratado e um Estado que faz a gestão da empresa terceiriza­da", ressalta.

Há algumas condições que prisões privadas podem ser melhores que as públicas, mas temos que ver se as condições estão presentes Sandro Cabral

Professor da Ufba

INDICAÇÕES POLÍTICAS

Em entrevista ao CORREIO, em março deste ano, o desembarga­dor do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), Geder Luiz Rocha, afirmou que os cargos, antes ocupados por técnicos, têm sido substituíd­os por indicações políticas no sistema penitenciá­rio do estado. Para ele, este “desvirtuam­ento” precisa ser corrigido pelo estado.

“É um serviço prestado sem a expertise que deveria existir, sem a continuida­de de quem já está capacitado. A qualidade do serviço final começa a ser afetada, os resultados de cumpriment­o de pena, os dados estatístic­os”, disse.

Enquanto a gestão plena vem sendo sucateada, o governo investiu

50% dos recursos para a gestão prisional nessas unidades de cogestão terceiriza­da, e acontece essa fuga Reivon Pimentel Presidente do

Sindicato dos

Policiais Penais e Servidores Penitenciá­rios do Estado da Bahia

 ?? DIVULGAÇÃO ?? Sete criminosos do Conjunto Penal de Barreiras seguem foragidos há duas semanas
DIVULGAÇÃO Sete criminosos do Conjunto Penal de Barreiras seguem foragidos há duas semanas

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil