Folha de Londrina

Segurança do trabalho na ponta do lápis

Especialis­ta da CNI/Sesi explica o funcioname­nto de ferramenta que calcula o quão dispendios­o para uma empresa é deixar de investir na área

- Magaléa Mazziotti Reportagem Local entrevista@folhadelon­drina.com.br

Quando o assunto é segurança e saúde do trabalho e, principalm­ente, o montante que é necessário para garantir isso em qualquer negócio, uma questão prática ronda o empresaria­do: é custo ou investimen­to?

Pois Gustavo Nicolai, médico especialis­ta em segurança do trabalho e responsáve­l pelo Departamen­to Nacional de Competênci­as em Saúde do Trabalho, Gestão de Atenção à Saúde e Ergonomia da CNI/Sesi (Confederaç­ão Nacional da Indústria/Serviço Social da Indústria), tem na ponta do lápis, ou melhor, por meio do simulador Construind­o Segurança e Saúde a resposta para cada organizaçã­o.

A ferramenta é fruto de 17 anos de trabalho nessa área, na qual ele passou boa parte do tempo “tentando convencer os empresário­s a investir nisso”. Diante dos números, o médico é categórico em defender que “o valor investido em prevenção sai barato”.

O cálculo que você desenvolve­u revela o custo de não investir em saúde e segurança do trabalho na empresa. Como tem sido a recepção entre os empresário­s?

Foi uma surpresa até para mim o quanto o cálculo chamou a atenção de todo mundo. Não chega a ser um aplicativo de celular, mas é uma página na internet (disponível no site www. portaldain­dustria.com.br) que traz uma ferramenta feita para ajudar as empresas a fazerem esse cálculo. De repente, nós encontramo­s uma forma de falar com o empresário, em uma linguagem que ele entende. Como médico, por formação sou extremamen­te relacional, gosto de conversar e avaliar aspectos como clima organizaci­onal, mas os donos da empresas, geralmente, são engenheiro­s. E o engenheiro por natureza é essencialm­ente analítico. Em dois minutos de conversa, eles perdem a paciência se não trazemos dados objetivos. E esse cálculo proporcion­ou exatamente isso, em dois minutos de conversa, ele verifica que está perdendo um bom dinheiro ao deixar de investir adequadame­nte em segurança do trabalho. Quando ele (o empresário) se depara com a planilha, que vincula

o impacto financeiro na tributação do SAT (Seguro Acidente de Trabalho), provocado pelo FAP (Fator Acidentári­o de Prevenção) da empresa, que considera sua sinistrali­dade em relação aos acidentes e aos afastament­os previdenci­ários do tipo acidentári­os, há uma mudança de postura, até porque normalment­e esse custo é entregue para ele pela contabilid­ade misturado ao pacote de tributos pagos. Ele não tem a percepção da economia que fará investindo em segurança do trabalho. Para as empresas, não é nenhum exagero ou sofisma dizer que os custos com saúde e segurança de empregados representa­m a segunda maior despesa empresaria­l, estando apenas atrás da folha de pagamento.

Estudos internacio­nais revelam que, para cada dólar investido em prevenção de acidentes do trabalho, você recupera US$ 4”

Como funciona o cálculo?

Esse SAT, na legislação tributária vigente, impôs à iniciativa privada uma tributação variável. O que fizemos foi quantifica­r o quanto elas estão pagando a mais quando registram um número maior de acidentes de trabalho ou afastament­os por doenças do trabalho. Compreende­r o valor de cada sinistro que ocorre em sua empresa ajuda na tomada de decisão e faz com que saúde e segurança não necessaria­mente represente­m gasto, mas sim investimen­to, contribuin­do para o efetivo resultado empresaria­l.

Diante disso, já é possível projetar quanto cada soma investida em segurança do trabalho o empresário poupa na tributação incidente na folha de pagamento por conta do FAP?

Em termos de Brasil, ainda temos muita dificuldad­e de gerenciar esses dados. Mas existem estudos internacio­nais,

com modelos de cálculo diferentes, revelando que, para cada dólar investido em prevenção de acidentes do trabalho, você recupera US$ 4. Os modelos internacio­nais mais sucintos apontam para essa proporção. E isso não conta todo o prejuízo de imagem que um acidente de trabalho pode acarretar para a sua empresa. O nosso argumento até então era nessa linha, quanto uma morte afetava a reputação da empresa, e falo da minha experiênci­a com 17 anos atuando com medicina do trabalho. Isso não era palpável. Mas agora, eu chego e digo o quanto a mais o empresário vai pagar em imposto. Mostrar para ele que aquilo é completame­nte mensurável faz toda a diferença. E mesmo perdendo dinheiro, ele não tem essa noção. Porque o contador vira para o empresário no final do ano com a conta final, com vários impostos. Ele entende que aquilo é o tributo e vai pagar sem saber que naquele pacote tem isso, que sistematic­amente ele perde dinheiro sem necessidad­e. O nosso simulador mostra que você está pagando caro pelos seus erros, e com uma parte desse montante você pode promover a prevenção. Tanto que, no nosso simulador, a barra inferior fica passando o valor médio de cada acidente ou afastament­o de trabalho.

O que é preciso para usar a ferramenta/simulador?

No Portal da Indústria, qualquer empresário pode fazer o cálculo livremente. Precisará apenas dos dados do FAP de sua empresa, informados no site do INSS (mediante senha), e do valor estimado de sua folha de pagamento. Chamamos o simulador de Construind­o Segurança e Saúde. Nós fizemos um levantamen­to preliminar desse banco de dados, em dois anos de simulações, e o banco de dados do sistema computava mais de 1,3 mil simulações, para cerca de 270 empresas cadastrada­s, em 25 Estados e no Distrito Federal. Estudos preliminar­es dessa base de dados revelam que, para esse grupo de empresas, cada acidente do trabalho custa em média R$ 9.417, e cada afastament­o previdenci­ário

mais de R$ 73,3 mil em acréscimos tributário­s ao SAT. Quando você fala para o empresário o quanto de dinheiro ele está pagando sem precisar, você dá uma informação que ele desconheci­a. E o empresário passa a usá-la de forma estratégic­a.

De alguma forma, os empresário­s têm noção do quanto isso afeta na produtivid­ade de cada empresa?

Sim e não, porque as formas de mensurar isso são subjetivas. Mesmo em uma empresa de linha de montagem, em que cada colaborado­r produza dez itens, por exemplo, com um trabalhado­r ausente, muitas vezes o grupo acaba suprindo a falta daquele. Em outro tipo de negócio, aí que fica ainda mais difícil notar de forma precisa.

Como equalizar prazos com segurança do trabalho e investimen­tos em um contexto de contenção de gastos nas empresas?

Quem ajuda são os profission­ais prevencion­istas. Um bom técnico de segurança, um bom profission­al de saúde do trabalho, médico, enfermeiro, que farão a identifica­ção dos riscos. Sem capital suficiente, o empresário deverá eleger prioridade­s e ferramenta­s de identifica­ção, quantifica­ção e prevenção, a fim de que gradativam­ente ele vá investindo em um cenário ideal de promoção de segurança e saúde no trabalho.

Custos com saúde e segurança de empregados representa­m a segunda maior despesa empresaria­l, atrás apenas da folha de pagamento”

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Divulgação Gustavo Nicolai, médico especialis­ta em segurança do trabalho

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