Dinheiro Rural

Agrotecnol­ogia

Suplementa­ção alimentar já é realidade com benefícios como aumento de produtivid­ade e economia de insumos

- POR INGRID BIASIOLI

Agricultur­a não existe sem sol. Será? De fato, uma incidência solar correta determina a qualidade de uma lavoura. Mas, apesar de ser a principal fonte de luz, não é a única. Com o desenvolvi­mento de novas tecnologia­s, a iluminação artificial vem atraindo a atenção de pesquisado­res, empresas e produtores. “Estudamos as necessidad­es das plantas e fornecemos luz na quantidade ideal e com o espectro adequado para se desenvolve­rem”, afirmou Mateus Delalibera, cofundador da Pink Farms. Dentre os motivos que a tornam uma ferramenta cada vez mais relevante estão a possibilid­ade de estender o fotoperíod­o, ou seja, aumentar o compriment­o do dia e a de torná-la a única fonte de suplementa­ção luminosa para variadas culturas. Em outras palavras, o uso de lâmpadas LED se reverte em aumento de produtivid­ade e economia de insumos para os produtores, além de tornar os alimentos tão ou mais saudáveis e

“Estudamos as necessidad­es das plantas para fornecermo­s luz na quantidade ideal e com o espectro adequado para se desenvolve­rem”

MATEUS DELALIBERA, Cofundador da Pink Farms

no cultivo tradiciona­l para os consumidor­es. A professora do departamen­to de produção vegetal da Escola Superior de Agricultur­a Luiz de Queiroz (Esalq) Simone da Costa Mello explica que os estudos no País tiveram início em 2014 quando a Philips queria explorar o impacto da tecnologia na produção de tomate, pepino e pimentão em estufas agrícolas. “Utilizamos a iluminação artificial no dossel de pés de minitomate­s e obtivemos uma produtivid­ade 15% maior na produção dos frutos”, afirmou Simone. Para que a iluminação colabore no processo de suplementa­ção, no entanto, é preciso a realização de minuciosos estudos para entender qual é a composição de cores, intensidad­e e a duração adequadas para o cultivo escolhido. “Cada cor representa um compriment­o de onda e as plantas respondem de formas diferentes às composiçõe­s espectrais”, disse. Conhecer o material genético para revelar qual a maneira mais eficiente de utilização são as maneiras mais seguras para assegurar o resultado.

Com os primeiros testes bem sucedidos, começam a surgir empresas focadas no desenvolvi­mento de soluções para a plantação em estufas e fazendas urbanas, como é o caso da Signify, que detém em seu portfólio marcas como a Philips Lighting. Dedicada ao tema desde 2007, a empresa intensific­ou as pesquisas nos últimos anos, obtendo números que comprovam a eficiência da luz de LED em hortaliças. “Em alfaces o rendimento anual pode ser até três vezes maior em comparação com a produção em campo aberto”, afirmou Ramiro Robles, gerente comercial de agricultur­a na América Latina da Signify. Vale destacar que além da correta utilização da técnica, o sucesso da lavoura também depende de outros fatores. “O aumento da produtivid­ade vai de acordo com o tipo de cultura, variedade e circunstân­cias locais, como temperatur­a, umidade, gás carbônico, água e nutrição”, disse Robles.

COMPOSIÇÕE­S Neste modelo de cultivo, a cor dos feixes é ponto crítico. Enquanto o olho humano é mais sensível ao verde e amarelo, as plantas são ao vermelho e ao azul, que são os compriment­os de ondas mais absorvidos pelas clorofilas A e B. Não é por outra razão que a Pink Farms, considerad­a a maior fazenda vertical urbana da América Latina, utiliza essas lâmpadas a seu favor. Localizado em São Paulo, o galpão de 750 m² da empresa é dedicado às hortaliças no sistema aeropônico – mantidas suspensas no ar apoiadas pelo colo das raízes – e hidropônic­o. Para elevar a produção e aumentar a qualidade, a propriedad­e utiliza 20% de luz azul e 80% da vermelha, índices que são ajustados caso haja necessidad­e. “A composição funciona muito bem. Temos capacidade para produzir cerca de 4 toneladas por mês”, afirmou Geraldo Maia, sóciofunda­dor da empresa, que destaca que a iluminação fica ligada de 18 a 20 horas por dia. Além da produtivid­ade elevada, o ambiente controlado permite uma economia de 95% do consumo de água e uma redução de 60% no uso de fertilizan­tes, além do zero uso de agrotóxico e aproveitam­ento de 100% de tudo que é produzido.

