Tragédia acende alerta sobre bullying
Adolescente matou dois colegas a tiros e feriu outras quatro pessoas em escola particular em Goiânia na sexta-feira após ser vítima de chacota, segundo relatos. Especialistas ouvidos pela FOLHA destacam indícios de “reação extrema” e enfatizam necessidade
O sentimento de revolta provocado pelo bullying que o adolescente de 14 anos do oitavo ano sofria no Colégio Goyazes, em Goiânia, pode ter sido o gatilho desencadeador para que o estudante disparasse contra colegas de classe. A psicóloga e professora do Departamento de Psicologia Social e Institucional da UEL (Universidade Estadual de Londrina) Solange Maria Beggiato Mezzaroba afirma que o caso em Goiânia pode ser típico da pessoa que é vítima de bullying “por muito tempo”. “Existem vítimas de bullying que reagem dando chute e soco no agressor. Quando uma pessoa revida com arma é uma reação extrema, por estar cansado dessas agressões”, apontou.
Mezzaroba é doutora em educação e realiza um trabalho que enfoca o bullying em duas escolas de Londrina, do sexto ano do ensino fundamental até o ensino médio. “O bullying está muito presente em Londrina e é uma realidade que conheço. Fizemos pesquisa de índices e comparados com outros países os dados são quase os mesmos. Essa prática está bastante presente em vários lugares. O problema é que muitos adultos colocam o bullying como uma brinca- deira de mau gosto, mas na verdade isso deixa marcas na vítima, como o rebaixamento de autoestima e da autoconfiança”, explicou.
Conselheiro tutelar da zona norte de Londrina, Eliseu Euclides Barbosa de Carvalho destaca que na região onde ele atua existem alguns desses casos que chegam ao órgão. “Quando essas ocorrências chegam aqui são em situações extremas. Acontece da criança se ausentar da escola e a direção envia um comunicado avisando a gente. Ou então há casos de familiar da criança vítima de bullying que procura o conselho porque alguém está denegrindo a imagem do filho, na maioria das vezes por preconceito”, relatou.
Carvalho diz que os pais de vítimas dessas agressões demonstrando revolta, enquanto as crianças chegam “amedrontadas e humilhadas”. “O estado é de medo e impotência”, observou.
A professora Solange Mezzaroba não recomenda a repressão contra os agressores, com punições e repreensões, para acabar com o bullying. “Essas crianças e adolescentes muitas vezes vêm de locais onde os tratamentos são baseados na agressividade e tudo é resolvido na base da violência física e verbal. Se veem os pais lidando com os problemas de forma agressiva, acabam desenvolvendo uma taxa alta de agressividade. Ou então essas pessoas foram alvos de agressões”, explicou.
Mezzaroba destaca que, se a escola ou os pais aplicarem punições contra o agressor, ele pode se revoltar e revidar contra a vítima. “Em vez disso, a escola e os pais devem questionar se o agressor gostaria que o bullying fosse feito contra ele”, aconselhou.