OS BAIRROS DE BH ONDE O VÍRUS AVANÇA MAIS RÁPIDO
Dados da PBH apontam comunidades que tiveram alta de até 44% em casos e mortes pela COVID-19
De um lado, pessoas que se reconhecem vulneráveis diante da COVID-19, adotam medidas de proteção e saem às ruas apenas para o mínimo indispensável. De outro, as que, passado mais de um ano de pandemia, esquecem a prevenção, dispensam a máscara e ignoram o distanciamento. Entre essas duas atitudes, bairros onde o coronavírus mais avançou em Belo Horizonte, em número de casos e de mortes. Levantamento baseado em boletins da prefeitura indica que há comunidades na capital em que a doença registrou aumento de mais de 40% se comparadas as últimas semanas de janeiro e abril, quando terminou a vigência da onda roxa em BH. Nas ruas de alguns dos 18 bairros em que houve maior propagação da COVID-19, algumas atitudes parecem ajudar a explicar os números: pessoas caminhando sem máscara ou usando-a de forma inadequada e desrespeito às medidas de distanciamento no comércio e até mesmo no transporte público são situações rotineiras. A boa notícia é que, no período considerado, entre 179 bairros analisados, os números da pandemia permaneceram estáveis em seis e 155 apresentaram queda de casos e mortes, em um possível reflexo da vacinação. Especialistas sustentam que esse tipo de monitoramento é útil para direcionar medidas de prevenção e até de imunização.
Sentada em uma cadeira de rodas desde que a diabetes lhe custou a perna esquerda, a aposentada Adriana Soares, de 63 anos, viu aumentar ainda mais sua angústia desde que se instalou a pandemia do novo coronavírus, que a incluiu em grupo de alto risco. A sensação de amargura se agravou com as notícias incessantes de que ao seu redor a vizinhança do Bairro São Salvador, na Região Noroeste de Belo Horizonte, vem adoecendo de forma mais acelerada pela COVID-19. “A gente vai ouvindo as ambulâncias na porta das casas e fica sabendo que internou um ou outro. Minha melhor amiga, Maria Ilza Rocha, foi e não voltou. Ficou 12 dias internada e morreu com 52 anos. Outras pessoas simplesmente somem. Ficam em casa, isoladas. Como eu tenho de ficar também, para não morrer”, desabafa.
Apesar da consciência de muitos, exemplos de falta de cuidados e atitudes para preservar pessoas da epidemia saltam aos olhos no Bairro São Salvador e se traduzem na realidade descrita pela aposentada. A comunidade foi a que apresentou maior evolução de casos e mortes diárias confirmadas pela COVID-19, no comparativo entre as últimas semanas de janeiro e de abril, com um salto de 44% na progressão, segundo dados compilados pela reportagem do Estado de Minas considerando o Boletim Epidemiológico da Prefeitura de Belo Horizonte (veja quadro com bairros e regiões).
Esse acompanhamento observa as formas de monitoramento diário usadas pela Secretaria Municipal de Saúde (SMSA) para controle da doença em áreas da capital mineira e é uma ferramenta útil, segundo a professora Jordana Coelho dos Reis, do Departamento de Microbiologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), inclusive como forma melhorar a prevenção antes da vacinação dos grupos prioritários e potencializar os efeitos da própria imunização.
O levantamento teve o objetivo de descobrir onde a COVID19 mais progrediu em BH, separando as planilhas municipais de casos confirmados nos bairros que apresentaram mais de 10 diagnósticos durante a últiÉ ma semana de janeiro e, ainda, sob as restrições da onda roxa do Programa Minas Consciente, também na última semana de abril de 2021.
Ao todo, foram 179 bairros nessas condições. O São Salvador não se encontra isolado em ritmo acelerado de transmissão, sendo acompanhado de outros 17. Isso, em momento em que a maioria das áreas observadas registrou situação de controle, uma vez que seis estavam estabilizadas e 155 apresentaram queda de casos e mortes no período analisado.
De acordo com o levantamento, a Regional Nordeste foi a que reuniu mais bairros em alta, com sete, e um índice total de 22%. Já a Norte, com apenas o Bairro Juliana em ampliação, apresentou o índice desse bairro sem se diluir com outros, chegando a 27% de aceleração de casos e mortes, sendo assim a regional com fator mais inflacionado. Em seguida, com 23% de aumento, vem a Regional Leste, com três bairros, a Centro-Sul, também só com o índice do Sion, de 15%, a Noroeste e seus três bairros identificados, com 13%, e o Barreiro, também com três bairros e 11% de crescimento.
Para a professora Jordana Coelho dos Reis, a fase controlada observada na maioria dos bairros é uma evidência epidemiológica de que a vacina já está se traduzindo em redução de casos de COVID-19. “É algo que se pode conjecturar, justamente por ser o efeito já esperado, com desaceleração da epidemia dois meses depois de a imunização começar. Nos EUA, ocorreu até antes, porque se aplica a vacina a algo como 2 milhões a 3 milhões de pessoas por dia.”
Por outro lado, o levantamento mostra que é necessário obter condições de proporcionar mais isolamento, trabalhadores em home office e políticas de prevenção mais acentuadas, por ainda haver focos de transmissão. “Até para a estratégia de vacinação, é importante observar quais regiões ainda estão com casos se multiplicando. Depois dos pacientes prioritários e profissionais de saúde, esse indicador vai mostrar onde é preciso reforço de aplicações, para o controle local da pandemia”, avalia.
A PBH informou, por meio da Secretaria Municipal de Saúde (SMSA), que os dados de síndrome gripal e síndrome respiratória aguda grave disponibilizados no boletim epidemiológico assistencial e usados pela reportagem são alterados diariamente, e por isso têm um retrato fiel a cada momento consultado. “Sendo assim, as informações georreferenciadas por bairros de Belo Horizonte são referentes à atualização do dia de exportação, conforme descritos nas fontes das tabelas”, ponderou.
A administração da saúde municipal afirma que os dados auxiliam na programação de medidas de combates próprias e de órgãos como a BHTrans, a fiscalização, a Guarda Municipal, entre outros. “Nos bairros de maior número de casos, os profissionais das equipes de saúde das áreas de abrangência são orientados a aumentar o monitoramento dos pacientes, além de reforçar medidas de controle e prevenção como o distanciamento social, medidas sanitárias de higienização e uso de máscaras. A Secretaria Municipal de Saúde também troca informações com as demais secretarias para direcionar e amplificar as ações, conforme a necessidade epidemiológica.”