O QUE É PERMAESCRITA
Um dos ensaios mais provocadores é o que se intitula “Estranhos narradores”, porque é nele que Carola Saavedra (autora dos romances “Toda terça” e “Flores azuis”, este último premiado pela APCA em 2008) desenvolve o conceito de que é possível associar a permacultura – a ideia de uma harmonia entre plantas que considera não apenas a planta sozinha, mas a terra, vento, luz e animais que vão interagir com a planta, ou seja, é uma espécie de combo –, com um tipo de escrita ou literatura a que ela chama de maneira criativa de permaescrita, o que faz todo o sentido.
Ao mesmo tempo em que argumenta a respeito do que seria isso, a autora apresenta as demonstrações, com entradas de texto sob diferentes rubricas, em que menciona escritores, botânicos, experimentos com animais, história, a vida dos fungos, populações indígenas, na Amazônia ou na Austrália, num resultado que é ao mesmo tempo muito acessível e muito provocador. Impossível permanecer indiferente. “Tudo é colheita”, ela explica um conceito da permacultura. Aplicado no que seria a permaescrita, “podemos aceitar como parte da obra não somente tudo aquilo que nela é visto como sucesso: elogios, vendas, eventos, mas também aquilo que normalmente é interpretado como fracasso: críticas, esquecimentos, injustiças e até, podemos pensar, trechos descartados da própria obra, o que não se imprimiu, o que ficou de fora do livro. Ou um livro inteiro nunca publicado”.
Nesse sentido, um livro que algum escritor descarta antes mesmo de enviar à editora pode ser a colheita, porque talvez estimule a escrita do próximo, que pode ser a obra de algum tipo de virada. “A permaescrita talvez nos diga que cada livro não é um objeto em si, mas que ele também está inserido num sistema que inclui muito mais do que um único livro, muito mais do que um único autor”, ela escreve.
Que o ensaio seguinte a esse seja uma reflexão a respeito de subjetividades que não podem mais ser enunciadas quando se trata de escrever alguns livros é só a continuação natural da conversa.
SEM LIMITES
Mais para o fim, quando o leitor, ou leitora, como ela prefere (talvez porque o livro faz parte da coleção Nosotras, dedicada a mulheres ensaístas latino-americanas), está devidamente amaciada, ela apresenta o conceito em torno do qual vinha girando a prosa, numa espiral muito bem definida e que procura aproximar o centro das bordas, qual seja, o de literatura expandida: envolve despir-se de certos preconceitos