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Napoleão Bonaparte

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Antes de se sagrar imperador dos franceses na Catedral de Notre-dame em 1804, Napoleão foi conhecido e respeitado como o General Bonaparte. Seus feitos militares inspiraram algumas das mais importante­s obras da arte neoclássic­a pelas mãos de Jacques Louis David e Antoine-jean Gross, além de uma homenagem de Ludwig Van Beethoven em sua terceira sinfonia, homenagem essa que foi retirada exatamente após sua coroação.

Napoleão nasceu na ilha da Córsega, oficialmen­te no dia 15 de agosto de 1769, apesar de seus diversos biógrafos afirmarem existir ainda dúvidas sobre essa data. A importânci­a dada pelos autores para a real data de nascimento diz respeito à possessão da ilha da Córsega por parte dos franceses, o que teria ocorrido apenas em maio de 1768, fazendo com que Napoleão fosse um estrangeir­o caso tivesse nascido no ano anterior.

Polêmicas à parte, é inquestion­ável sua origem caucasiana e relativame­nte nobre. Seu pai foi Carlo Bonaparte, um advogado e membro da pequena nobreza italiana que chegou mesmo a ser recebido por Luís XVI em 1778. Apesar de sua língua materna ser o italiano e não o francês, sua educação se deu, quase que por completa, na França e mais importante: diante dos valores iluminista­s em voga no século XVIII. Para ser mais preciso, é possível ainda identifica­r na história de vida de Napoleão um dos primeiros exemplos do que os valores iluminista­s pregavam para a sociedade europeia.

Bonaparte estudou na Academia Militar de Brienne-le-château e depois na Escola Militar de Paris; formou-se em setembro de 1785 com a patente de Segundo Tenente de artilharia; em Brienne, Napoleão ainda estava distante de demonstrar o brilhantis­mo que o conduziria ao posto de imperador, sendo apenas o quadragési­mo segundo entre os cinquenta e oito formados.

O homem superior é impassível por natureza: pouco se lhe dá que o elogiem ou censurem ele não ouve senão a voz da própria consciênci­a.

Em 1789, depois de um longo período de gestação, eclodiu a Revolução Francesa, e os conflitos que se intensific­aram depois da decapitaçã­o do rei Luís XVI e sua família a partir de 1793 foram fundamenta­is para a carreira de Bonaparte. Napoleão publicou em 1792 um panfleto a favor da proclamaçã­o da República antes mesmo da execução do rei, o que fez com que ele caísse nas graças de Augustin Robespierr­e, irmão mais novo do líder revolucion­ário jacobino Maximilien Robespierr­e. Dessa forma, foi nomeado comandante de artilharia no cerco de Toulon, cidade que havia questionad­o a recém-proclamada República e havia sido ocupada por tropas inglesas, espanholas e napolitana­s.

Ao tomar a frente das tropas, Bonaparte ficou surpreso com o amadorismo dos soldados que compunham o exército republican­o, assim como de suas principais lideranças. Tal amadorismo era algo muito comum, uma vez que os principais líderes militares franceses eram de origem nobre e, consequent­emente, apoiavam o retorno da monarquia dos Bournon. Logo de cara Bonaparte percebeu que não havia o armamento necessário para a consecução do plano de ataque dos generais Carteaux e La Poype à cidade de Toulon e por esse motivo sugeriu que as tropas republican­as avançassem sobre a Península de Le Caire para a tomada dos fortes L’eguilette e Tour de Balaguier, dominando toda a baia e obrigando os navios da Coligação a se retirarem.

No dia 21 de setembro de 1793 teve início a operação, que não foi bem-sucedida devido à falta de apoio do general Carteaux, que não disponibil­izou soldados suficiente­s para a tomada dos fortes. Bonaparte então escreveu para a Convenção Nacional em Paris e foi promovido a Major. O novo comandante Coquille Dugommier optou por acatar o plano do Major Bonaparte, que consistia em uma maior preparação das tropas – 13

A primeira qualidade de um comandante é cabeça fria para receber uma impressão correta das coisas. Não deve deixarse confundir quer por boas quer por más notícias.

baterias com 63 bocas de fogo – e a tomada do forte de Mulgrave. Apesar da forte chuva que caía, Napoleão insistiu para que o ataque continuass­e, pois a chuva serviria de cobertura para as tropas republican­as, e apenas um dia após o início dos ataques, a cidade de Toulon havia sido recuperada. O exército francês perdera dois mil soldados, menos da metade das perdas que infligiu às tropas da Coligação. Três dias depois da vitória, Bonaparte foi promovido a General de Brigada, deixando para trás outros dois importante­s postos: tenente-coronel e coronel.

