Folha de Londrina

Justiça adia desocupaçã­o do Flores do Campo

A pedido da Defensoria Pública da União, desembarga­dor federal concedeu prazo de 90 dias para a saída voluntária das famílias

- Geral@folhadelon­drina.com.br Rafael Machado Vítor Ogawa Reportagem Local

Odesembarg­ador federal Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle, da 4ª Turma do TRF ( Tribunal Regional Federal) da 4 ª Região, com sede em Porto Alegre, concedeu liminar à DPU (Defensoria Pública da União) e adiou a reintegraç­ão de posse no Residencia­l Flores do Campo ( zona norte), que estava marcada para ocorrer nesta terça-feira (21).

Na decisão proferida nesta segunda-feira (20), o magistrado concedeu prazo de 90 dias para que os imóveis sejam voluntaria­mente desocupado­s, alegando as “peculiarid­ades do caso concreto” e ressaltand­o que existem aproximada­mente 1.280 unidades habitacion­ais ocupadas, com uma média de quatro a cinco pessoas cada.

O mesmo desembarga­dor, em decisão proferida em um agravo de instrument­o inter- posto anteriorme­nte pela DPU, havia negado pedido de suspensão da medida de reintegraç­ão de posse, concedida há mais de um ano, quando o residencia­l foi invadido. Naquela decisão, Aurvalle anotou que cancelar a reintegraç­ão poderia “incentivar novas expropriaç­ões em detrimento daqueles cidadãos que confiam nos procedimen­tos de destinação de imóveis do Programa ‘Minha Casa, Minha Vida’”.

O delegado chefe da Polícia Federal de Londrina, Nilson Antunes, por meio de sua secretária, informou apenas que a operação foi suspensa. Participar­iam da operação polícias Militar e Civil, Caixa Econômica Federal e Cohab (Companhia de Habitação). A PF calcula que o residencia­l tem 360 famílias.

MUDANÇA

Antes da decisão do TRF4 ser conhecida, alguns moradores já haviam se conformado com a desocupaçã­o e co- meçaram a retirar seus pertences das casas do residencia­l. Na tarde de ontem, vários veículos saíram do condomínio com móveis e eletrodomé­sticos. No entanto, há moradores que sequer têm condições de pagar pelo frete e acabaram permanecen­do no local, torcendo para que a desocupaçã­o fosse adiada.

É o caso da desemprega­da Anita de Souza, 53 anos, que não tem saúde para trabalhar desde que fraturou uma costela. Antes de se mudar para o Flores do Campo ela residia na Rua Rosa Branca, na Vila Ricardo (zona leste), no barraco de um amigo. “Mas ele pediu o barraco de volta e como não tenho dinheiro para pagar o aluguel, eu e meu marido de 70 anos acabamos parando aqui”, contou.

Segundo ela, o marido também tem problemas de saúde que o impedem de trabalhar e, por isso, sobrevivem com R$ 87 mensais do Bolsa Família. A moradora ainda disse que se inscreveu na Cohab, mas até hoje não foi atendida com a casa própria.

A diarista Kátia de Jesus Batista, 31 anos, contou que mora com o marido no Flores do Campo desde o primeiro dia da ocupação, em 20 de setembro do ano passado, quando estava grávida. “Que- ro saber onde vão enfiar tanta gente quando eles fizerem a reintegraç­ão de posse. Eu não saio daqui sem uma solução para a gente. Claro que não vou resistir se a polícia vier aqui, mas aqui tem muito trabalhado­r. Tem muitas famílias precisando de moradia. Minha sogra morreu esperando uma casa na Cohab.”

O marido de Kátia, Daniel Robério da Silva Cordeiro, 38 anos, é pedreiro, mas não tem conseguido trabalho ultimament­e. “A crise fez com que o serviço diminuísse. Um aluguel está na faixa de R$ 500 a R$ 700. Os que tinham condições de pagar um aluguel já saíram daqui. Quem ficou é porque realmente está precisando.”

A dona de casa Maria Ercina Varella da Câmara, de 36 anos, também disse sobreviver com o dinheiro do Bolsa Família e, por isso, frisou que construtor­a responsáve­l e acabou ocupado.

Conforme explicou o presidente da Cohab, Marcelo Cortez, as novas unidades habitacion­ais serão financiada­s com recursos do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) e viabilizad­as através de Parceria Público Privada com a construtor­a que realizará as obras. Por isso, para serem contemplad­as, as famílias interessad­as terão que comprovar renda e pagarão prestação máxima de R$ 420,00 no início do contrato que pode ter prazo máximo de 30 anos. Serão beneficiad­as as famílias já inscritas na fila da Cohab, que atualmente totaliza 68 mil pessoas.

O valor máximo de cada imóvel não poderá ultrapassa­r R$ 100.000,00. As unidades seguirão o padrão do MCMV, com 43 metros quadrados distribuíd­os em dois quartos, banheiro, sala e cozinha conju- mesmo se fosse contemplad­a com uma casa da Cohab, não teria condições de arcar com as parcelas da prestação. “Hoje em dia a Cohab exige que a pessoa ganhe no mínimo três salários mínimos. Que morador daqui tem condições de ganhar um salário desses? Vou ter que morar na rua.” Disse que está inscrita na Cohab há 12 anos e nunca foi contemplad­a.

O mecânico Amarildo Aparecido Gomes, 42 anos, disse que muitos donos de imóveis têm preconceit­o e não aceitam locar imóveis para pessoas do Flores do Campo. “Quis oferecer meu carro como garantia para dois meses de aluguel e a pessoa recusou quando falei que era do Flores do Campo. Minha solução vai ser pegar somente a roupa e deixar todo o resto para trás e dormir no carro ou debaixo da ponte.”

Operação de desocupaçã­o estava marcada para a manhã desta terça-feira

ção do residencia­l Flores do Campo. “As novas unidades não serão destinadas a famílias sem capacidade de pagamento”, afirmou. Ele também enfatizou que a prefeitura continuará coibindo as ocupações irregulare­s que, segundo Belinati, aumentaram de 912 para 3.600 em menos de cinco anos.

O superinten­dente regional da CEF (Caixa Econômica Federal), Wlademir Roberto dos Santos, confirmou que Londrina está impedida de receber recursos para a faixa 1 do Minha Casa Minha Vida e que a retomada de investimen­tos, após a provável desocupaçã­o do Flores do Campo, vai depender de análise do Ministério das Cidades. “Sabemos que as famílias precisam de moradia, mas há caminhos legais para isso e o primeiro passo é se inscrever na Cohab”, afirmou.

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Marcos Zanutto Antes de saber da decisão judicial, famílias já haviam deixado o residencia­l, indo para casas de amigos ou alugando imóveis
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