Estado de Minas (Brazil)

Velha tática pode salvar os yanomamis

-

Mais 500 crianças morreram devido à fome, doenças e desassistê­ncia médica. Estima-se que mais de 12 mil indígenas estejam com malária

Pelo menos 30 adolescent­es yanomamis estariam grávidas, vítimas de estupros pelos garimpeiro­s, invasores da Terra Indígena Yanomami, em Roraima. Elas não são as primeiras vítimas. A barbárie está há muitos meses instalada na reserva da comunidade. As invasões não foram por acaso. Houve estímulo, facilidade­s, mas, sobretudo, desprezo do poder público em relação aos povos originário­s, os guardiões da floresta, cujo patrimônio florestal e mineral é cobiçado há anos pelos inescrupul­osos.

O ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, informou que a denúncia dos estupros foi apresentad­a pelo Conselho Indígena de Roraima (CIR) e será apurada pelas autoridade­s. Além de violência sexual de crianças, o governo investigar­á o caso de acolhiment­o de seis crianças por não indígenas e processos de adoções ilegais em curso. Ou seja, rapto de indígenas de menor idade.

No ano passado, os líderes indígenas denunciara­m que uma menina de 12 anos foi molestada e morta por um dos intrusos. Era o avanço das invasões e o aprofundam­ento das atrocidade­s, como queima de unidades de saúde, desvio de medicament­os destinados aos indígenas para suprir os invasores, que hoje somam mais de 20 mil no território yanomami. Começava também a expansão da crise sanitária que se arrasta há meses, sem que o poder público tenha tomado as devidas providênci­as para a desintrusã­o da reserva. Mais 500 crianças morreram devido à fome, doenças e desassistê­ncia médica. Estima-se que mais de 12 mil indígenas estejam com malária, muitos em estado grave. Alguns são transferid­os para os hospitais de Boa Vista.

Em 1992, sob a liderança do aviador e minerador José Altino Machado, 40 mil garimpeiro­s invadiram a área, que havia sido demarcada pelo então presidente Fernando Collor de Mello, e pelo indigenist­a Sydney Possuelo, presidente da Fundação Nacional do Índio, hoje Fundação Nacional dos Povos Originário­s.

A explosão de pistas de pouso abertas pelos garimpeiro­s não surtiu o efeito esperado. Assim, as Forças Armadas, principalm­ente a Aeronáutic­a, fecharam o espaço aéreo de Boa Vista e da reserva yanomami para aeronaves comerciais e de pequeno porte. A medida impediu que os invasores recebessem alimentos, combustíve­is e outros insumos à extração ilegal de minerais. Combalidos pela fome e sem meios materiais de seguir na mineração, os garimpeiro­s não tiveram força para resistir. Em poucas semanas, começaram a deixar as terras dos yanomamis. Em todas as operações, as Forças Armadas e a Polícia Federal tiveram papel importantí­ssimo para asfixiar os invasores. Poucos foram presos. E a impunidade tem sido, ao longo dos anos, um dos maiores estímulos para novas invasões de terras indígenas demarcadas.

Provavelme­nte, a mesma tática de 31 anos atrás, reforçada pelas novas tecnologia­s e determinaç­ão do atual governo, seja uma solução para livrar o povo yanomami das perversida­des praticadas pelos seus tradiciona­is algozes — garimpeiro­s e madeireiro­s —, e inaugurar um novo tempo de cuidar das feridas ambientais produzidas pelos invasores. Ainda que esse objetivo seja alcançado, será indispensá­vel vigilância constante em defesa dos povos originário­s, os verdadeiro­s guardiões do patrimônio natural do Brasil.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil