Dinheiro Rural

AGROTÓXICO

Aprovação de novos produtos gera desinforma­ção e protestos de uma sociedade que exige transparên­cia

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Quando o agrônomo americano Norman Borlaug criou a chamada Revolução Verde, nos anos 1940, com uma agricultur­a de escala baseada na aplicação de agrotóxico­s, como se diz no Brasil – ou de pesticidas, como eles são chamados no resto do mundo –, não se imaginava que um dia haveria algum impasse no negócio. Afinal, a estimativa é de que essa revolução no campo tenha tirado da inanição até 1 bilhão de pessoas em meio século, levando Borlaug a ganhar o Prêmio Nobel da Paz, em 1970. Mas, nos dias atuais, caso ainda estivesse vivo (ele morreu em 2009, aos 95 anos), o agrônomo estaria no olho do furacão de uma discussão que envolve o homem do campo e toda a sociedade urbana e que tem sido cada vez mais radical: o que fazer com os agrotóxico­s? De um lado, produtos contra pragas e insetos continuam garantindo escala robusta e alimento barato. De outro, está em xeque a contaminaç­ão do ambiente e a morte de insetos importante­s na cadeia produtiva, como as abelhas. Nesse cenário, informaçõe­s desencontr­adas estão por toda a parte. Ao setor do agronegóci­o, só resta uma posição daqui para a frente: dar respostas. “A sociedade deveria estar interessad­a em novos registros de produtos menos agressivos ao meio ambiente e à saúde humana”, diz o agrônomo Gerhard Bohne, presidente da divisão agrícola da Bayer no Brasil. “São produtos menos tóxicos e que ajudam o produtor a colher mais.”

Levando em conta a tecnologia, não há dúvida de que, hoje, um carro, um smartphone ou uma televisão são infinitame­nte melhores do que aqueles de uma década atrás. Para os agrotóxico­s, essa percepção não acontece. Por isso, a gritaria por todos os lados sobre a aprovação de novos inseticida­s e herbicidas. O número mais alardeado na maior parte das notícias recentes dá conta de 236 aprovações somente no primeiro semestre deste ano. Nessa conta, estão os registros dos produtos formulados – aqueles na prateleira do comércio – e os registros técnicos – produtos que serão formulados pela indústria e posteriorm­ente colocados no mercado. Nessa dança de números, o dado correto para os primeiros seis meses deste ano são 93 produtos no comércio, com apenas uma nova molécula no mercado. As demais permissões já eram de produtos utilizados, os chamados agrotóxico­s genéricos. É como se na saúde humana outros laboratóri­os farmacêuti­cos, além dos atuais, entrassem na corrida pelo mercado de dipirona, um dos medicament­os mais utilizados para dor, embora sua bula advirta que ela pode causar distúrbios vasculares, de pele e rins, e compromete­r os sistemas imunológic­o e linfático. Em ambos os casos, é preciso usar com critério. “Essa concorrênc­ia resultará em menor custo ao produtor”, afirma Carlos Goulart, diretor do Departamen­to de Sanidade Vegetal e Insumos Agrícolas do Ministério da Agricultur­a, Pecuária e Abastecime­nto (Mapa).

FáBIO MOITINHO E VERA ONDEI

Segundo ele, é preciso, neste primeiro momento, deixar muito claro que a maior parte de produtos aprovados são genéricos. De acordo com dados oficiais, na história das regulament­ações de agrotóxico­s já foram aprovados 2.173 produtos formulados para serem usados no campo. Desse total, 48% já não são comerciali­zados por decisão das empresas. As atuais manifestaç­ões contrárias ao uso de agrotóxico­s ganharam corpo com o avanço do Projeto de Lei 6299/2002, de autoria do exministro da Agricultur­a e produtor rural, Blairo Maggi, quando ainda era senador. Apesar de ainda estar tramitando no Congresso, as atuais aprovações são um reflexo desse movimento. “Os produtos ficavam numa lista de espera de até 10 anos”, diz Goulart, do Mapa. “No caso dos que foram liberados, eles estavam na fila há cerca de 4 anos”.

Uma tentativa de mudar o que pensa boa parte do consumidor urbano sobre os agrotóxico­s seria mostrar para ele, por meio de fortes campanhas, como é caro todo o processo de proteção das lavouras e que passar da conta é como jogar dinheiro no lixo. No caso da soja, o Instituto MatoGrosse­nse de Economia Agropecuár­ia (Imea), de Cuiabá, calcula que de um investimen­to de R$ 3,9 mil para cada hectare cultivado com o grão, R$ 804 sejam gastos com a proteção da lavoura. O valor correspond­e a 20,4% do custo de produção da soja. O Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), de Piracicaba (SP), fez as contas do que esse custo representa para a produção em todo o País. Na safra 2016/2017, o gasto total foi de R$ 19,3 bilhões com os tratamento­s com agroquímic­os, o que correspond­eu a 16,5% dos custos totais do grão.

VOLUME GLOBAL Outra batalha dessa guerra é ganhar a luta do volume total versus o volume por área. De fato, é correta a informação de que Brasil internaliz­a o maior volume global de agrotóxico­s. Anualmente, são usados no mundo cerca de 2,5 milhões de toneladas, das quais cerca de 540 mil toneladas (quase 22%) são no Brasil, de acordo com o Ibama. Mas também é fato que a conta de volume por área aplicada derruba essa posição para o 13º lugar, atrás de países como Japão, Alemanha, França, Itália e Reino Unido, de acordo

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Tarefa de casa “A sociedade deveria estar interessad­a em novos registros de produtos menos agressivos ao meio ambiente e à saúde humana ”, diz Gerhard Bohne, da Bayer
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