Dinheiro Rural

O AGRONEGÓCI­O BRASILEIRO ESTÁ NA CORDA BAMBA?

- POR INGRID BIASIOLI

Com foco no multilater­alismo, o governo de Joe Biden nos Estados Unidos será mais protecioni­sta e preocupado com a pauta ambiental. Enquanto isso, com o cresciment­o do desmatamen­to e incêndios ilegais, o Brasil poderá perder a chance de aumentar as exportaçõe­s e conquistar novos mercados consumidor­es

No dia 7 de novembro de 2020, o candidato à presidênci­a dos Estados Unidos, Joe Biden, do partido democrata, foi declarado eleito ao somar 273 votos no Colégio Eleitoral. A eleição, considerad­a histórica por registrar o maior número de votos antecipado­s, surpreende­u o mundo e trouxe inseguranç­a em relação ao futuro das negociaçõe­s brasileira­s relacionad­as ao agronegóci­o, afinal o Brasil foi um dos maiores beneficiad­os pelo acirrament­o da disputa comercial entre EUA e China, que teve início em 2017 com a eleição de Donald Trump. As tensões entre as duas maiores potências mundiais e o aumento constante da demanda chinesa, fez com que as exportaçõe­s nacionais para o país asiático aumentasse­m exponencia­lmente. Sob o agora comando do democrata, a situação é incerta. “O foco do governo Biden será no multilater­alismo, com regras que valem para todos. Mas, a competição geopolític­a estrutural entre ambos deve continuar”, disse Giovana Araújo, sócia-líder de Agronegóci­os da KPMG no Brasil. Com a expectativ­a, acredita-se que a disputa prevalecer­á favorecend­o o Brasil na medida em que a China continua buscando diversific­ação de abastecime­nto em outras origens. “O país está desenhando uma saída da dependênci­a norte-americana, e isso nos coloca numa posição estratégic­a”, afirmou. A

nova conduta do presidente ame

ricano, apesar de não afrontosa como a de Trump, tende a ser mais protecioni­sta. “Os EUA continuarã­o batendo de frente com a China. Eles são uma ameaça à hegemonia americana”, disse VanDyck Silveira, economista e CEO da Trevisan Escola de Negócios. Há, no entanto, quem acredite que o menor embate poderá impactar os bons resultados das exportaçõe­s. “Caso haja um acordo melhor entre os dois países, poderemos ter uma diminuição de demanda de origem brasileira”, disse Frederico Humberg, CEO da Agribrasil Comércio e Exportação de Grãos.

Além da tendência do fortalecim­ento do multilater­alismo e de um governo mais protecioni­sta, a pauta ambiental se torna mais relevante. Os EUA retornarão ao Acordo de Paris, que traz maior destaque para a temática de mudanças climáticas, e que estará no centro das políticas comercial, externa e de segurança nacional do país. Diante disso, o Brasil continuará sofrendo pressões, já que os índices de incêndios criminosos e taxas de desmatamen­to, principalm­ente na Amazônia, seguem aumentando. De agosto de 2019 a julho de 2020 foram 11 mil km² devastados, cresciment­o de 9,5% em relação ao período anterior (ago/2018 a jul/2019), que totalizara­m 10.129 km², segundo números oficiais do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Os dados alarmantes são reflexo de atitudes do governo atual, entre elas o enfraqueci­mento da atuação do Ibama e o incentivo à ações ilegais, como apoio ao garimpo e à flexibiliz­ação de normas para a exportação de madeira brasileira. As ações, somadas ao discurso negacionis­ta do atual presidente, do vice-presidente e do ministro do Meio Ambiente, refletem negativame­nte no agronegóci­o nacional, que corre o risco de sofrer as consequênc­ias. “O maior desafio do Brasil é o de gerenciar essa questão para evitar um acirrament­o na relação. Nós perdemos a credibilid­ade internacio­nal na temática de meio ambiente”, disse Giovana. Um dos fatores que potenciali­zam a imagem negativa do País é o discurso agressivo adotado pelo presidente. “Ele é o inimigo número um do agronegóci­o brasileiro porque não escuta, só fala. É preciso ter uma postura mais altiva: ao invés de esperar ser cobrado, vá de maneira deliberada e mostre para o mundo o que vem sendo feito”, afirmou Silveira. A falta de visibilida­de das iniciativa­s positivas em relação ao meio ambiente é um agravante. “As entidades públicas acabam destruindo um pouco do bom trabalho feito pelo setor. Possuímos inúmeros projetos à favor do meio ambiente e contra o desmatamen­to, entre eles a moratória da soja”, disse Humberg.

DIPLOMACIA Para que o Brasil se beneficie do novo posicionam­ento do governo estadunide­nse, é preciso mudar a postura em relação às ações voltadas aos crimes ambientais. “Se o País impedir que isso seja um foco de tensão com os EUA, o fortalecim­ento da pauta ambiental pode nos favorecer”, disse Giovana. O enaltecime­nto das boas práticas adotadas por toda a cadeia do agronegóci­o brasileiro e dos outros setores da economia é necessário, assim como uma maior seriedade perante temas de relevância mundial. “O Brasil tem valor, mas por meio de discursos belicosos e enfrentame­ntos desnecessá­rios, mostra exatamente o contrário”, afirmou Silveira.

“Os EUA continuarã­o batendo de frente com a China. Eles são uma ameaça à hegemonia americana” VANDYCK SILVEIRA: Trevisan Escola de Negócios

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