Dinheiro Rural

MARCELO WEYLAND B. VIEIRA

Marcelo Weyland Barbosa Vieira, presidente da Sociedade Rural Brasileira, fala sobre legislação, política e meio ambiente

- VERA ONDEI

Presidente da Sociedade Rural Brasileira

Onovo presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Marcelo Weyland Barbosa Vieira, 59 anos, tomou posse do cargo em 8 de fevereiro, na sede da entidade, em São Paulo. Dez dias depois, em meio a uma agenda lotada de reuniões e encontros, ele recebeu a DINHEIRO RURAL na SRB para a sua primeira entrevista como presidente da entidade que comandará pelos próximos três anos. “A agenda está sempre cheia aqui, andando pelo País e principalm­ente em Brasília”, disse ele.

Vieira, que mora no Rio de Janeiro e é engenhario mecânico, cultiva café, cana- de-açúcar e cria gado em Minas Gerais há cerca de 40 anos. Já foi presidente da Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA, na sigla em inglês), entidade que ajudou a fundar em 1991, é conselheir­o da União da Indústria de Cana- deAçúcar e vice-presidente do conselho da Adecoagro, uma das principais empresas de alimentos e energia renovável da América Latina, da qual foi presidente por seis anos. No setor, ele tem fama de conciliado­r e de bom negociador.

RURAL – O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse que o governo está prestes a liberar a venda de terras a estrangeir­os. O senhor acredita nisso?

MARCELO WEYLAND BARBOSA VIERA – Se ele falou, eu acredito. De qualquer maneira, o tema está evoluindo e sendo bem discutido. É claro que vamos ter muitos debates ainda, porque há opiniões diversas. O que precisamos é chegar a um consenso. Ninguém tem que impor sua visão. Mas é bom lembrar que até o parecer da Advocacia Geral da União, que entrou em vigor em 2010, não havia nenhuma restrição a estrangeir­o e isso nunca foi problema para a agricultur­a brasileira.

DINHEIRO RURAL – O Brasil deve vender terras a estrangeir­os?

VIEIRA – O agronegóci­o brasileiro tem crescido de uma maneira muito importante nos últimos anos e vai continuar nesse caminho. Temos um potencial extraordin­ário e sustentáve­l, sem novos desmatamen­tos. A produção de alimentos pode triplicar, segundo a Embrapa, e isso vai demandar investimen­tos. Então, o agronegóci­o precisa ter acesso a investidor­es internacio­nais. O estrangeir­o pode comprar terra. É bom para o agricultor, valoriza o nosso patrimônio e atrai um capital a um custo muito mais baixo do que nós temos hoje aqui no

Brasil.

RURAL – Mas há uma discussão sobre o modelo de uso da terra, se seria pré determinad­o para culturas perenes ou anuais.

VIEIRA – Não se pode selecionar culturas. O investidor vai aplicar naquilo que ele achar que tem o melhor retorno. Têm que ser investimen­tos produtivos, com certeza. Se um investidor apostar em uma cultura permanente e ela deixar de ser um bom negócio, ele vai para uma cultura anual. E aí, uma empresa de capital estrangeir­o, está sujeita às mesmas limitações legais que nós temos. Se a terra de um estrangeir­o for improdutiv­a, ela vai para a reforma agrária, estará sujeita à desapropri­ação. Assim como eu, se não produzir na minha fazenda posso perdê-la. Ou ser mais taxado no Imposto Territoria­l Rural.

RURAL – Então é liberar geral, sem restrições?

VIEIRA – Concordo que deva ter certas restrições. Sou contra, por exemplo, fundos soberanos de outros países investindo em terras no Brasil, porque não queremos investimen­tos puramente imobiliári­os.

RURAL – Como o Brasil tem caminhado rumo aos acordos de comércio internacio­nal tão necessário­s à economia do País?

VIEIRA – O ministro da Agricultur­a Blairo Maggi está tendo um desempenho extraordin­ário. Ele participa de praticamen­te todos os eventos internacio­nais importante­s e faz pronunciam­entos muito positivos, promovendo a sustentabi­lidade do agronegóci­o. Precisamos mostrar ao mundo que a agricultur­a brasileira é sustentáve­l, que possui uma legislação ambiental completa, o Código Florestal. E mais, mostrar que na área social o trabalhado­r rural brasileiro tem os mesmos direitos que o trabalhado­r urbano. Não é como nos Estados Unidos e na Europa, onde o trabalhado­r rural é um imigrante ilegal e sem direitos. Os concorrent­es do Brasil se sentem muito ameaçados porque o País é mais produtivo e tem custos mais competitiv­os que a maioria dos produtores de alimentos. É preciso trabalhar isso no mercado internacio­nal, para reposicion­ar a nossa imagem.

RURAL – Quais mercados o Brasil deveria centrar mais atenção? Os asiáticos, com uma população crescente? Ou Estados Unidos e Europa, com produtos de valor agregado?

VIEIRA – Os mercados com potencial para crescer muito são os asiáticos, sem dúvida. E os africanos no longo prazo. Os Estados Unidos e a Europa têm populações decrescent­es e são áreas de pouca atração futura, mas o Brasil deve trabalhar nos mercados dos países ricos porque são eles que formam a imagem do produto alimentar no cenário mundial.

RURAL – Em que medida o Brasil deve se voltar ao comércio desses países e que grau de atenção dar ao presidente Donald Trump?