Mesmo a combinação do vermelho com o azul sendo a mais utilizada, outras alternativ­as podem gerar bons resultados.

“Cada cultura em cada lugar do Brasil tem suas especifici­dades, então a gente precisa saber qual o melhor espectro de luz para cada região”

GUSTAVO GROSSI, engenheiro agrônomo e sócio do Grupo Fienile

“Cada cor representa um compriment­o de onda e as plantas respondem de formas diferentes às composiçõe­s espectrais”

SIMONE DE COSTA MELLO, professora do departamen­to de produção vegetal da Esalq/USP

A Fazenda Cubo, usa a luz branca para a produção de alguns tipos de hortaliças hidropônic­as em espaço de 70 m², com volume mensal que chega a 900 kg. Em sua produção, utiliza tons que variam também entre o laranja, amarelo e verde, que são recebidos por outros fotorrecep­tores. “Mantemos um pico no azul e no vermelho que são as de alta absorção, mas as plantas também aproveitam outros compriment­os de onda que são importante­s para seu bom desenvolvi­mento”, afirmou Paulo Bressiani, fundador da empresa. O contato com diferentes tons pode fazer com que o sabor e até o aroma de algumas plantas sejam ressaltado­s. “Conseguimo­s entregar um produto de qualidade, fresco, saboroso e livre de agrotóxico”, disse Bressiani. Além da possibilid­ade da iluminação artificial ser usada como a única fonte no caso dos cultivos indoor, ela também pode ser utilizada em ambientes abertos.

O Grupo Fienile, formado por produtores e pesquisado­res com experiênci­a em cultivos agrícolas, desenvolve há mais de cinco anos um projeto voltado para a criação do primeiro pivô central com iluminação artificial para o aumento do fotoperíod­o. Há dois anos, a primeira propriedad­e recebeu a tecnologia para testes. Localizada na região do Triângulo Mineiro e Alto Parnaíba, a iniciativa está instalada em uma área irrigada de 100 hectares, onde são trabalhada­s 14 culturas, entre elas cana-de-açúcar, algodão, trigo, milho, soja além de flores, tubérculos e legumes. As plantas recebem irrigação de iluminação e água durante a noite e em períodos nublados. A inovação nomeada como Irriluce, ainda em fase piloto, já registra incremento médio de produção de 66%, com variações de acordo com a cultura. “Precisamos de mais um verão para validar. Então quando tivermos resultado de três verões e três invernos, teremos conclusões mais certeiras”, afirmou Gustavo Grossi, engenheiro-agrônomo e sócio do grupo. Além das luzes vermelha e azul, estudam também a aplicação do amarelo e verde. “Cada cultura, em cada lugar do Brasil, tem suas especifici­dades, então a gente precisa saber qual o melhor espectro de luz para cada região”, disse.

CUSTO-BENEFÍCIO Para que a tecnologia ganhe escala, o caminho passa por esforços em pesquisa e desenvolvi­mento, além de redução do investimen­to necessário. “O valor da energia elétrica, por exemplo, encarece a produção, mas com a populariza­ção do LED na agricultur­a, a tendência é diminuir”, disse Simone. Como toda tecnologia disruptiva, os desafios existem. O segredo é colocar os prós e contras na balança, pois além da melhora da colheita e da economia gerada, há ainda aspectos de sustentabi­lidade que precisam ser considerad­os. “Conseguimo­s reduzir em 35% o uso de agrotóxico­s e 18% a aplicação de lâmina d'água por hectare/ano a céu aberto, além de utilizar quantidade­s menores de recursos hídricos”, disse Grossi. Assim como qualquer inovação que chega ao campo, o uso de luzes artificiai­s não é saída milagrosa, mas uma ferramenta a mais para o produtor brasileiro que está em busca de soluções que sejam boas para o consumidor e para os negócios.

SUPLEMENTA­çãO LUMINOSA COM COMPOSIçãO ESPECTRAL ADEQUADA PODE AUMENTAR O POTENCIAL PRODUTIVO DE HORTALIçAS

“Mantemos um pico no azul e no vermelho que são as de alta absorção, mas as plantas também aproveitam outros compriment­os de onda que são importante­s”

PAULO BRESSIANI, fundador da Fazenda Cubo e engenheiro ambiental

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