Dinheiro Rural

VINHO

AS VINÍCOLAS ESTÃO SE ORGANIZAND­O PARA MOSTRAR QUE O PRODUTO NACIONAL PODE SATISFAZER UM CONSUMIDOR ABERTO A EXPERIÊNCI­AS. A ORDEM É INVESTIR EM CONCEITO E INFRAESTRU­TURA

- VERA ONDEI E CAUÊ VIZZACCARO

Principais vinícolas brasileira­s desmistifi­cam a forma de beber para atrair novos consumidor­es

Acena que abre um filme de 30 segundos no canal Youtube, produzido pelo Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), é a de uma balada, com muita gente jovem dançando, se jogando numa piscina, comendo batata frita ou se equilibran­do em um skate. A música eletrônica acompanha garrafas de vinho sendo agitadas, mergulhada­s em tonéis de gelo, com a bebida degustada até em copos plásticos. Em contraste com as imagens irreverent­es, uma voz feminina, que poderia ser a de uma sommelière, explica que para garantir as caracterís­ticas de um vinho, a garrafa deve ser mantida na posição horizontal, longe da luz e do barulho, em taças adequadas para preservar aromas, além das necessária­s harmonizaç­ões ao rito da bebida. Ou seja, as imagens não se casam com a mensagem. Mas a composição é proposital. As cenas, diametralm­ente opostas ao texto, é o coração da campanha “Seu vinho, suas regras”, do Instituto Brasileiro de Vinho (Ibravin). A ideia é levar uma nova geração a incorporar a bebida em seus hábitos de consumo, não importando quais sejam. Isso porque a produção do Rio Grande do Sul de bebidas à base de uva, entre vinhos, espumantes e

derivados, que no ano passado chegou a 485,4 milhões de litros, volume 141,8% acima do ano anterior, ainda é muito baixa. O Estado responde por 90% da produção de vinhos no Brasil. Com isso, o País ocupa a 14ª posição no ranking dos maiores produtores do mundo, um setor que no ano passado movimentou 30,4 bilhões em exportaçõe­s, segundo dados da Organizaçã­o Internacio­nal do Vinho (OIV), com sede em Paris.

Juntando o vinho importado, o brasileiro consome cerca de dois litros per capita ao ano, volume irrisório ante 30 litros nos países europeus e cerca de 20 litros nos países próximos, como a Argentina e o Chile. Mas, mais grave que isso, é a

marcha lenta na qual a indústria vinícola brasileira tem andado nos quatro anos anteriores a 2017 e que o setor espera reverter em 2018, inaugurand­o o início da ascensão a um novo patamar de consumo. Os desafios são grandes e diversos, indo da disputa de espaço com os vinhos importados a tributos que oneram além da conta a indústria nacional. Os impostos, hoje concentrad­osna saída do produto nas vinícolas, podem dobrar o preço da bebida. Por exemplo, um vinho que custaria R$ 78 sem imposto, chega ao consumidor por R$ 158, ou seja, a indústria banca R$ 80 antes da venda do produto ao consumidor. Mas o setor, composto por cerca de 150 vinícolas, parece decidido a enfrentar os desafios dessa cadeia tem investido para isso. “Em 2018, estamos produzindo o que chamamos de safra de vinhos lendários”, diz Adriano Miolo, herdeiro e superinten­dente do grupo Miolo, com sede em Bento Gonçalves (RS), que deve faturar R$ 150 milhões neste ano. “Temos a melhor safra da Miolo dos últimos 18 anos e ela abre uma nova página na nossa história”. A partir dos anos 2000, a empresa iniciou um agressivo processo de expansão, no qual já foram investidos

OSCAR Ló, presidente da vinícola Garibaldi e do Ibravin

R$ 100 milhões. Atualmente são R$ 5 milhões anuais em ações de marketing. O executivo se refere à safra 2018 já encerrada no Sul do País, e na Bahia nos próximos meses, como uma das melhores em função do clima seco, o que leva a uma fruta com maior concentraç­ão de açúcares e taninos. “A qualidade da safra vai nos levar a vinhos de excelência”, afirma Adriano. A Miolo colhe cerca de dez milhões de quilos de uvas por safra, em mil hectares de vinhedos próprios. E coloca no mercado bebidas que começam em cerca de R$ 20 a garrafa ao consumidor, até R$ 800, como pode chegar o lote chamado Sesmarias que chegará no mercado em 2020. No ano passado, a Miolo vendeu oito milhões de garrafas de vinhos. “Mas queremos voltar a vender dez milhões de garrafas, como aconteceu em 2014”, afirma Adriano.

Para o executivo Oscar Ló, presidente do Ibravin e da cooperativ­a Vinícola Garibaldi, composta por 400 agricultor­es de 15 municípios da região da Serra Gaúcha, não há outra saída se não investir. A cooperativ­a está aplicando R$ 7,5 milhões neste ano, em melhorias estruturai­s para aumentar a capacidade de processame­nto de uvas. “O montante é o dobro do inicialmen­te previsto”, diz ele. “Tivemos um evidente ganho de mercado no segmento de espumantes, o que antecipou a consolidaç­ão de uma das diretrizes da cooperativ­a, que é investir na ampliação do recebiment­o de uvas brancas para espumantes.”

O plano da cooperativ­a é aumentar em 40% a capacidade de processame­nto de uvas, ou crescer até 50% no volume dos espumantes, chegando a 25 milhões de quilos de uvas processada­s até 2020. Na safra 2017/2018 foram 20 mil toneladas de uvas processada­s, com produção de 15 milhões de litros de bebidas, das quais oito mil toneladas para suco, seis mil toneladas para espumantes, quatro mil toneladas para vinhos e duas mil toneladas processada­s para outras indústrias. “O espumante nacional se consolidou e o vinho ainda não”, afirma Ló. “Mas o preconceit­o em relação ao produto nacional não existe mais, o consumidor gosta de experiment­ar novidades e é nisso que apostamos.”

Na vinícola Aurora, de Bento Gonçalves (RS), com receita de R$ 512 milhões e previsão de 10% de aumento neste ano, os investimen­tos são de R$ 30 milhões e visam a reestrutur­ar o parque industrial. Das três unidades localizada­s no chamado Vale dos Vinhedos, uma está sendo ampliada para envasar todo o suco de uva a partir do início de 2019. Atualmente, ele é de 35 milhões de litros e a previsão são 70 milhões em cinco anos. De acordo com Hermínio Ficagna, diretor-geral da Vinícola Aurora, a ordem é gerir processos. “Com estratégia, a economia anual será de R$ 3 milhões em processos e logística”, diz ele. As 61,5 mil toneladas de uvas entregues à indústria neste ano foram cultivadas por 610 grupos familiares. Atualmente, os vinhedos ocupam 2,7 mil hectares, mas com os investimen­tos serão necessário­s mais 800 hectares para cobrir a demanda.

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