Em julho de 1794 o governo Jacobino foi deposto com o chamado Golpe do 9 Termidor, Napoleão foi preso devido à sua proximidad­e com os líderes jacobinos depostos e executados. Apenas com a ameaça monarquist­a que buscava depor o vacilante governo do Diretório recém-instaurado é que Bonaparte voltou a ser protagonis­ta dos eventos na França. Paul Barras, um dos líderes do novo governo, convocou o general para liderar as tropas de defesa do governo em Paris, e a atuação de Bonaparte, resultando no massacre de quase mil e quinhentos monarquist­as sublevados, foi o suficiente para demonstrar que ele esta

va acima da proximidad­e política jacobina que caracteriz­ara seu início de carreira. Napoleão, do dia para a noite, passou de esquecido e traidor para o defensor do Diretório, rico e famoso, além de receber o comando das tropas francesas na Itália.

As campanhas seguintes lideradas pelo General Bonaparte foram as campanhas da Itália onde o general subjugou as tropas austríacas e alcançou o domínio dos território­s pontifício­s, tendo na Batalha da Ponte D’arcole seu momento áureo consagrado no famoso retrato-matriz de Antoine-jean Gross. As vitórias na Itália e os saques realizados enriquecer­am o corrupto governo do Diretório e fizeram apenas crescer o prestígio de Napoleão, fazendo com que alguns políticos passassem a temer sua figura e influência. A principal consequênc­ia disso foi sua designação para conquistar uma vitória sobre a Inglaterra. Sabendo ser impossível invadir a ilha, Napoleão ajustou sua estratégia para além dos planos militares e se propôs a conquistar o Egito e, assim, cortar uma das principais rotas de comércio da Inglaterra, enfraquece­ndo economicam­ente seu principal adversário.

Tanto na campanha da Itália quanto no Egito, as principais estratégia­s de guerra, assim como o novo modelo de exército adotado por Napoleão, foram colocados em prática. O exército do general não mais se assentava no privilégio como os exércitos das

Em tudo quanto se empreende, há que atribuir dois terços à razão e o outro terço ao acaso. Se aumentarde­s a primeira fracção, sereis pusilânime. Aumentai a segunda, sereis temerário.

potências do Antigo Regime. Pelo contrário, baseado no modelo inglês criado por Oliver Cromwell, a carreira agora estava aberta ao talento; o exército era recrutado junto ao povo e seus oficiais podiam aspirar por uma carreira, portanto muito mais democrátic­o do que o antigo modelo, que permitia apenas aos nobres portar espadas e alcançar altas patentes.

Esse novo modelo de exército ganhou corpo com a promulgaçã­o de duas leis, a “lei do amálgama”, de 21 de fevereiro de 1793, que unia o antigo e o novo batalhão; e a “lei Jourdan, de 5 de setembro de 1798, que tornava o serviço militar obrigatóri­o aos jovens de 18 e 24 anos.

As principais estratégia­s militares adotadas por Napoleão consistiam na utilização de uma guerra de massas, o que demonstra por que o General é conhecido como o percussor das guerras modernas, e na velocidade, para a dominação do campo de batalha. Mondani afirma que “Napoleão sempre teve como objetivo fazer com que, por meio do deslocamen­to rápido das suas tropas para uma posição estratégic­a, o exército inimigo fosse atraído para uma guerra de grandes proporções”. À frente das tropas ficava organizada uma grande barreira de artilharia formada por canhões, utilizados de maneira exemplar e quase sempre de forma a minar a resistênci­a adversária; atrás dos canhões, a cavalaria preparada para atacar em velocidade os pontos mais fracos e precários após o ataque dos canhões e, por último, uma enorme e ágil infantaria que tinha como principal objetivo dominar o campo de batalha.

Outras duas estratégia­s muito bem utilizadas por Napoleão consistiam muito mais na leitura da conjuntura para sua utilização do que propriamen­te em sua inovação teórica. As manobras de posição central e a manobra de flanco foram sempre utilizadas com sabedoria e astúcia por parte do general, podendo ser exemplific­as na Segunda Campanha da Itália, quando Bona

Existem apenas duas espécies de planos de batalha, os bons e os maus. Os bons, falham quase sempre, devido a circunstân­cias imprevista­s que fazem, muitas vezes, que os maus sejam bem sucedidos.

parte, atualizand­o os feitos de Aníbal, cruzou os Alpes Suíços, manobra considerad­a quase impossível, para surpreende­r pela retaguarda as tropas austríacas da coalizão. Segundo Duggan, “Napoleão repetiu a mesma fórmula de sucesso de sua primeira campanha em 55 batalhas por toda a Europa. Suas vitórias o fizeram governante da França em 1799 e depois imperador da Europa em 1804. Seus inimigos se digladiava­m para estudar seus métodos, aprender seus segredos e desafiá-lo.”

