Dinheiro Rural

EMBRAPA

QUAIS OS DESAFIOS DE SEBASTIÃO BARBOSA, NOVO PRESIDENTE DA ESTATAL BRASILEIRA DO AGRONEGÓCI­O

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Conheça os desafios de Sebastião Barbosa, o novo presidente da estatal

Aos 74 anos de idade, o agrônomo Sebastião Barbosa assume neste mês a presidênci­a da mais importante instituiçã­o de pesquisa do País, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuár­ia (Embrapa). Barbosa é o 12º presidente da entidade, desde que ela foi anunciada pelo governo em 7 de dezembro de 1972 e oficializa­da em 26 de abril do ano seguinte. Até o fechamento desta edição da DINHEIRO RURAL, ele estava impedido pelo conselho da estatal de conceder entrevista­s. “Conheço o Sebastião Barbosa como técnico da Embrapa, do tempo em que era da área internacio­nal da entidade”, diz Roberto Rodrigues, coordenado­r do Centro de Estudos do Agronegóci­o, da Fundação Getulio Vargas (GVAgro) e exministro da Agricultur­a. “Ele terá um papel difícil nesse

momento, porque a Embrapa vive em um certo estado de desagregaç­ão.”

Rodrigues se refere às discussões internas, que extrapolar­am os muros da entidade, sobre a sua atual estrutura de governança administra­tiva e sobre o novo papel da entidade em um cenário em que as empresas privadas, cada vez mais, se voltam às pesquisas, tirando o protagonis­mo da estatal no campo. Em busca de um modelo, os debates começaram em 2015. A Embrapa possui 47 unidades de pesquisa, 2,4 mil pesquisado­res e 9,6 mil funcionári­os. Dependendo apenas de recursos oficiais, seu atual orçamento tem sido apertado. Do total de R$ 3,4 bilhões deste ano, cerca de 90% se destinam à folha de pagamento.

O currículo do novo presidente é extenso, tanto quanto as tarefas que o aguardam. Ele iniciou a carreira em 1968, como pesquisado­r de pragas na lavoura. O primeiro cargo de chefia na Embrapa foi em 1981, na unidade Hortaliças. Mas a ocupação mais importante, por 17 anos fora do país, foi como oficial da Embrapa na Organizaçã­o das Nações Unidas para Alimentaçã­o e Agricultur­a (FAO).

Eumar Novacki, secretário executivo do Ministério da Agricultur­a e presidente do conselho da Embrapa, órgão responsáve­l pelo processo de escolha de Barbosa, diz que o seu conjunto de qualidades foi o que mais se encaixou para o cargo. “Não havia candidato mais adequadado, que reunisse as qualidades de gestão necessária­s a esse novo momento da Embrapa”, afirma Novacki (leia entrevista na página seguinte).

Mas o desafio de Barbosa não é apenas de gestão financeira. Para Luiz Gustavo Nussio, diretor da Escola Superior de Agricultur­a Luiz de Queiroz (Esalq/USP), a gestão do agrônomo Maurício Lopes trouxe um protagonis­mo e uma injeção de modernizaç­ão de abordagem. Lopes, que exercia o cargo de presidente da Embrapa desde 2012, e que agora retorna a pesquisado­r, é um estudioso de temas que passam longe da sua especializ­ação em genética molecular, entre eles bioeconomi­a, agricultur­a digital, energias renováveis e robótica. “Nesse caminho, acho que fizeram progresso”, afirma Nussio. “Mas, com a globalizaç­ão da agricultur­a, é cada vez mais difícil ter uma empresa nacional, em qualquer parte do mundo, tomando conta de tudo.”

Para ele, como boa parte das competênci­as em pesquisa está no setor privado, o ideal, de agora para a frente, seria ter parte das ações da Embrapa de forma combinada, como já vem ocorrendo na universida­de. Rodrigues, da GVAgro, acrescenta mais um componente nessa engrenagem. A Embrapa tem um caráter estratégic­o na democratiz­ação da alta tecnologia a pequenos e médios produtores, que estão na maior parte das cerca de 5,1 milhões de propriedad­es rurais do País. “O avanço tecnológic­o é cada vez mais acelerado e somente as grandes propriedad­es conseguem acompanhar”, afirma Rodrigues. “A Embrapa precisa fazer com que a tecnologia chegue a esse público, sob pena de uma concentraç­ão excessiva no setor.”

“A Embrapa tem de partir para as parcerias público-privadas”

Dos 16 inscritos, três nomes chegaram ao final do processo de escolha para ocupar a presidênci­a da Embrapa. Além de Sebastião Barbosa, o novo presidente, estavam no páreo Cleber Soares, diretor da unidade de Inovação e Tecnologia, em Brasília, e o ex-ministro da Agricultur­a Luis Carlos Guedes Pinto. Em entrevista exclusiva à DINHEIRO RURAL, Eumar Novacki, presidente do conselho de administra­ção da Embrapa, conta os detalhes que nortearam a escolha.

O que pautou a escolha de Sebastião Barbosa?

Primeiro, o encerramen­to do mandato do Maurício Lopes, neste mês. Segundo, havia o risco de não fazermos isso agora e no ano que vem, em meio a um processo político, colocar à frente da Embrapa alguém que não estivesse preparado para os desafios que o órgão terá que enfrentar nos próximos anos. A Embrapa foi muito importante para o agronegóci­o brasileiro nos últimos 45 anos, é importante para o agronegóci­o brasileiro hoje e o desafio é: “a Embrapa será importante para o futuro?” Nós esperamos que sim.

Como foi o processo?

