Aliança com Centrão na balança
Pilar de sustentação do governo Bolsonaro, partidos sofrem desgaste com postura dele, que gerou crise institucional. Apoio declina com perda de popularidade do presidente
Com frequentes crises, investigações de corrupção e polêmicas, o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) se mantém de pé graças ao Centrão. Em troca de cargos e prestígio político para se perpetuar no poder, esse grupo, formado por diversos partidos com identidades distintas, tem sido a base de sustentação do chefe do Executivo. À medida que a situação de Bolsonaro se complica, no entanto, o relacionamento, que resultou em Ciro Nogueira (PP-PI) – que já foi aliado do PT – na Casa Civil, parece ter os dias contados.
A pesquisa XP/Ipespe divulgada no último dia 17 mostrou que o ex-presidente Lula (PT) ampliou vantagem frente ao mandatário. O petista aparece com 40%, 2 pontos percentuais a mais que no levantamento anterior, enquanto Bolsonaro tem 24%, 2 pontos a menos que na última sondagem. Já a rejeição ao nome do presidente no pleito chegou a 61%, contra 45% de Lula. Somado a isso, o chefe do Executivo não tem conseguido dar prosseguimento a projetos prioritários do governo, como as reformas tributária e administrativa, em meio a uma escalada contra o Judiciário.
Aliados do governo já enxergam a gestão de Bolsonaro como uma canoa furada e ensaiam um desembarque rumo à candidatura do ex-presidente Lula (PT), que aparece em primeiro nas pesquisas de intenção de voto para 2022. Faltando aproximadamente um ano e dois meses para o pleito de 2022, a situação desses partidos começa a se definir e os políticos terão de decidir qual caminho será mais benéfico para eles eleitoralmente.
No caso de Ciro Nogueira, por exemplo, há a intenção de se candidatar ao governo do Piauí, estado nordestino com grande potencial de voto petista. Vale lembrar que o atual governador, Wellington Dias, é do PT. Não seria uma surpresa, portanto, se Nogueira ignorasse o fato de ser “a alma do governo” – como foi apelidado por Bolsonaro – e corresse para os braços de Lula.
O cientista político Cristiano Noronha, da consultoria Arko Advice, ressalta que, apesar do derretimento da popularidade do mandatário, há um timing para o Centrão decidir se mudará de lado ou se seguirá apoiando o governo, o que deve coincidir com o período eleitoral, no começo de abril do próximo ano.
No entanto, destaca, ainda não é de interesse do bloco deixar o governo. “Falta muito tempo até a eleição do próximo ano.
Em um segundo ponto, no Brasil vigorou o aspecto da verticalização, que condicionava as alianças no plano estadual e federal. Não há obrigação de obedecer à risca a coligação federal e isso cria a possibilidade de que tenham outro candidato em âmbito local se for conveniente para eles”, explica.
Mesmo que o Centrão apoie outro candidato em 2022, acredita, não significa que Bolsonaro ficará totalmente descoberto. “O Centrão não tem problema em apoiar um candidato à Presidência e, eventualmente ganhando outro, ele se associar. Existem tipos de abandono. Podem apoiar outro candidato, mas abandono não significa apoiar um impeachment, por exemplo”.
“Se o Centrão sair do governo, não necessariamente significa grande derrota, pois se Bolsonaro for reeleito eles poderiam voltar ao poder. Vão esperar o máximo que puderem. É uma decisão que será tomada só no ano que vem. Além disso, não é um bloco em que agem unidos. Pode ser que conte com o apoio de alguns partidos do Centrão em alguns estados. Creio que vão analisar e levar em consideração a característica local. Mas, claro, no âmbito federal o presidente não terá todos os partidos do centro compondo na chapa dele”, acrescenta.
O analista político Melillo Dinis, do portal Inteligência Política, destaca que a inconstância do chefe do Executivo é um cenário positivo para o Centrão, que aumenta seu preço, amplia os recursos e as manobras de captura do orçamento público e impõe maiores ganhos dos espaços de poder.
“Bolsonaro vive da colisão entre os poderes e a política e a submissão ao grupo. Neste zigue-zague permanente de tensões, Bolsonaro tem um projeto de reeleição e uma permanente tentação autoritária. O presidente não tem um partido para chamar de seu. Está sozinho no espectro partidário e ainda não conseguiu um que se doe inteiramente ao modelo que deseja. A estratégia da maioria dos atuais partidos é sobreviver aos limites da legislação, que exigem investimentos em bancadas e não em candidatos para o Executivo. Nessa linha, cada vez mais será necessário viver a solidão e a sofrência”, expõe.
Ricardo Caichiolo, cientista político do Ibmec-DF, afirma tratar-se de um cenário de negociações intensas entre os partidos, mesmo faltando mais de um ano para as eleições, envolvendo movimentações tanto por parte de Lula, de Bolsonaro, e da chamada “terceira via”. “Fica claro que os partidos do Centrão, mais uma vez, serão pragmáticos e apoiarão o candidato que apresentar a melhor probabilidade de se sair vencedor no ano que vem. Tanto que o Republicanos e o Progressistas procuraram o petista para costurar acordos regionais, impulsionados pelas recentes pesquisas que o apontam na liderança da corrida presidencial”, avalia.
O presidente está em uma situação delicada diante do cenário pandêmico, de inflação e crise hídrica, analisa. “A grande aposta para a reversão desse cenário eleitoral desfavorável a ele é que a economia cresça em um ritmo mais acelerado no último trimestre de 2021 e ao longo de 2022, o que parece improvável”. Diferentemente, o quadro que se pinta para 2022 é de um crescimento do PIB em torno de apenas 2%, combinado com um aumento da inflação e com uma taxa altíssima de desempregados.
Se o Centrão sair do governo, não necessariamente significa grande derrota, pois se Bolsonaro for reeleito eles poderiam voltar ao poder. Vão esperar o máximo que puderem
■ Cristiano Noronha, cientista político da Arko Advice