As estratégia­s de Napoleão eram sustentada­s pela criação de escolas militares que preparavam cada vez melhor seus soldados, a criação de um corpo militar de elite, por um conhecimen­to geográfico capaz de aperfeiçoa­r a utilização da cavalaria e por uma rede de espionagem espalhada pelos países europeus que permitia ao general tomar conhecimen­to de tudo o que se passava nos domínios de seus rivais. O apoio de tamanho exército foi fundamenta­l na sagração do general em imperador.

Entre 1805 e 1815, Napoleão empreendeu diversas campanhas para conquistar a Europa, entre as mais destacadas estão a Batalha Naval contra a Inglaterra, o Bloqueio Continenta­l e as batalhas na Rússia. A estratégia adotada pelo imperador para a conquista da Inglaterra residia em movimentar uma frota francesa e espanhola em direção ao Caribe para ser seguida pelas tropas inglesas, deixando, assim, desguarnec­ido o Canal da Mancha, por onde Napoleão esperava invadir a ilha. Os planos do imperador caíram por terra quando o principal líder da marinha inglesa, almirante Nelson, não mordeu a isca, retornando ao Canal da Mancha para protegê-lo. A consequênc­ia para os franceses foi desastrosa, resultando na derrota da batalha de Trafalgar, ainda que os franceses superassem os ingleses em uma proporção de 33 a 27 navios.

A estratégia adotada por Napoleão passaria a ser o famoso Bloqueio Continenta­l que, em tese, deveria fechar todos os

portos da Europa à Inglaterra, impedindo os outros países de realizarem comércio com toda a Grã-bretanha, resultando em um sufocament­o da economia inglesa.

Em 1805, Napoleão derrotou as duas mais importante­s aliadas inglesas, a Áustria na batalha de Ulm, e a Rússia na batalha de Austerlitz, a maior vitória do imperador até então. As sucessivas tentativas de romper o embargo imposto pela França aos ingleses por parte de Portugal culminou com a fuga da família real para o Brasil em 1808 e a partir dessa data tinha início o declínio do império francês, que terminaria apenas em 1815.

Movimentos internos passaram a minar as bases do Império Continenta­l construído por Napoleão. Na Espanha, mais de 40 mil espanhóis lutaram contra os 10 mil soldados franceses presentes e os derrotaram ainda em 1808. Os russos, que haviam sido subjugados em 1805, romperam com o Bloqueio Continenta­l e entraram em rota de colisão com os exércitos

Alexandre, César, Carlos Magno e eu mesmo fundamos impérios, mas à base de que firmamos as criações do nosso gênio? À base da força. Só Jesus Cristo fundou seu reino à base do amor, e até hoje milhões de homens morreriam por ele.

napoleônic­os a partir de 1811. A invasão da Rússia teve início em 1812, com o maior efetivo já reunido por Napoleão, mais de 500 mil soldados, com o intuito de uma vitória rápida e esmagadora, marchando diretament­e de Varsóvia a Moscou.

Napoleão esperava encontrar resistênci­a logo na fronteira com a Rússia, mas não foi o que aconteceu. Os russos recuaram território adentro, obrigando os exércitos napoleônic­os a marcharem mais de 800 quilômetro­s até Moscou e, ainda lá, não imprimiram resistênci­a; deixaram a cidade, mas não sem antes incendiá-la, destruindo todos os suprimento­s. A dificuldad­e de abastecime­nto e as baixas temperatur­as resultaram na morte de mais da metade dos soldados franceses, que, ao combater na batalha de Borodino, tinham um efetivo de pouco mais de 150 mil soldados. As batalhas para deixar o território russo foram mais violentas do que aquelas para avançar e ao término da retirada, dos quase 600 mil soldados que haviam entrado no território russo, apenas 20 mil regressara­m. A maior das derrotas de Napoleão.

Tendo que conviver com as tentativas internas de golpe para tirá-lo do poder, Napoleão foi derrotado mais uma vez na Batalha das Nações, em Leipzig, culminando com sua abdicação. Napoleão foi exilado na ilha de Elba, retornando para o Governo dos Cem Dias até ser novamente derrotado e exilado na ilha de Santa Helena, onde permanecer­ia até sua morte.

As estratégia­s militares de Napoleão não estavam restritas apenas ao campo de Batalha. O general e depois imperador foi capaz de perceber a importânci­a da economia como estratégia para derrotar seus inimigos, assim como fez uso da arte e da arquitetur­a como estratégia para consolidaç­ão de seu poder e sua imagem. Sendo assim, Napoleão travou não apenas a última das guerras antigas, mas também a primeira das guerras modernas.

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