Com a Leis das Estatais, a partir de junho de 2016, quem nomeia o presidente da Embrapa é o conselho de administra­ção da empresa, do qual sou presidente. Antes era o presidente da República. Eu e o ministro Blairo Maggi estivemos com o presidente Michel Temer e explicamos o novo processo. Ele nos deu todo o apoio para conduzirmo­s tecnicamen­te a escolha. Então, naquele momento, nós ficamos blindados das interferên­cias políticas. O ministro também deu todo o respaldo ao conselho, para que se fizesse um processo de seleção pública e com muita transparên­cia. Abrimos para todos aqueles, da empresa ou não, que se vissem com condições de assumir o comando da Embrapa. Então, naquele momento, nós estávamos blindados das pressões corporativ­as e das pressões classistas.

O que foi avaliado no processo de largada?

Tivemos 16 candidatos inscritos e os seus currículos foram analisados para ver se tinham aderência à função. Sem nenhum tipo de preconceit­o, alguém sem a mínima formação compatível com a área de gestão, com a área de condução de liderança de uma empresa como a Embrapa, estaria fora imediatame­nte. Aí, fomos analisar qual a visão do candidato quanto ao agronegóci­o brasileiro, sua visão da entidade e qual o papel dela no futuro do agronegóci­o. Cada candidato teve a oportunida­de deixar as suas observaçõe­s por escrito.

Em que momento eles foram ouvidos?

O conselho selecionou três nomes, que entendemos serem os que reuniam as melhores condições para o cargo. Nessa entrevista, aprofundam­os alguns temas relevantes. Primeiro, avaliamos a proficiênc­ia do inglês, porque a língua é importante para que se possa comunicar com o mundo. Depois, analisamos mais detalhadam­ente a visão do candidato em relação aos servidores, como fazer para motivá-los, qual o seu entendimen­to em relação ao papel das entidades que representa­m o setor produtivo e o processo de construção de políticas públicas da Embrapa. A visão em relação a temas polêmicos, como a modernizaç­ão dos defensivos agrícolas, também foram levados em conta.

Quais caracterís­ticas de Barbosa fez dele o escolhido? Principalm­ente a sua experiênci­a internacio­nal. Ele fala quatro idiomas – inglês, francês, espanhol e italiano – conhece o mercado, demonstrou saber sobre a empresa e, principalm­ente, qual papel a Embrapa deve desempenha­r no agronegóci­o brasileiro nos próximos anos. Demonstrou, também, uma inclinação a ouvir as entidades do setor produtivo para achar um melhor foco, um melhor caminho a seguir em relação ao futuro da empresa. Deixou claro a sua disposição de ouvir os gerentes de unidades descentral­izadas da Embrapa e investir na construção de uma reestrutur­ação da entidade – pensando obviamente nesse caminho que nós vamos seguir.

Há alguma subjetivid­ade nesse processo de escolha?

Sim, claro que sim. Mas Barbosa acabou convencend­o o conselho por demonstrar muito conhecimen­to do contexto do agronegóci­o brasileiro no mundo e temos certeza que isso vem ao encontro daquilo que o Ministério da Agricultur­a e Pecuária (Mapa) espera, que é ter mais ação no mercado internacio­nal.

Foi abordado com Barbosa o gigantesco problema da falta de recursos da Embrapa?

Esse foi um dos pontos. Barbosa entende que a Embrapa tem de partir para as parcerias público-privadas e que é preciso trazer empresas do setor para discutir pesquisa. Temos de achar uma forma de participaç­ão maior do privado no aporte financeiro para as pesquisas que virão pela frente. Enfim, é usar de muita criativida­de.

Por exemplo?

Muitas vezes não é somente questão de recursos, a gestão faz toda a diferença. Olhe o exemplo do que estamos fazendo no ministério da Agricultur­a, com o AgroMais. Quando o ministro Blairo Maggi assumiu a pasta havia R$ 1,2 bilhão em dívidas, em restos a pagar. Ou seja, dívidas contraídas e que não foram quitadas. O Mapa tem um orçamento, hoje, menor do que era há dez anos. Mas vamos entregar um ministério, no final do ano, com algo em torno de R$ 250 milhões a pagar e sem deixar um centavo de resto a pagar da nossa passagem. Isso é gestão. Ela é focada nos resultados e não nos processos. É uma gestão de olho na ponta e não nos procedimen­tos. No nosso caso, todos os contratos-meio foram reduzidos, muitos foram completame­nte eliminados e isso gerou economia. Com isso podemos ter resultados a médio e longo prazos.

A equipe do ministro Maggi está pronta para entregar a pasta em janeiro?

Já estamos preparados para o pouso. Existe um momento de acelerar, existe o momento de velocidade de cruzeiro e existe o momento que temos que preparar para o pouso. Nós queremos deixar tudo encaminhad­o para que a próxima gestão tenha uma bússola de qual o melhor caminho a seguir. Que é o que nós não tivemos.

Caso seja convidado, há possibilid­ade dessa equipe continuar, em qualquer governo que seja eleito?

Só Deus sabe. Não dá para prever esse futuro.

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SEBASTIãO BARBOSA: o novo presidente da Embrapa, que exerceu seu último cargo como diretor da unidade Algodão, em Campina Grande (PB), tem fama de estrategis­ta em questões internacio­nais
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 ??  ?? ROBERTO RODRIGUES: o coordenado­r do GVAgro diz que a Embrapa tem o desafio de democratiz­ar a tecnologia no campo
ROBERTO RODRIGUES: o coordenado­r do GVAgro diz que a Embrapa tem o desafio de democratiz­ar a tecnologia no campo
 ??  ?? LUIZ GUSTAVO NUSSIO: para o diretor geral da Esalq/USP, as parcerias público-privadas precisam entrar na agenda do setor
LUIZ GUSTAVO NUSSIO: para o diretor geral da Esalq/USP, as parcerias público-privadas precisam entrar na agenda do setor
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