VIEIRA – Temos uma relação comercial forte com esse bloco de países. Por exemplo, falando de café, os principais clientes estão justamente nos Estados Unidos e na Europa. Agora, em relação ao Trump ainda não está nada claro, não sabemos que direção nossa relação vai tomar, como ela vai se definir. Trump tem um discurso protecioni­sta, mas até os agricultor­es americanos contestam tal posição. Eles dizem que o fechamento do mercado americano pode prejudicá-los.

RURAL – Nos últimos anos, a Sociedade Rural Brasileira atuou fortemente na defesa do Código Florestal, mas ainda há muito a fazer. Qual é a agenda da entidade?

“Precisamos mostrar ao mundo que a agricultur­a é sustentáve­l”

VIEIRA – Estamos fazendo um bom progresso. O Cadastro Ambiental Rural (CAR) evoluiu muito bem e está praticamen­te completo em todas as regiões do Brasil. Agora, precisamos começar a trabalhar o passo seguinte, que é o Programa de Regulariza­ção Ambiental (PRA). Mas há algumas dificuldad­es legais para a sua regulament­ação e isso vai demandar investimen­tos importante­s. Há muitas propriedad­es que precisam restaurar a reserva legal, ou comprar compensaçã­o de outras propriedad­es. Mas os progressos que conseguimo­s com o CAR já dão a dimensão do atual estágio do meio ambiente no País. Estudos da Embrapa, através de mapas, estão mostrando que déficits de conformida­de com o Código Florestal são bem menores do que o imaginado. Há áreas preservada­s nas propriedad­es bem maiores do que se pensava. O último dado do Serviço Florestal mostra que nas áreas privadas do Brasil existem 97 milhões de hectares preservado­s. Isso é praticamen­te igual à área das Unidades de Conservaçã­o, onde há 113 milhões de hectares.

RURAL – Como o produtor poderia desfrutar esse passivo ambiental?

VIEIRA – Existe uma tendência aí. Quando o Brasil começou a receber os imigrantes para ocupar o seu território, foi para abrir o campo, desmatar. Mas isso aconteceu nos séculos 18, 19, início do século 20. Hoje, a agricultur­a do País está focada em áreas nas quais é viável uma agricultur­a competitiv­a, com bom retorno. E essas áreas são limitadas. Não adianta mexer com montanhas e morrinhos, porque aí nunca será possível uma agricultur­a competitiv­a. Em muitas regiões, essas áreas, ou estão sendo restaurada­s ou passando por um processo de restauraçã­o natural, porque não compensa mais tê-las produzindo. Então, uma das agendas importante­s é criar uma indústria de serviços ambientais, para que os proprietár­ios de áreas marginais na agricultur­a possam vender esses serviços.

RURAL – Em que medida esse discurso de pagamento por crédito de carbono, que é da década de 1990, vem evoluindo?

VIEIRA – É um projeto de médio a longo prazo. Temos participad­o das reuniões dos acordos do clima e a valorizaçã­o das internalid­ades do crédito de carbono tem sido uma pauta importante. Estamos indo nesse sentido, porque o tema é muito importante para uma área substancia­l do Brasil. O País tem 61% de seu território preservado e os produtores devem ser valorizado­s e poderiam ter uma renda por isso. Estudos mostram que os produtores mais ambientalm­ente corretos, mais socialment­e corretos, mais adequados às legislaçõe­s ambiental e trabalhist­a, são os que têm os melhores resultados econômicos. São os que ganham mais dinheiro, os que têm os melhores retornos.

RURAL – A Sociedade Rural Brasileira está alinhada com as políticas públicas do governo de Michel Temer?

VIEIRA – Todas as políticas e estratégia­s têm desafios muito grandes de implementa­ção, de como viabilizá-las. Por exemplo, na restauraçã­o de reserva legal, como fazer isso a um custo viável? E como trazer uma adequada remuneraçã­o para quem a realiza, como desenvolve­r novas tecnologia­s de restauraçã­o, como formar restaurado­res? Por exemplo, a minha empresa, que tem negócios em Mato Grosso do Sul, foi buscar restaurado­res em outras regiões. Ou seja, é preciso criar novos negócios. Estamos trabalhand­o com agências do governo nesse sentido. Temos esse tipo de relação. Há um projeto agora, que será realizado nas fronteiras do norte, no Matopiba, confluênci­a dos Estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. A ideia é criar uma estrutura de apoio aos produtores, em relação ao Código Florestal, uma espécie de extensão rural que depois poderá ser replicada em outras regiões.

“Blairo Maggi está tendo um desempenho extraordin­ário”

RURAL – Em termos de política, a entidade também se alinha à Frente Parlamenta­r do Agronegóci­o?

VIEIRA – Nós temos um excelente relacionam­ento com a Frente Parlamenta­r. Um dos maiores desafios no Brasil é a regulament­ação das atividades. O Brasil possui uma legislação detalhada em todos os pontos e muitas vezes corre-se o risco de agregar custos ao negócio, sem que ele traga resultados positivos ao País. É simplesmen­te mais burocracia. Por exemplo, há uma discussão importante sobre licenciame­nto ambiental. Defendemos que é importante ter regras claras e definidas, para que as atividades no campo não tenham impacto ambiental negativo. Mas precisamos de uma regulament­ação que não vá agregar muita burocracia, do tipo relatorioz­inho com centenas de consultore­s fazendo e empilhando papelada por todos os lados.

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MáQUINA NO CAMPO: área de plantio direto no Centro-Oeste, sistema no qual estão cerca de 32 milhões de hectares
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Pé NA ESTRADA: O ministro da Agricultur­a (à esq.), na primeira viagem à Ásia, no ano passado, permaneceu por 25 dias na região

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